Valor
Econômico
27/12/2006
Copiar o modelo da Gol pode não
ter sido a melhor idéia para a TAM
Vanessa Adachi, Carolina Mandl e Roberta
Campassi
O caos aéreo protagonizado pela
TAM na semana do Natal teve inúmeras causas, muitas
alheias à empresa. Mas, em meio a uma crise sem precedentes
do controle aéreo do país e às conseqüências
do encolhimento brutal da Varig, fica cada dia mais patente
que a companhia também foi vitimada por sua estratégia
de negócios. Mais precisamente a busca frenética
por ganhos de eficiência e redução de
custos para se aproximar do "padrão Gol",
sua principal concorrente.
A TAM não escondeu de ninguém
nos últimos anos que tinha o objetivo claro de reduzir
drasticamente seus custos e levá-los ao mesmo nível
daqueles registrados pela Gol. A estratégia estava
na boca do presidente, Marco Antonio Bologna, assim como
dos demais executivos, e ficou documentada em apresentações
feitas aos investidores.
"Na busca por margens melhores, no
esforço para chegar perto do custo da Gol, a corda
foi muito esticada", avalia uma fonte próxima
à empresa. O diagnóstico feito por analistas
e pessoas próximas à companhia consultados
pelo Valor é que a empresa estava operando no seu
limite, principalmente em relação à
taxa de utilização de sua frota - o número
de horas que seus aviões permaneciam no ar diariamente.
Nesse cenário, problemas relativamente
pequenos, como manutenção de seis de seus
95 aviões, tiveram seus efeitos potencializados.
"A malha aérea da TAM falhou", comenta
fonte ligada à empresa. A chamada malha é
a programação vôos a ser seguida pela
frota diariamente. Quando se opera no limite da capacidade,
qualquer falha isolada gera um efeito em cascata, complicando
conexões e outros vôos que seriam realizados
pela mesma aeronave.
Uma das principais medidas adotadas pela
TAM para ganhar eficiência nos últimos anos
foi aumentar o tempo que seus aviões permaneciam
no ar. Uma máxima do setor aéreo é
que avião no solo representa custo - porque não
gera receita. A Gol surgiu em 2001 com uma taxa de utilização
elevadíssima para os padrões nacionais - um
dos pilares do modelo de baixo custo é justamente
o giro máximo da frota.
A TAM saiu de uma taxa de utilização
média de 9,5 horas voadas em 2002 para chegar a 12,6
horas neste ano (12,9 horas no terceiro trimestre). No terceiro
trimestre deste ano, a Gol registrou taxa de utilização
de 14,3 horas. A TAM já fazia planos de seguir nessa
trilha e projetava ultrapassar as 13 horas em 2007. "Depois
do ocorrido, a empresa terá que rever esse plano",
destaca um analista.
Em apresentação a investidores
neste mês, a TAM disse que o tripé da companhia
para manter a liderança e a lucratividade estava
apoiado em: baixo custo operacional, "indisputável"
bom serviço e preços competitivos.
Na mesma apresentação, informou
que hoje o custo do seu produto é 10% a 12% superior
ao da Gol e que a meta é reduzir essa diferença
para 5% dentro de um ano. "Nossas metas de custo são
agressivas, mas o mapa dessa rota está dado",
dizia o texto apresentado. "A TAM é uma empresa
de muitos anos. Não muda da noite para o dia, de
uma companhia aérea tradicional para uma de baixo
custo. Não dá para ser a Gol", diz Daniela
Bretthauer, analista do Santander Investment.
Um dos fatores que desencadearam o apagão
da TAM na semana passada foi a necessidade de estacionar
seis aviões para manutenção na quarta-feira,
dia 20. Mas as falhas apresentadas eram simples e teriam
sido solucionadas em cerca de meia hora cada uma. "Em
condições normais, não seria motivo
para tanto atraso nos vôos", diz um especialista.
Alguns dos aviões que tiveram que
passar por manutenção foram aqueles incorporados
nos últimos 40 dias. Foram aeronaves de segunda mão
alugadas pela TAM para ocupar rotas deixadas pela Varig
e fazer frente ao aumento da demanda nas férias.
