:::::RIO DE JANEIRO - 29 DE AGOSTO DE 2006 :::::

 

Folha de São Paulo
29/08/06
Justiça anula redistribuição de vôo da Varig e multa Anac
Decisão de Vara Empresarial do Rio impõe a técnicos da agência pena de R$ 20 mil
Juíza decide anular edital de licitação publicado pela Anac no "Diário Oficial" da União para distribuir slots da aérea em Congonhas

JANAINA LAGE DA SUCURSAL DO RIO
MAELI PRADO DA REPORTAGEM LOCAL

A Justiça do Rio anulou as iniciativas da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) para redistribuir as autorizações de vôos e os espaços de pouso e decolagem que não constam da primeira etapa do plano de linhas entregue pela Varig ao órgão regulador e à Justiça. A 8ª Vara Empresarial do Rio atendeu a um pedido dos novos donos da aérea.

A juíza Márcia Cunha determinou ainda uma multa de R$ 20 mil para o superintendente de Relações Internacionais da Anac, Brigadeiro Eliezer Negri, para o gerente-geral, Franklin Nogueira Hoyer, e para o superintendente de Serviços Aéreos, Mário Gusmão Paes.

Na última quinta, a Justiça do Rio enviou oficiais a uma reunião de técnicos da Cernai (Comissão de Estudos Relativos à Navegação Aérea Internacional) para notificar a agência sobre a decisão que impede a redistribuição das rotas.

O encontro ocorreu para discutir a redistribuição de alguns destinos da Varig no exterior a pedido de aéreas. As recomendações dos técnicos seriam submetidas à diretoria colegiada da Anac e tinham pedidos de freqüências a Angola, EUA, França, Itália, México e Uruguai, enviadas por BRA, Gol, OceanAir, TAM e VarigLog.

A disputa entre a Justiça do Rio e a agência começou quando a Varig entregou seu plano básico de linhas dividido em três etapas. A primeira contempla apenas dez destinos nacionais e três internacionais, com uma frota prevista de 18 aeronaves. A Anac afirma que, a partir do momento em que a empresa afirma que não tem como realizar determinados trechos nos próximos meses, é dever da agência redistribuir as linhas para não caracterizar tratamento diferenciado e não prejudicar o usuário final.

A Justiça do Rio avalia que a agência deve seguir o previsto na portaria 569 da Anac, que prevê prazo de 30 dias para operação das rotas domésticas e de 180 dias para as rotas internacionais antes da retomada pela agência. A discussão é complexa porque a nova Varig ainda não existe de fato. A empresa aguarda a certificação como concessionária de transporte aéreo. A Anac diz que questões relacionadas à outorga de linhas devem ser discutidas em âmbito federal. Alegou também que ainda não havia sido notificada da decisão.

Segundo a decisão judicial de ontem, foram declaradas nulas as deliberações adotadas nessa reunião relacionadas à distribuição de rotas internacionais que integram a UPV (Unidade Produtiva Varig) antes do prazo fixado pelo juízo. Além disso, a decisão anula o edital de licitação publicado pela Anac no "Diário Oficial" da União para redistribuir 56 "slots" (espaços de pouso e decolagem) em Congonhas por meio de sessões públicas. Desse total, 50 slots pertencem à Varig.

A Anac informou que não foi notificada e que não deve se pronunciar antes disso.

Em nota, os novos donos da Varig afirmam que "a decisão é justa e resguarda os direitos adquiridos no leilão judicial".

 

 

Valor Econômico
29/08/06
Justiça cancela redistribuição de rotas da Varig
Valor Online

A Varig comunicou ontem que a 8ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro acolheu seu pedido e anulou "todos os atos" da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) que tinham por objetivo abrir licitação para as rotas nacionais e internacionais da Varig antes do prazo previsto em lei.

De acordo com a Varig, a decisão da juíza Márcia Cunha de Carvalho também estabelece multas individuais no valor de R$ 20 mil para o superintendente de relações internacionais da Anac, brigadeiro Eliezer Negri, para o gerente geral da agência, Franklin Nogueira Hoyer, e também para o superintendente de serviços aéreos da agência , Mário Roberto Gusmão Paes.

