:::::RIO DE JANEIRO - 27 DE NOVEMBRO DE 2006 :::::

 

Revista Consultor Jurídico
25 de novembro de 2006
Sucessão barrada
Nova Varig não herda dívidas trabalhistas, diz juiz
por Aline Pinheiro

Ao contrário do que defendem as associações de juízes trabalhistas, o juiz Edilton Meireles, da 34ª Vara do Trabalho de Salvador, decidiu que não há sucessão trabalhista na recuperação judicial da Varig.

A sucessão das dívidas trabalhistas se tornou alvo de entendimentos contraditórios depois de publicada a nova Lei de Falências, Lei 11.101/05. O artigo 141, inciso II, diz: "Na alienação conjunta ou separada de ativos, inclusive de empresa ou de suas filiais, promovida sob qualquer das modalidades de que trata esse artigo, o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidentes de trabalho". Antes, a sucessão era inevitável.

Hoje, por enquanto, não há jurisprudência sobre os casos em que há e os que não há sucessão das dívidas trabalhistas. A nova regra ainda é muito. Para o juiz Edilton Meireles, no caso da Varig, a nova proprietária não herda as dívidas com ex-funcionários. Ele entende que a lei criou um contexto que garante ao novo comprador da empresa em recuperação judicial a não sucessão dos débitos.

A decisão do juiz Edilton Meireles não leva em conta posicionamento do Superior Tribunal de Justiça. No dia 10 de novembro, o ministro Ari Pargendler proibiu, liminarmente, a Justiça do Trabalho de processar ações de ex-funcionários da Varig. A liminar foi pedida pela empresa, que quer que seja declarada a competência da Justiça Estadual do Rio de Janeiro.

Vale lembrar que o juiz Luiz Roberto Ayoub, da 8ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, responsável pelo processo de recuperação judicial da Varig, também defende a não sucessão dos débitos trabalhistas.

 

 

Aeroconsult
27/11/2006
RISCO E RECEIO NOS CÉUS

São chamados de quase-acidentes e estariam ocorrendo nos céus brasileiros com alguma freqüência, apesar de não serem divulgados oficialmente. Segundo informações da TV Globo e da revista Época, publicadas também em vários jornais, só neste 2006 se teriam verificado 22 dessas quase-colisões, das quais três no mês de outubro. A última viu um Fokker-100 da Tam e um Boeing da Gol passarem a 60,96 metros um do outro, quando a distância mínima recomendada é de 300 metros. Em 2005, segundo relatório atribuído a um departamento do Comando da Aeronáutica, esses acidentes potenciais foram 80 e desde 1998 os riscos de choque no ar teriam totalizado 805.

A vasta área amazônica, sob controle da torre Cindacta-1, pela vastidão da região, a parcial insuficiência de cobertura entre Brasília e Manaus e a intensidade do tráfego aéreo, seria – em circunstâncias propícias, quando tudo ocorre em frações de minutos - a de maior risco potencial. Declarações de controladores estimam que em uma área de cerca de 70 milhas exista uma “zona cega, surda e muda”. Somente o ministro responsável não sabia disso, quando rebateu as críticas do jornalista americano que havia levantado a questão no artigo escrito no The New York Times, depois de ter passado pela emoção de sobreviver a bordo do Legacy na colisão com o Boeing da Gol. Foram necessários cerca de 50 dias para que as autoridades responsáveis admitissem essa realidade, atribuindo as falhas de comunicação a motivos estruturais ou técnicos. E foi necessária a crescente pressão da opinião pública e das famílias das vítimas da colisão para que na quarta-feira, numa audiência pública no Senado, o ministro da Defesa e o comandante da Aeronáutica admitissem que “erros do controle do tráfego aéreo, cometidos pela torre e não corrigidos (como deveriam ter sido) pelos pilotos americanos, podem ter causado o choque” entre o Legacy e o Boeing.

Mas a este ponto do ainda complicado relatório dos acontecimentos de 29 de setembro, o problema maior não está em determinar quem foi o maior responsável pelo desastre, mas sim na identificação das causas humanas e técnicas que ao se juntarem provocaram a morte de 154 inocentes.