Aviões usados, mesmo depois de passar por um check-up,
estão mais sujeitos a falhas.
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A TAM não escondeu de ninguém nos últimos
anos o objetivo de reduzir drasticamente os seus custos
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"Não basta aumentar a frota
para crescer, é preciso se preparar para isso em
todas as áreas da empresa", diz um especialista.
"Houve uma seqüência de falhas e descaso
com o público. A empresa tem que estar preparada,
ter um plano B para realocar os passageiros", diz Bretthauer.
A concorrência não deve perder
a chance de faturar em cima do fiasco da TAM. A Varig já
tem divulgado comunicados à imprensa para informar
que teve que socorrer os passageiros da TAM. A Gol, fiel
ao seu estilo agressivo nos negócios, também
não deve deixar por menos. "A Varig e a Gol
podem aproveitar esse momento para atrair os clientes insatisfeitos",
diz Mel Marques Fernandes, analista da Brascan Corretora.
O que protege a TAM, pondera a analista, é a sua
ampla dianteira. "Com 51,7% de participação
doméstica, os passageiros não têm tantas
opções."
Em meio à crise da TAM, ganhou
força o argumento de que o mercado aéreo brasileiro
não pode ficar refém de um duopólio.
Problemas em uma empresa que detém mais de 50% do
mercado afetam o setor como um todo e deixa o consumidor
sem opções. A discussão, entretanto,
não é tão simples, uma vez que os especialistas
são unânimes em defender que o setor aéreo
exige grande escala para tornar-se viável.
Na TAM, a avaliação é
que o episódio arranhou terrivelmente a imagem da
companhia. É o que dizem também especialistas.
Para o consultor de imagem Luciano Deos, da GAD' Branding,
se os transtornos tivessem atingido a Gol e, não
a TAM, o impacto negativo dos episódios teria sido
menor. "A imagem da Gol está associada a baixo
preço. Já a marca da TAM está relacionada
ao serviço. Paga-se mais na expectativa de ser bem
servido. Uma falha como essa faz com que o passageiro questione
o posicionamento da empresa", diz.
Depois dos recentes percalços,
avalia-se que o histórico de atendimento de qualidade
lançado por seu fundador, Rolim Adolfo Amaro, será
colocado em xeque.
"Fica a impressão que a TAM
vendeu uma imagem incoerente. Não é mais a
empresa administrada por alguém que estende o tapete
vermelho aos passageiros", afirma José Roberto
Martins, consultor de marcas da Global Brands. "A empresa
está diante de uma crise de marca."
Para Martins, o posicionamento da empresa
durante os dias de maior caos também deve ser comparado
pelos clientes ao da TAM presidida por Rolim. "Não
se viu a cara de Bologna [presidente da TAM] em nenhum momento.
Quando o avião da TAM caiu, em 1996, Rolim foi explicar
o que estava acontecendo."
Nos últimos dez dias, a TAM perdeu
mais de R$ 1 bilhão em valor de mercado. Apesar da
reação negativa do mercado financeiro, só
ontem a empresa colocou um comunicado no site de relações
com investidores. Ontem, a ação da empresa
subiu 0,24%, depois de ter despencado 11,35% na semana passada.
Pode-se dizer que houve um erro estratégico
da TAM? Agora, avaliando os fatos pelo retrovisor, é
fácil dizer que sim. Mas que orientação
deveria seguir uma companhia que assumiu a liderança
de um mercado que cresce a taxas de dois dígitos
há anos, que tem como principal concorrente uma companhia
que nasceu no modelo de baixo custo e que colocou suas ações
nas bolsas brasileira e americana, sujeitando-se à
pressão constante de investidores por resultados?
O modelo, até agora, era considerado
um caso de sucesso. A empresa abocanhou metade do mercado
doméstico, tornou-se líder no internacional
e melhorou substancialmente todos os seus indicadores operacionais
e financeiros. Até que falhou. Não se pode
dizer que foi um erro dos executivos apenas. Quem conhece
a empresa por dentro relata que acionistas controladores
e conselheiros de administração fizeram enorme
pressão por redução de custos nos últimos
anos. Agora, é provável que conselheiros e
executivos optem por sacrificar um pouco de margem para
fazer uma correção de rota.
