::::: RIO DE JANEIRO - 26 DE AGOSTO DE 2007 :::::

 

Revista IstoÉ Dinheiro
26/08/2007
Gol enquadra Varig
Visual renovado e novos aviões - a mais tradicional companhia aérea do País tenta voltar à cena. Mas a sucessão das dívidas preocupa os Constantino
DANIEL LEB SASAKI

Passaram-se cinco meses desde que a família Constantino de Oliveira, acionista majoritária da Gol, comprou a Varig. Desde então, pouco se fala do negócio, sobretudo devido aos últimos capítulos da crise nos aeroportos. Mas não se engane: nos corredores do grupo, a atividade está mais intensa do que nunca e, em poucas semanas, a Varig virá a público para anunciar uma profunda reestruturação. Mudança número um: a empresa atualizará completamente seu visual, o que inclui desde os uniformes até a pintura das aeronaves. É segredo mantido a sete chaves pela companhia e pela agência contratada para fazer o trabalho, a DM9DDB, mas uma fonte que acompanha o processo adiantou detalhes à DINHEIRO. "Eles vão otimizar custos. Na pintura, nada de extravagâncias. Os aviões perderão a barriga azul. Os motores e toda a fuselagem serão brancos, como na Gol. A tipologia do nome Varig será levemente alterada ao lado ficará a bandeira do Brasil", e diz. Mas a grande mudança será no logotipo:

ANTES E DEPOIS:
A nova estrela da Varig deve ficar menos
dourada e mais laranja do que no logotipo atual

"Pode esperar uma estrela maior, talvez vazada, conceito que a JAL, a United e a Delta adotaram." Claro, uma estrela menos dourada e mais laranja, semelhante à cor oficial da Gol. A ilustração no início da matéria é uma simulação, mas se baseia na descrição da fonte. "A Varig é um nome forte, mas estamos fazendo uma adequação à realidade em que ela vai viver e isso requer algumas mudanças importantes", avisa Murilo Barbosa, diretor de marketing. Lincoln Amano, o diretor comercial, completa: "Nosso foco será voltado para modernidade, conforto e uma gestão eficiente, de forma a ter os custos bem administrados para poder competir com todo mundo."

Nenhum dos dois executivos confirma a data da apresentação do novo visual ou o valor investido. Mas o prazo de entrega dos próximos Boeing 767 dá uma idéia de quando a novidade virá a público. Um deles chega ainda em agosto. Um segundo, em setembro. É justamente no momento em que a Varig precisa resolver a sua maior prioridade: a retomada de rotas que estão suspensas há mais de um ano e sob risco de cancelamento pela Anac. Hoje, a companhia conta com 19 aviões.

Até o fim do ano, receberá mais 13 equipamentos, todos da Boeing. Investimento de R$ 60 milhões. A meta é chegar a 42 aeronaves em 2012. A Gol conseguiu driblar a escassez de jatos no mercado, para, em 20 de setembro, iniciar uma verdadeira corrida contra o tempo. "Começaremos os vôos para Paris e Roma, saindo de São Paulo. Em outubro, será a vez de Madri", conta Amano.

Em novembro, a empresa reativará as linhas de Santiago e Cidade do México e, em 2008, voltará para os EUA e possivelmente inaugurará uma rota para a China. No médio prazo, mais novidades: o grupo abrirá uma concorrência entre Boeing e Airbus para escolher entre os novos 787 Dreamliner ou A350 - os aviões mais modernos do mundo.

A Varig também reforçará as vendas pela internet. As salas VIP nos aeroportos internacionais serão aprimoradas. Oferecerão serviço premium para clientes da classe executiva e os de maior pontuação no Smiles, o programa de milhagens da empresa. Muito luxo e conforto, mas nada de desperdícios.

Tudo parece ótimo, mas há arestas a aparar - algumas bem difíceis e inesperadas quando Constantino desembolsou US$ 320 milhões pela Varig. O fantasma que mais aflige o grupo é a possibilidade de herdar os débitos da antiga Varig, coisa na casa dos bilhões de reais. No início de agosto, o governo argentino proibiu a Nova Varig de operar no país, sob a alegação de que não está com a documentação em dia. As razões, no entanto, teriam mais a ver com problemas trabalhistas com funcionários locais oriundos da Varig antiga.