O impacto e a crueldade da tragédia têm provocado, além do luto, reações inesperadas, esclarecedoras de uma situação que em outras circunstâncias e com freqüência assustadora poderiam ter vitimados centenas de outros passageiros nas aerovias congestionadas da floresta amazônica. Uma área de perigo revelada publicamente pela colisão entre o Boeing e o Legacy, que pelo seu potencial de riscos poderia ser considerada uma versão tupiniquim domesticada do Triângulo das Bermudas, as celebradas ilhas onde há décadas desapareciam viajantes nas águas profundas do Oceano Atlântico.

Causa espanto só pensar nas 22 “quase colisões” deste ano e nas centenas de outras que milagrosamente não aconteceram. E o espanto causa arrepios ao imaginar que, num desses vôos, poderíamos estar acomodados com nossos companheiros de viagem na cabine da aeronave que passou pelo risco de um “quase acidente” : talvez duas centenas de pessoas, pensando em tudo, menos que na eventualidade de precipitar de repente de 10 mil metros de altitude devido à colisão com outro avião.

Nos, veteranos de vôos realizados a bordo de aviões de todo tipo, desde os DC-3 que ligavam Rio a São Paulo, aos aclamados Boeing 707 e depois à sempre mais numerosa família de jatos de dois, três e quatros reatores, sabíamos que a fase de decolagem da aeronave era considerada delicada, devido ao enorme empuxo exigido para levantar da pista um aparelho pesando um número absurdo de toneladas. Nos falavam também que as turbulências, além de desagradáveis pelos vácuos de ar, era melhor que fossem evitadas e que, para isso, os radares a bordo tinham a sabedoria de indicar aos pilotos o caminho certo do mapa aéreo que passaria ao largo dos temidos cumulus nimbus. Deviam, ainda, ser temidos os imprevistos da aterrissagem, causados pelo estouro de alguns pneus, pela pista molhada ou geada, pela sinalização imperfeita ou pela sempre menos provável imperícia do piloto. E as estatísticas diziam, e ainda dizem, que é mais fácil morrer a bordo de nosso carro de estimação, numa rodovia ou até numa estrada urbana, por culpa da imprudência pessoal ou de outro motorista, do que viajando de avião a 10 mil metros de altitude, atravessando montanhas e oceanos, voando por 10 ou mais horas seguidas. A aviação comercial demonstrou ser tão confiável que até os viajantes mais sensíveis aprenderam a voar sem tensões.

Até aquele fatídico 11 de setembro de 2001, que foi o dia em que um grupo de terroristas seqüestrou quatro aviões americanos e os destruiu utilizando três como armas e fazendo precipitar o quarto quando estava a caminho da Casa Branca. Depois desses acontecimentos, viajar por via aérea ficou mais complicado, mas não houve aumento de riscos, devido aos controles impostos aos passageiros antes do embarque, em particular nos EUA. Aliás, esses controles sempre mais sofisticados repassavam aos passageiros quase a certeza de que, pelo menos a bordo, não encontrariam surpresas desagradáveis.

Assim, em cinco anos o tráfego aéreo cresceu no mundo inteiro e ninguém se preocupava com os céus lotados, pois se o céu é o limite, o espaço disponível era quase infinito. Em termos, pois crescia a necessidade de controles sempre mais precisos, como se deduzia olhando aqueles mapas projetados nos telões dos Centros de Controles, que indicavam o movimento paralelo de dezenas ou de centenas de aeronaves. Para isso havia técnicos, supervisores, sistemas eficientes de comunicação operando dia e noite, trocando informações em inglês, recebendo ou dando instruções, facilitando pousos e decolagens. Mas para tudo existem exceções. Uma delas foi assinalada no Brasil, numa área de cerca de 70 milhas, localizada na imensa floresta amazônica, onde existiria uma zona “cega, surda e muda”, entre outras em melhores condições, na qual uma aeronave com problemas poderia perder o rumo certo ou até colidir se, por um jogo do destino, sua rota cruzar com aquela de outra.

O perigo, para o futuro da indústria de transportes aéreos é que esse receio tome conta dos usuários, que poderão optar por viajar menos nas maravilhosas máquinas voadoras, visto que elas estão carecendo da proteção necessária, indispensável para que um ser humano que não seja Dédalo se disponha a aceitar o risco de desaparecer no ar.