Folha On line
26/12/2006 - 19h26
Em cinco dias, FAB transporta 2.600
passageiros da aviação civil
Publicidade da Folha Online
Entre a última sexta-feira (22)
e esta terça, a FAB (Força Aérea Brasileira)
transportou 2.615 passageiros da aviação civil
comercial. Os aviões foram disponibilizados para
minimizar os transtornos sofridos pelos passageiros, nos
principais aeroportos do país.
Os problemas seriam conseqüência
da falta de aeronaves da TAM, que haviam parado para manutenção.
Sem as aeronaves da TAM e as dificuldades de reagendar os
vôos e reacomodar os passageiros levantou suspeita
de "overbooking" --venda de passagens acima da
capacidade dos aviões.
Em nota, a FAB afirma que, ao todo, foram
realizadas 21 "missões". O último
vôo da operação foi feito na segunda-feira,
dia de Natal, e foi concluído à 1h30 desta
terça.
"As missões compreenderam várias
escalas, em cidades das regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste
e Nordeste", diz a Aeronáutica.
Além da FAB, seis aviões
da BRA, Varig, OceanAir e Gol também transportaram
passageiros da TAM.
Nesta terça, a Anac (Agência
Nacional de Aviação Civil) iniciou uma auditoria
na TAM, "para conhecer os motivos dos transtornos registrados
nos últimos dias". A agência também
vai fiscalizar o sistema de reserva de todas as companhias
aéreas para evitar transtornos no Réveillon.
Site - Blig do
Tão
25/12/2006 18:51
O pouso nada suave da Varig no 'novo'
mercado áereo
Tão Gomes Pinto
Bem, voltando ao tema 'apagão aéreo'
mostramos onde tudo começou. Acho que em posts anteriores
já falei sobre a insaciável fome de lucros
do 'duopólio' TAM e Gol.
Acho até que elas, por instinto,
pressentiram que não teriam décadas de fartura.
Era, portanto, necessário faturar rápido,
comer depressa, raspar o tacho.
Dizem que o balanço da TAM, quando
for publicado, vai mostrar um lucro de mais de R$ 500 milhões.
O governo ouviu por tempo demais os 'facilitadores de negócio'
(seria mais fácil, todo mundo entenderia, dizer 'lobbistas')
das empresas desse 'duopólio'.
Para gerar mais dinheiro com os mesmos
aviões, a TAM e a Gol criaram novo e prático
'layout interno' das suas aeronaves (sobre isso, tenho certeza,
já falei).
O 'estilo TAM de voar' passou a ser voar
dentro de uma lata de sardinha, pois colocaram mais fileiras
à bordo. A Gol fez o mesmo.
Para 'faturar' mais, escolheram Brasilia
como 'hub', o ponto de transfêrencia de um vôo
para outro.
Todo avião que vinha do Norte, tinha
de passar em Brasilia. Todo avião que vinha do Sul,
tinha de passar em Brasilia. Aqui se faziam todas as 'conexões'.
Conclusão: o 'hub' brasisiliense
congestionou o tráfego aéreo, os controladores
de vôo passaram a ver coisas estranhas nos radares,
alguns chegaram a ser internados por sobrecarga de serviço,
etc...
E ai acontece a tragédia do Gol
x Legacy. O 'imponderável de Almeida' do Nelson Rodrigues
estrava em ação. E a coisa desandou.
Virou aquela busca desenfreada por culpados,
levantou-se a questão falha técnica x falha
humana, falou-se em corte de verba do orçamento para
segurança de vôo - e houve cortes, sim, apesar
do Mínistro da Defesa nem saber disso (aliás
ele sempre foi o último a saber, entrou para a história
como o 'inocente inútil').
Enquanto isso, os 'facilitadores de negócios'
estavam mais preocupados em trabalhar junto a Anac para
impedir a aprovação de um tal de Cheta (Certificado
de Homologação de Empresa de Transporte Aéreo)
para uma tal de VRG S.A.
A tal de VRG S.A. nada mais era do que
a Varig.
Contra um 'facilitador de negócios'
(ou 'lobbista') a melhor arma a ser usada é um 'facilitador
de negócio' contrário.