Questionada sobre a decisão, a Anac informou que não recebeu nenhuma notificação judicial e que não tem nenhuma informação sobre o assunto. Procurados pelo Valor Online, representantes da 8ª Vara e da Justiça do Rio não foram encontrados.

Na avaliação da nova Varig, denominada Aéreo Transportes Aéreos, a decisão é justa e resguarda os direitos adquiridos no leilão de compra da aérea. A companhia informa ainda que pretende retomar gradualmente as rotas adquiridas da antiga Varig, dentro dos prazos previstos em lei - redistribuição de rotas apenas depois de passados 30 dias após a obtenção da concessão para os destinos nacionais e 180 dias para os internacionais.

"A empresa já está negociando a compra de mais aeronaves para expandir sua malha dentro dos prazos e atender os consumidores. No momento, a Aéreo aguarda apenas a liberação pela Anac da concessão para operar a empresa aérea e iniciar seu plano de expansão", informa a empresa em nota oficial, acrescentando que já entregou os documentos solicitados pela agência.

Na semana passada, a Anac decidiu redistribuir 50 slots (horários de pouso e decolagem) no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, que estavam sob concessão da Varig, para outras companhias aéreas, de acordo com edital de licitação publicado no "Diário Oficial da União". O edital prevê ainda a licitação de outros seis slots ociosos de Congonhas.

A agência decidiu redistribuir as rotas não contempladas na primeira fase do plano de linhas enviado pela Nova Varig, com o uso de 18 aeronaves. A intenção da Varig era de que a agência mantivesse as concessões até a operacionalização final de toda a frota, prevista em 80 aeronaves. Hoje, a Varig opera com nove aviões.

O juiz da 8ª Vara Empresarial, Luiz Roberto Ayoub, defende, no entanto, que a Anac só poderia repassar essas rotas 30 dias após a nova Varig receber a autorização para operar transporte aéreo.

 

 

O Globo
29/08/06


 

 

Correio Braziliense
28/08/06
Impasse trabalhista


A responsabilidade sobre as dívidas com os empregados, deixadas pelas empresas que entram em recuperação Judicial e são vendidas, como a Varig, é uma das brechas mal resolvidas da nova lei de falências

Pessoas observam avião da Varig no aeroporto de Brasília: novos controladores recusam-se a arcar com o passivo trabalhista

Hoje, a Varig deverá iniciar a liberação das guias para o saque do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e do seguro-desemprego aos 5,5 mil funcionários demitidos durante a reestruturação da companhia. O acordo foi fechado ao longo da semana passada, depois de uma série de encontros entre os trabalhadores e o empresário Lap Chan, representante do fundo norte-americano Matlin Patterson — que hoje controla a VarigLog e, indiretamente, a Varig. Chegar a uma saída conciliatória tornou-se vital para a companhia nos últimos meses. Tudo porque o maior temor de Chan, revelado durante as reuniões, continua sendo a sucessão das dívidas deixadas na “antiga Varig”. Em especial, a trabalhista.

O acordo sobre o FGTS e o seguro-desemprego, no entanto, não evitará a continuidade da batalha judicial que pode colocar em risco tanto o futuro da aérea quanto dos seus ex-funcionários. O dilema jurídico sobre a sucessão do passivo trabalhista já é visto por especialistas como a principal falha do novo sistema de recuperação de empresas em dificuldade, a nova lei de falências. A grande questão é se os direitos dos trabalhadores devem ou não ser considerados no momento de recuperação de uma companhia. A resposta unânime de juízes e advogados trabalhistas ouvidos pelo Correio é que sim.

Apesar da constatação de que a sucessão é inevitável, os próprios analistas acreditam que a decisão definitiva para o impasse irá demorar. Na última sexta-feira, a VarigLog sinalizou com um novo acordo coletivo para tentar conciliar o pagamento dos salários atrasados e demais benefícios com a capacidade de caixa da empresa. Porém, nem mesmo o acerto colocará um ponto final na ação civil movida pelo Ministério Público do Trabalho do Rio de Janeiro, que ainda está em primeira instância.

O tamanho total da dívida protestada é uma incógnita. Como a empresa permanece em recuperação judicial (o que a impede de divulgar balanços financeiros) não há números exatos sobre os passivos no momento atual. Em meados de 2005, o montante devido aos trabalhadores, declarado pela aérea, era de R$ 225 milhões. Passados mais de um ano do início do processo de recuperação e com o contínuo atraso dos pagamentos, os sindicatos do setor estimam que a dívida chegue, hoje, a R$ 1 bilhão.