E embora a Gol trabalhe para driblar a questão da sucessão, fontes ligadas ao setor afirmam que o grupo já assumiu débitos cobrados por aeroportos europeus, o que abre uma premissa importante para os credores. "As autoridades portuárias examinaram e viram se tratar de uma sucessora. A Varig do Constantino aceitou arcar com uma dívida de 6,5 milhões de libras para manter os slots em Heathrow (Londres) e pagou US$ 5 milhões aos franceses por Orly (Paris)", diz a fonte.

Até o fechamento desta edição, a empresa não havia confirmado as informações. O que confirmou em balanço foi um resultado não tão bom: o grupo Gol apresentou prejuízo líquido consolidado de R$ 35,4 milhões, em parte atribuído à incorporação dos resultados da Varig, cuja taxa de ocupação média ficou em 52,3%. Como se vê, ainda há muito trabalho pela frente.

 

 

O Estado de São Paulo
26/08/2007
Jobim e Lula definem amanhã sucessão na Anac
Ministro promete anunciar esta semana mudanças no modelo de funcionamento da agência
Alessandra Saraiva

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, disse que vai se reunir amanhã com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para discutir quem vai suceder Denise Abreu na diretoria da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Desafeto do ministro, Denise renunciou ao cargo na sexta-feira. Jobim, que desembarcou ontem no Rio, também prometeu anunciar mudanças no funcionamento da Anac esta semana. O ministro já revelou a auxiliares que não se contentará apenas com a saída de Denise. Quer a renúncia dos outros quatro diretores da agência.

Jobim não quis dizer se já tem algum candidato para a vaga de Denise, apesar das informações de que um dos cotados é o brigadeiro Jorge Godinho, seu assessor mais próximo no ministério. “O presidente Lula e eu vamos examinar o assunto. Vamos nos reunir na segunda-feira. Veremos quem será encaminhado para a posição.”

Jobim participou no Rio de uma cerimônia em homenagem ao Dia do Soldado, no Palácio Duque de Caxias. Questionado se havia previsão de futuras demissões na diretoria da Anac, o ministro desconversou: “Eu não trabalho com previsões, trabalho com fatos.”

Porém, quando indagado sobre a necessidade de reformulação da agência, Jobim foi taxativo. “Vamos trabalhar nesse sentido. Semana que vem vocês vão tomar conhecimento.”

O Estado apurou que a cúpula da Anac, formada por Milton Zuanazzi, Leur Lomanto, Jorge Velozo e Josef Barat, decidiu se reunir após a renúncia de Denise para traçar uma estratégia conjunta e tentar resistir à pressão do ministro. Procurados durante todo o dia, Zuanazzi e Lomanto não atenderam a pedidos de entrevista.

Denise e Zuanazzi, que preside a agência, eram os principais alvos das críticas de Jobim. Mas é Velozo, justamente o único diretor com conhecimento técnico da aviação, quem pode ser o próximo a sair, por conta das pressões contra a agência

Denise renunciou após um mês de bombardeio no governo e no Congresso. Acusada de ter enganado uma juíza federal, apresentando uma norma sem validade legal para manter aberto o Aeroporto de Congonhas, ela foi convocada a se explicar pela CPI do Apagão da Câmara, na quinta-feira. Acabou se complicando ainda mais ao divulgar documentos segundo os quais a Anac já previa, desde dezembro, o risco de um avião “varar” a pista de Congonhas. Apesar disso, o aeroporto continuou operando. Em 17 de julho, um Airbus da TAM atravessou a pista, bateu num prédio e explodiu. Morreram no acidente 199 pessoas.

 

 

Jornal do Brasil
26/08/2007
Editorial: Denise é só a primeira da fila

Não surpreendeu tanto o pedido de demissão da diretora da Anac Denise Abreu quanto os termos de seu lacônico comunicado à nação. Há dias até as paredes do Congresso Nacional sabiam que o destino dessa estranha e incomum personagem da crise aérea estava selado. Apenas ela, do alto de um comportamento que foi a tônica do mandato, insistia em dizer que ficaria até o fim. Como este veio bem antes do que previa, saiu-se com a pérola definitiva, reservando as explicações que sonega à sociedade desde o desastre com o Boeing da Gol para serem dadas "pessoalmente ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva".


É pouco provável que o presidente queira comprometer-se novamente em um lamaçal de onde parece estar saindo desde a nomeação de Nelson Jobim para o Ministério da Defesa. Só o faria se quisesse, como milhões de brasileiros, descobrir o que levou a funcionária da agência reguladora a voar 35 vezes às custas das empresas que deveria fiscalizar. E, pior, a considerar tal comportamento absolutamente normal.