E o pessoal da VRG, que comprara os restos
mortais da Varig por uma merreca, num leilão do 'inolvidable'
juiz Ayoub, faz tempo que sabe disso.
Os compradores dos restos mortais da Varig
estão acostumados a jogar pesado nesse tipo de mesa
de poker. Eles tinham o 'know how' norte-americano do fundo
Matlin Patterson Global Adviser, que por sua vez herdara
'know-how' do Credit Suisse.
Foi como se dissessem: ah... vocês
querem jogar bruto, pois nós sabemos as regras desse
jogo. E os 'facilitadores de negócios' tupiniquins
tremeram nas bases.
Até que, num dia de dezembro, tornou-se
inviável politicamente - esse 'inviável politicamente'
é a terminologia oficial usada nos negócios
com o governo - para a Anac resistir mais tempo.
Numa cerimonia rápida, ela reuniu
mais quatro empresas e forneceu a todas o cobiçado
Cheta. A VRG estava autorizada a voltar a operar no rico
- bota rico nisso - filão da aviação
comercial no Brasil.
O Matlin Patterson já operara na
compra da Varig-Log, a Varig de carga aérea.
Nesse ramo, de carga áerea, até
eu, que não entendo 'picles' do assunto, se conseguisse
entrar, ganharia muito dinheiro.
Agora, punha um pé na porta das
ambições do 'duopólio' TAM-Gol.
E que pé? Os sócios da VRG,
a nova Varig, são dois 'aviões' - perdão
mas uso o vocabulario do setor - do mundo maravilhoso do
'big business'.
Um é um discreto chinês chamado
Lap Luai Chan. É chinês mas mora no Brasil
faz tempo.
O outro atende por Santiago Born. Pois
é, tem tudo a ver com os Bunge and Born da vida.
Um terceiro 'elemento', Marco Antonio Audi
- que já era o presidente do Conselho de Administração
da Varig-Log - completou a linha de tres zagueiros do novo
time.
Só que são zagueiros que
jogam 'pra' frente, atacando sempre.
Espertos, não fizeram pressão
para a solenemente conhecida Agencia Nacional de Aviação
Civil, Anac, presidida por um 'companheiro' indicado pela
ministra Dilma Roussef - o já tristemente famoso
Milton Zuanazzi - soltar logo o certificado da VRG.
Eles precisavam de tempo para negociar
com os fabricantes e o pessoal de 'leasing' de aviões
as condições para remontarem a frota Varig.
Negociaram com a Boeing, com os fabricantes
do Airbus, com a própria Embraer.
Isso porque, pela regulamentação
da Anac, qualquer empresa tem de estar voando 30 dias após
receber o precioso Cheta.
A 'nova Varig' já começa
2007 com cerca de dois mil funcionários e 13 destinos
nacionais e quatro internacionais: Caracas, Bogotá,
Buenos Aires e Frankfurt.
Seus sócios já investiram
US$ 550 milhões no negócio. Os planos dos
novos donos são ambiciosos. Pretendem chegar a 80
aviões e gerar dez mil empregos em até quatro
anos.
Dificilmente a Varig voltará a ser
o que era – as rivais Gol e TAM abocanharam boas fatias
de mercado durante sua agonia.
A TAM vai permanecer grande por mais algum
tempo, até porque empresas aéreas demoram
a desaparecer. Mas a sua imagem, o 'jeito TAM de voar',
sai do 'apagão' irremediavelmente trincada.
Em nota de ontem , a Varig informava que,
desde quinta-feira, dia 21, transportou mais de 2.000 passageiros
da TAM em vôos extras, inclusive para destinos nos
quais a empresa não opera atualmente como Goiânia,
Uberlândia, Natal e João Pessoa, e acomodou
outros em vôos regulares.
E faz questão de dizer que seu gesto
ocorreu a pedido da Anac.
Fina ironia...
enviada por Tão
Gomes Pinto
PERFIL
Tão Gomes Pinto
Fundador do Jornal da Tarde e das revistas Veja e ISTOÉ.
Foi articulista e repórter da Folha de S. Paulo e
de O Estado de S. Paulo.
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