Responsabilidade

O impasse mais grave é a responsabilização do novo administrador, a VarigLog, pelo pagamento da dívida. Para comprar a Varig em leilão, a empresa teve a garantia da 8ª Vara de Justiça Empresarial do Rio de Janeiro de que nenhum passivo seria repassado da antiga aérea para a nova. Nem mesmo o trabalhista.

No entanto, casos anteriores que passaram pela Justiça do Trabalho não deixam dúvidas de que o passivo com funcionários não pode ficar para trás. A interpretação de juízes é que esse tipo de dívida é transmitida aos novos administradores quando a empresa é vendida. Assim foi com o Itaú em 2000, quando adquiriu o controle do Banco do Estado do Rio de Janeiro (Banerj). Apesar da resistência, a instituição foi obrigada a arcar com o passivo, mesmo argumentando que a razão social das empresas era diferente e que não havia responsabilidade sobre a dívida. O mesmo aconteceu com a aquisição de parte da Rede Ferroviária Federal (RFFSA) pela Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), em 1996.

O caso Varig não deve ser diferente, crêem advogados trabalhistas. Apesar da legislação de falência ter mudado em 2005, as regras da nova lei não são claras sobre o direito adquirido pelos funcionários da empresa em recuperação. Além disso, a existência de artigos específicos na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) sobre a sucessão anularia qualquer interpretação contrária que a própria Justiça fizer em cima da generalidade da Lei de Falências. “Quando você tem regras gerais e específicas, prevalecem as específicas. Como a CLT é a legislação específica para essas questões, a sucessão deve prevalecer”, acredita Luís Inácio Barbosa Carvalho, advogado trabalhista há 15 anos.

O ex-ministro do Trabalho Almir Pazzianotto também não vê maneira de manter o passivo congelado na antiga empresa. “Pela CLT, a mudança da propriedade não afeta os direitos adquiridos pelos trabalhadores”, relembra. Porém, o jurista alerta que a indefinição da Lei de Falência, que não revoga os dispositivos anteriores presentes nas leis trabalhistas, é um erro grave no mecanismo de salvamento das companhias. “Se a empresa nova nascer contaminada pelos problemas da antiga, de nada adiantou a nova lei. Ela já nasce inviabilizada”, ressalta Pazzianotto. Como a questão não foi resolvida durante a construção da lei de falências, restará aos funcionários aguardar uma decisão da Justiça nas alçadas superiores, provavelmente no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Drama dos funcionários

Funcionários da Varig durante protesto em Brasília: abandonados
Sem perspectivas de receber os quase cinco salários atrasados, nem os benefícios definidos por lei para os demitidos, os funcionários mandados embora pela Varig vivem dias de agonia. Em Brasília, aproximadamente 300 pessoas perderam seus empregos, muitas com quase 30 anos na empresa. A luta agora é para sobreviver, apesar da falta de dinheiro e da pequena perspectiva de conseguir colocação na mesma carreira. Embora o setor esteja em franca expansão, as vagas criadas não têm sido suficientes para absorver os 5,5 mil demitidos pela Varig em todo o Brasil.

Enquanto esperam por um desfecho das negociações com a VarigLog, nova controladora da companhia, e do processo trabalhista movido no Rio de Janeiro, os funcionários têm trocado informações sobre o caso e encontrado seus próprios meios de amenizar a dura realidade de dívidas e abandono. No Orkut — maior rede de relacionamentos da internet no Brasil — existem centenas de comunidades mantidas por funcionários, onde debatem sobre a situação da aérea. Os grupos servem basicamente para transpor o mais forte obstáculo que tem se erguido para quem está fora da empresa: a falta de informação.