Denise Abreu tem realmente muito a explicar. Deixou a Anac justamente por não ter o que dizer para justificar decisões agora tornadas públicas. Teria de fazê-lo no inquérito administrativo aberto por determinação de Jobim, com prazo de conclusão de 30 dias, quando o normal é o dobro. Para tanta confusão, não haveria tempo hábil capaz de permitir a formação de provas de defesa.


A raiz da demissão, vale lembrar, é o retrato da gestão à frente da Anac do grupo de apadrinhados políticos sem expressão, do qual Denise sempre foi o maior símbolo. Poucas vezes na História recente do país se viu uma trapalhada maior do que o uso de um documento sem valor legal para induzir uma desembargadora a decidir a favor das empresas, evitando o fechamento da pista de Congonhas em condições críticas de pouso sob chuva.


Flagrada na irregularidade, Denise Abreu culpou a área de informática da Anac e, em segunda instância, os procuradores da agência. Não recuou nem ao ser desmentida pelo autor do texto, em depoimento à CPI do Apagão, nem diante da irritação da magistrada, que vetou a proibição pedida pelo Ministério Público e sentiu-se "iludida". Mas não teve como resistir à revelação de que a documentação fora discutida e emendada por representantes da companhia aérea e estava longe de ser apenas um rascunho.


O cerne desse problema passa ao largo da má-fé que permeia a utilização da norma. Está no fato de que, por diligência de Denise Abreu, a Anac impediu a suspensão das operações em um aeroporto em situação mortal. A medida judicial teria salvo todas as 199 vidas incineradas na explosão do Airbus da TAM. Ao horror imposto à família dessas pessoas agora se soma a repulsa diante de um comportamento que escapa da irresponsabilidade para o âmbito da negligência criminosa.


O país não acredita, como afirma Jobim, que a saída da diretora "elimine um ponto de atrito da Anac com a sociedade". Ela é apenas parte de uma engrenagem que ganhou vida própria pelas distorções e interferências políticas no modelo original do qual nasceu. Outras cabeças precisam ser cortadas, nem que por força de ações criminais movidas pelo Ministério Público.


Mas é ilusão achar também que será fácil realizar tal depuração. Afinal, Denise Abreu e os outros diretores são figuras condecoradas com a Medalha Santos Dumont, da Aeronáutica, "por seus relevantes serviços prestados à aviação". E esses interesses não aceitam ser contrariados.

 

O Globo
26/08/2007

 

Folha de São Paulo
25/08/2007
Pressionada, diretora da Anac renuncia
Em carta ao ministro Nelson Jobim (Defesa), Denise Abreu alegou motivos pessoais, que seriam explicados a Lula
A Folha apurou que influiu na decisão de Denise a ação cautelar do Ministério Público Federal, em São Paulo, que pede seu afastamento

LEILA SUWWAN e HUMBERTO MEDINA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
ROGÉRIO PAGNAN DA REPORTAGEM LOCAL

Pressionada por denúncias de irregularidades, acusada de fraude processual, com sigilos quebrados e desgastada, Denise Maria Ayres de Abreu, 45, apresentou ontem à tarde sua renúncia, "em caráter irretratável", ao cargo de diretora de Serviços Aéreos e Relações com Usuários da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil).

Em carta ao ministro da Defesa, Nelson Jobim, ela alegou "motivos pessoais", que seriam explicados diretamente ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Porém, a Folha apurou que influiu na decisão de Denise a ação cautelar apresentada à Justiça ontem à tarde pelo Ministério Público Federal, em São Paulo, pedindo o afastamento dela por 60 dias.

A rapidez com que pessoas ligadas à Anac ficaram sabendo da ação ilustra isso.

De acordo com funcionários da Procuradoria, a ação foi distribuída às 14h47. Minutos depois, quando a procuradora Inês Virgínia Prado Soares, autora da ação, se reuniu com o juiz da 5ª Vara Federal Cível, Ricardo Rezende, que irá julgar o pedido, ela ficou sabendo que pessoas ligadas a Denise Abreu já haviam entrado em contato com o magistrado para saber detalhes do caso.

Segundo a procuradora, o pedido de afastamento buscava evitar que a diretora atrapalhasse a investigação sobre a denúncia de que teria entregue à Justiça Federal uma "falsa norma" de segurança para impedir restrições à operação de alguns aviões em Congonhas.

O documento, se fosse válido, poderia ter evitado o acidente do avião da TAM, que deixou 199 mortos.

A procuradora é responsável pela investigação na área cível, que apura se houve improbidade administrativa por parte de funcionários da Anac.