Muitos trabalhadores das equipes de terra (aeroviários) não receberam baixa das suas carteiras de trabalho, estando oficialmente ainda ligados à empresa. “A Varig nos tratou como pessoas descartáveis. Até hoje não sabemos qual o critério para a escolha dos demitidos e continuamos sem saber oficialmente o que está acontecendo. Muito do que sabemos é pela mídia”, desabafa Glenda Azevedo Holanda, 24 anos, cinco passados na Varig. Inconformada com a falta de envolvimento da companhia na solução do impasse, Glenda move, por conta própria, uma ação na Justiça trabalhista. Pede R$ 80 mil em salários atrasados, benefícios não pagos e indenização por assédio moral. A primeira audiência de conciliação, realizada na quinta-feira passada, não gerou resultado por conta do acordo anunciado pela Varig com os sindicatos para a liberação do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e seguro-desemprego.

Mesmo com o nome lançado em sistemas de controle de crédito, a aeroviária diz que sua situação ainda é melhor do que a de muitos colegas. É o caso de João (nome fictício) que após se dedicar à companhia por cinco anos se vê em uma das mais delicadas situações da sua vida. Com a mulher grávida de cinco meses, o ex-funcionário não sabe de onde irá tirar dinheiro para pagar as contas que se acumulam. “Até hoje não comprei uma meia para o meu filho que vai chegar”, confessa João, que também tenta na Justiça conseguir o pagamento do que a Varig lhe deve.

Além dos problemas financeiros, a maior mágoa dos ex-funcionários tem sido o tratamento dado pela companhia a quem sempre apoiou a sua recuperação. O que todos trazem em comum é o sentimento de abandono. Desde que os cancelamentos de vôos começaram, há cerca de dois meses, os trabalhadores se mantiveram firmes no atendimento aos clientes. “A gente dançava conforme a música”, resume Glenda. Enquanto tentavam resolver seus problemas de endosso de passagens, poucos passageiros estavam conscientes de que aquelas pessoas que estavam do outro lado do balcão viviam situação muitas vezes pior. “A Varig só funcionou nestes últimos três meses porque os funcionários estavam lá, trabalhando como formiguinhas”, relembra João.

Hoje, eles têm dúvidas se a companhia é capaz de se reerguer. A Varig tem mantido os demitidos em stand by, com a promessa de que haverá recontratações em breve. Os uniformes ainda estão nos armários esperando uma reconvocação ou um novo emprego. Fernando Carvalho Benevides, 28 anos, já decidiu que, para a Varig, ele não volta. “A companhia não olhou na nossa cara. Eu não penso em voltar. Agora quero estudar para outro ramo, holetaria talvez”, afirma. (MM)

 

 

Correio Braziliense
27/08/06
Varig por um fio
A aventura do fundo de investimentos Matlin Patterson no controle da aérea pode durar muito pouco. Se em um mês a empresa não estancar o prejuízo, controlador ameaça desistir da compra


Lap Chan (c), representante do fundo, disse que já gastou US$ 100 milhões dos US$ 150 milhões disponíveis

A sobrevivência da Varig voltou a ficar por um fio. Fracassadas as negociações com as empresas de arrendamento de aeronaves, pressionada pelos funcionários e sofrendo com a retomada das rotas feita pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), os novos investidores da companhia já começam a achar que fizeram um mau negócio. As malas já estão prontas, caso o cenário não mude em pouco tempo. O laudo fatídico tem sido apresentado pelo executivo chinês Lap Chan, representante do fundo de investimento Matlin Patterson, principal acionista da VarigLog e, indiretamente, da Varig.

O tempo de permanência da Matlin Patterson como investidora da Varig é medido em dólares. O fundo norte-americano, que já investiu pouco mais de US$ 100 milhões ao longo do processo de negociação e compra da companhia aérea, tem como limite de gasto US$ 150 milhões. “Eles estão dispostos a perder até este valor. A partir disso, vale mais a pena abandonar”, conta uma fonte do Correio. Sem boas perspectivas de que a empresa conseguirá se levantar no curto prazo, o relógio corre contra a Varig. As perdas diárias da aérea somam US$ 1,5 milhão. Seguindo a marca estabelecida por Chan, a companhia teria mais um mês para voltar a funcionar a contento. Senão, ficará sem seu único investidor e, neste caso, só lhe restará a falência.

Na última semana, Chan fez pelo menos quatro reuniões com funcionários da Varig em Porto Alegre, Salvador, São Paulo e Rio de Janeiro na tentativa de chegar a um acordo que freasse o risco de uma sucessão das dívidas trabalhistas da Varig para a VarigLog. Nos encontros, o executivo desabafou e deixou claro que, se as coisas continuarem como estão, a Matlin abandonará o barco. “Se não me derem as condições que estão previstas no edital (do leilão da Varig), eu não tenho porque ficar aqui”, teria dito o empresário segundo a fonte que participou de uma das reuniões. A aquisição foi em 20 de julho.

Anac preocupa
No momento, o maior obstáculo para a permanência do fundo norte-americano tem sido a Anac. No último mês, a reguladora resolveu endurecer com a Varig, em uma mudança de linha de atuação considerada estranha nos bastidores da companhia aérea (ver matéria abaixo). A agência decidiu passar por cima da decisão do juiz Luiz Roberto Ayoub, responsável pelo caso na 8º Vara Empresarial do Rio de Janeiro, de congelar as rotas pertencentes hoje à companhia e que não estão sendo usadas. Além de retomá-las, a Anac já marcou o primeiro leilão de redistribuição para o dia 14 de setembro, onde irá vender os 50 mais cobiçados horários de vôos (slots) pertencentes à Varig, os de Congonhas.

A reguladora também pretende criar mais problemas para a companhia e liberar o Certificado de Homologação de Empresa de Transporte Aéreo (Cheta) para a “nova Varig” com restrições. Vazou a informação de que serão incluídas exigências técnicas, como a atualização de manuais de segurança, que deverão ser cumpridas em seis meses. Caso as ressalvas não sejam atendidas no prazo, a Varig poderá perder o certificado e voltar à estaca zero.

Sem qualquer segurança de que o Cheta não será anulado seis meses após sua liberação, as empresas de leasing de aviões não têm tido boa vontade em negociar com a Varig, o que complica ainda mais a sobrevivência da empresa. Sem aeronaves, a aérea não conseguirá cumprir seu plano de malhas, muito menos investir na retomada de sua clientela.

Independente
Um outro motivo que pesa na decisão de deixar a aérea à deriva tem relação estreita com as causas que levaram o Matlin Patterson a investir na companhia. O plano encabeçado por Lap Chan sempre se tratou de uma estratégia de sobrevivência para a recém-adquirida VarigLog. Na época do leilão, 40% da operação da transportadora de cargas dependia de contratos de locação de aviões da Varig. Isso fazia com que, se a Varig falisse, a VarigLog morreria junto. Dessa forma, restava apenas assumir a ex-controladora.

Mas, após a aquisição da Varig, muita coisa mudou para a VarigLog. Com os cancelamentos dos vôos internacionais, a ex-subsidiária foi obrigada a fechar contratos com outras empresas para garantir o transporte das encomendas. Lap Chan também tratou de investir no salvamento da “operação logística” e, nos últimos meses, fechou contrato para a trazer 32 aeronaves para a VarigLog. Essas duas ações praticamente eliminaram a antiga dependência da Varig.

Na falta do principal motivo para embarcar na aventura de manter aquela que já foi a maior aérea da América Latina, a Matlin Patterson teria concluído que “para tudo há um limite”, conta a fonte. Caso decida mesmo sair da empreitada, o fundo norte-americano poderá ser incluído na massa falida da Varig e cobrar parte dos investimentos feitos.

Candidatos para os aviões
Antes complacente com a crise da Varig, a mudança de postura da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) pode estar relacionada com pressões das empresas aéreas concorrentes, segundo fontes ouvidas pelo Correio. Não há dúvidas para os investidores de que a redistribuição das linhas da companhia agrada particularmente a TAM e a Gol, que hoje dividem isoladas o mercado doméstico de transporte aéreo. Estratégias recentes e ainda não reveladas ao público reforçam a tese de que a falência da Varig voltou a ser um bom negócio.

Fontes que participam do processo de recuperação contam que a TAM já estaria com contrato fechado para alugar aproximadamente seis Boeings 777, hoje sob posse da Varig. Essas aeronaves fazem parte do lote de equipamentos parados por conta do processo de arresto movido pelas empresas de leasing (lessors) na Corte de Falências de Nova York.

Assim como já havia sido feito no início da crise, as lessors se anteciparam em arranjar outros interessados para os aviões alugados pela Varig. Antes de dar início ao processo de recuperação judicial, a companhia chegou a ter a chance de saldar sua dívida com a International Lease Finance Corporation (ILFC), uma das principais empresas de leasing de aeronaves do mundo. Em contrapartida, a ILFC exigia a devolução dos aviões que havia alugado à empresa dentro de um cronograma.

Tudo porque o equipamento já estava prometido a uma concorrente. O cronograma era baseado no tempo de manutenção e pintura das aeronaves, que ganhariam a logomarca da Gol. O acordo não foi feito, mas isso não evitou que, mais tarde, os mesmo aviões 737 acabassem na mão da concorrente.

Rotas em disputa
O movimento da TAM traria uma estratégia ainda mais complexa. Os 777 são os mais modernos da linha Boeing e, normalmente, são usados para rotas internacionais. Para que os contratos saiam da gaveta, a TAM precisa conquistar mais linhas para o exterior, o que só poderá vir das que estão nas mãos da Varig, ainda a maior detentora de freqüências nesse mercado, mesmo sem usá-las. Sendo assim, a nova política linha-dura da Anac acabaria se encaixando perfeitamente às necessidades da concorrente, com a rápida retomada das rotas e redistribuição para os demais interessados.

A segurança da TAM de que as linhas internacionais cairão no seu colo está nos acordos bilaterais fechados pelo Brasil. Muitos deles prevêem a existência de apenas uma empresa “de bandeira nacional” — como no caso de aeroportos europeus —, cargo antes ocupado pela Varig. Com 52,64% do mercado de vôos internacionais no mês de julho, não há dúvidas de que a sucessora no posto será a TAM.

Essa partilha do espólio antes da falência da Varig compromete ainda mais a saúde da empresa. Vale lembrar que até os trabalhadores já fazem parte da divisão da herança da companhia. Na época do leilão, TAM e Gol haviam se comprometido em contratar de forma quase imediata 6 mil funcionários da concorrente em caso de falência.

 

 

Globo Online - O Globo
28/08/2006 às 21h59m
Justiça anula distribuição de rotas da Varig
A 8ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro anulou todos os atos da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) que pretendiam licitar rotas nacionais e internacionais da Varig antes dos prazos previstos por lei – 30 dias após a obtenção da concessão para os destinos nacionais e 180 dias para os internacionais.

As rotas estavam em processo de distribuição desde a última quinta-feira, quando uma reunião realizada no Rio chegou a ser interrompida por oficiais de Justiça, a pedido da Varig. Uma nota técnica da Anac, divulgada ontem no site do órgão regulador, recomendava a distribuição de rotas para seis diferentes países da América do Norte, da Europa e da África para TAM, Gol, OceanAir e BRA.

De acordo com as palavras da juíza Márcia Cunha de Carvalho “enquanto não suspensa,revogada ou cassada a decisão Judicial, concorde ou não com ela, ao destinatário da ordem resta uma só atitude: cumprir”

A decisão prevê ainda a aplicação de multas individuais no valor de R$ 20 mil para o superintendente de relações internacionais da ANAC, brigadeiro Eliezer Negri; para o gerente geral da ANAC, Franklin Nogueira Hoyer; e para o superintendente de serviços aéreos, Mário Roberto Gusmão Paes.

As rotas e os espaços da Varig nos aeroportos foram congelados em maio, antes do leilão, e, por decisão judicial, não podem ser distribuídas antes da homologação da Nova Varig como empresa aérea de transporte regular. Mesmo depois da concessão, a Justiça do Rio determinou o prazo de 30 dias após a homologação para distribuição dos destinos $e 180 dias para os internacionais.

A TAM confirmou ontem que apresentou pedido para sete frequências para Paris (a empresa já voa para este destino) e outras sete para Milão (Itália). Segundo a TAM, as rotas são consideradas economicamente interessantes para a companhia. A Gol também confirmou o pedido de sete frequências para o México (para onde ainda não voa) e outras sete para o Uruguai (onde já tem operações). Já a OceanAir não confirmou oficialmente as rotas que estão na nota técnica da Anac para o México (sete frequências), Angola (duas frequências) e sete frequências para os EUA (Los Angeles). A BRA apresentou solicitação para voar para a França, México e Itália, com sete frequências para cada rota.

Na semana passada a Anac já havia desrespeitado as decisões da 8ª Vara Empresarial do Rio, abrindo o processo de licitação. Segundo a Anac, a competência para o assunto é da Justiça federal.

Valor Online
28/08 - 20:13h
Justiça cancela redistribuição de rotas, diz Varig; Anac afirma não ter sido comunicada

RIO - A Varig comunicou há pouco que a 8ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro acolheu seu pedido e anulou "todos os atos" da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) que tinham por objetivo abrir licitação para as rotas nacionais e internacionais da Varig antes do prazo previsto em lei.

De acordo com a Varig, a decisão da juíza Márcia Cunha de Carvalho também estabelece multas individuais no valor de R$ 20 mil para o superintendente de relações internacionais da Anac, brigadeiro Eliezer Negri; para o gerente geral da agência, Franklin Nogueira Hoyer; e para o superintendente de serviços aéreos, Mário Roberto Gusmão Paes.

Questionada sobre a decisão, a Anac informou que não recebeu nenhuma notificação da 8ª Vara Empresarial do Rio e que não tem nenhuma informação sobre o assunto.

Procurados pelo Valor Online, representantes da 8ª Vara e da Justiça do Rio não foram encontrados.

Na avaliação da nova Varig, denominada Aéreo Transportes Aéreos, a decisão é justa e resguarda os direitos adquiridos mo leilão de compra da aérea.

A companhia informa ainda que pretende retomar gradualmente as rotas adquiridas da antiga Varig, dentro dos prazos previstos em lei - redistribuição de rotas apenas depois de passados 30 dias após a obtenção da concessão para os destinos nacionais e 180 dias para os internacionais.

"A empresa já está negociando a compra de mais aeronaves para expandir sua malha dentro dos prazos e atender os consumidores.

No momento, a Aéreo aguarda apenas a liberação pela Agência da concessão para operar a empresa aérea e iniciar seu plano de expansão", informa a empresa em nota oficial, acrescentando que já entregou todos os documentos solicitados pela agência.

(Valor Online)

O Dia
28/08/2006 17:04:00
Funcionários da Varig iniciam vigília no Santos Dummont

Rio - Funcionários da Varig iniciaram nesta segunda-feira uma vigília no aeroporto Santos Dummont para exigir o pagamento dos salários atrasados e das rescisões de contratos.

A Justiça deve homologar nesta segunda-feira acordo que libera FGTS e seguro-desemprego para os funcionários demitidos.

A decisão cabe á juíza Maria Thereza Prata, da 33ª Vara do trabalho do Rio. Ela está de posse desde quinta-feira da lista de 4.544 demitidos pela empresa.

 

 

Tribuna da Imprensa
28 agosto de 2006
O CALOTE TRABALHISTA E SUAS PERVERSAS CONSEQUÊNCIAS
Quando se fala em moratória da dívida externa, a mídia grita. Mas diante desse calote nos empregados da Varig em nome de sua recuperação financeira, ninguém se toca.

Rodrigo da Matta era um piloto que preferia comandar um jato da ponte aérea para ficar mais perto da família, em Niterói. Temperamento alegre e comunicativo, doce no trato apesar dos seus mais de 1,90m de altura, corpo atlético, ele morreu aos 44 anos no final de julho, na semana em que o pai, o antropólogo Roberto da Matta, festejaria seus 70 anos.

O sol já se ia, quando ele foi fulminado por um infarto. Naquele momento, o chinês Lap Chan, preposto de um fundo norte-americano de investimentos, confirmava a mais impiedosa guilhotina social de nossa história. Sem ver um tostão desde abril, seis mil competentes funcionários iam ser demitidos da Varig com um carimbo fatal: em nome da Lei de Recuperação de Empresas, eles passariam a ser tratados como se nunca tivessem trabalhado na empresa octogenária.

Rodrigo perdia a vida, mas não era a única vítima de uma ciranda macabra. O mega-golpe não ceifaria apenas os trabalhadores em serviço. Estavam sendo surrupiados também os aposentados e pensionistas atendidos pelo Aerus, um fundo de pensão para o qual contribuíram por anos e que também por anos vinha sendo dilapidado ante a omissão dos órgãos públicos.

Por trás das cortinas, os trabalhadores e aposentados da Varig viveram cenas dilacerantes de desespero e revolta. Afinal, no ano passado, a empresa dera sinais de que tinha tudo para dar a volta por cima.

Julho passou e agosto está chegando ao fim. Numa hora em que a mídia se ocupa dos “presuntos” mais frescos, estão consumando na surdina o mais desonesto dos calotes, a apropriação dos direitos dos trabalhadores da Varig.

E, enquanto um insípido burocrata da agência aérea governamental disse na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro que o governo não tem nada com isso, a opinião pública vai sendo tapeada com meias informações, como se tudo estivesse dentro dos conformes.

Escondendo a tragédia

Aos poucos, o tempo vai escondendo a tragédia. O que se fala agora é menos do essencial e mais de outras vilanias típicas da súcia que se vale de uma cortina de fumaça para perpetrar o crime por inteiro.

Mal pôs a mão na massa, o preposto do fundo abutre tratou de fazer mal também ao Rio de Janeiro. Violando acordos firmados com o Governo do Estado, quer transferir para São Paulo o que restar de vida da Varig. A empresa de manutenção, os escritórios, enfim, o Rio só não desaparece do mapa porque é um bom aeroporto de passagem. No mesmo instante, a agência governamental precipita-se na transferência das linhas da Varig para suas concorrentes.

É uma pena, uma grave constatação, que a opinião pública não esteja se sentindo igualmente lesada por esse golpe, no qual os atingidos de hoje são apenas os “abre alas” de um novo e perverso modelo de relações trabalhistas. Modelo inacreditável, mas que vai se cristalizando sob os olhares lânguidos de todos – mídia, políticos, formadores de opinião.

Recapitulemos, já que nós desta TRIBUNA DA IMPRENSA estamos sozinhos tentando contar essa história suja de cabo a rabo.

Havia uma respeitada empresa aérea, a maior do Brasil. Por causas próprias e em face de políticas governamentais, ela foi enfrentando turbulências quase intransponíveis. Embora os próprios empregados tivessem oferecido seus corações e mentes para assumi-la e recuperá-la com o mínimo de fraturas, o juiz empresarial optou por outro piloto. Que piloto!

Com base numa lei nova, de 201 artigos e uma infinidade de parágrafos e incisos, aprovou um plano de recuperação que deixa seus empregados a pão e água. Para isso, é bom que se diga, contou com a solidariedade militante de um sindicato cuja única preocupação é postar-se como linha auxiliar do governo que, por motivos mais do que conhecidos, abandou à Varig à própria sorte.

A vigília da verdade

Nesse script, a ficção impôs-se como fato consumado. A empresa não faliu, mas seus empregados e os aposentados se tornaram buchas de canhão.

Por uma alquimia em nome da Lei 11101/95, a Varig foi dividida em duas: a velha, com suas dívidas, e a “nova”, eximida de suas obrigações trabalhistas, com um brutal corte epistemológico em sua história, como é, aliás, praxe da súcia do PT.

Resultado: seis mil demitidos não sabem a quem apelar para receberem os atrasados, e os seus direitos trabalhistas. O Sindicato dos Aeronautas tratou tão somente das autorizações para sacarem o fundo de garantia e recorrerem ao auxílio desemprego. O principal, que soma mais de R$ 300 milhões, fica para quando Deus quiser.

Para consolidar essa ignomínia trabalhista, o preposto do fundo abutre joga com a divisão dos empregados. Anunciou a demissão de 6 mil ao arrepio dos próprios acordos coletivos de trabalho. E deixou outros 3.800 como sobreviventes, aferrados aos seus salva-vidas, o que é compreensível, considerando que o mar não está para peixe.

Entre os demitidos e os mantidos criou-se um grupo de premidos pela esperança. Eu até gostaria que estivessem certos, mas estes preferem chorar baixinho, sem incomodar, esperando que um dia sejam lembrados e repescados.

É para contar essa história aos seus antigos passageiros que comissários, pilotos e aeroviários da Varig fazem uma vigília hoje, a partir das 14 horas, no Aeroporto Santos Dumont.

Se você passar por eles, não deixe de ouvi-los atentamente. Porque o que eles estão passando hoje pode sobrar para outros assalariados amanhã. Eles vão tentar manter a denúncia dos maus tratos no ar, já que para a quase totalidade da mídia o massacre que sofreram já é página virada.