Na ação, a procuradora ilustra sua preocupação com Denise no cargo ao citar que estava em poder da então diretora um processo administrativo da Anac que pode apontar toda "a estratégia de defesa na ação em que o documento [falso] foi utilizado, a participação de cada agente público".

Carta

Denise Abreu discutiu sua renúncia com o presidente da agência, Milton Zuanazzi, e um assessor no meio da tarde de ontem. Após levar a carta a Jobim, decidiu cancelar um pronunciamento público.

Jobim, que trabalha nos bastidores para mudar toda a direção da agência, disse que a saída de Denise Abreu é o primeiro passo para repensar a Anac.

"É uma decisão importante porque faz com que a Anac reduza o seu grau de atrito e o seu grau de tensão com a sociedade", disse.

Anteontem, Denise afirmou à CPI do Apagão Aéreo na Câmara que não pretendia renunciar. A comissão análoga do Senado havia quebrado seus sigilos bancário e fiscal. Ela se disse "injustiçada" e "alvo de uma artilharia incansável".

A situação de Denise no governo foi classificada de insustentável após o episódio da "falsa norma" -e das diferentes versões apresentadas por ela.

Antes disso, ela foi acusada pelo brigadeiro José Carlos Pereira, ex-presidente da Infraero, de fazer lobby pela transferência do terminal internacional de cargas de Congonhas para o aeroporto estadual de Ribeirão Preto (314 km de SP), o que favoreceria um amigo.

"Dra. Denise", como é conhecida, tem fama de caráter forte e autoritário. Ela própria reconhece que é considerada "terrível" e relatos dão conta de que é hiperativa e propensa a discussões acaloradas. Ela diz ser alvo de preconceito por ser mulher.

Ficou conhecida pelo episódio do "charuto", com o qual foi fotografada na festa de casamento da filha de outro diretor da agência, Leur Lomanto, em Salvador, em meio à crise aérea de março, causada pelo motim dos controladores de vôo.

Jobim não descartou a saída dos demais diretores da Anac, como é cogitado nos bastidores políticos. "Cada coisa no seu tempo", afirmou.

Ele afirmou que repassará o pedido de demissão para o presidente Lula. "Estou encaminhando para o presidente, para que possam ser feitos os últimos atos e possamos partir para a frente, ou seja, começar a repensar a Anac", afirmou.

Denise trabalhou em governos tucanos em São Paulo e fez carreira em Brasília a partir de 2003, depois de pedir demissão de cargo concursado de procuradora do Estado de São Paulo.

Ela foi nomeada pelo então ministro José Dirceu como assessora na Casa Civil em 2003.
Três meses depois virou adjunta do então subchefe de Assuntos Jurídicos, José Dias Toffóli. Hoje ele é advogado-geral da União.

 

 

O Estado de São Paulo
26/08/2007
Zuanazzi e outros diretores se reúnem para traçar estratégia conjunta
Bruno Tavares

Acuados pela renúncia da diretora Denise Abreu, os outros quatro integrantes da diretoria colegiada da Anac começaram ontem mesmo a pensar em quais serão seus próximos passos à frente da agência. No fim da tarde de ontem, Milton Zuanazzi, Leur Lomanto, Jorge Velozo e Josef Barat marcaram uma reunião informal para discutir uma estratégia conjunta de ação para os próximos dias. O encontro deveria ocorrer à noite na residência de Lomanto, em Brasília.

Embora tenham se mantido alheios ao bombardeio vivido por Denise nas últimas semanas, os demais dirigentes da agência têm plena consciência de que o ministro da Defesa, Nelson Jobim, continuará tentando tirá-los do cargo. Por isso, querem afinar o discurso daqui para frente. Na avaliação de fontes do setor aéreo, um pedido de renúncia coletiva é improvável. Mas, diante da crise atual, não pode ser descartada.

Há um mês, o próprio governo se encarregou de tentar articular uma saída dos diretores da Anac. Na manhã de 24 de julho, Zuanazzi, presidente da agência, chegou a colocar o cargo à disposição de sua madrinha política, a ministra- chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Quatro de seus pares apoiaram a decisão. A única resistência partiu de Denise, que se recusava a deixar o posto e achava que, com a saída de Zuanazzi, ficaria exposta.

Para acelerar o desfecho, o governo buscou a todo custo uma “saída honrosa”, um meio de recolocar todos os dirigentes no mercado de trabalho. As negociações emperraram em diversos pontos. Além da resistência de Denise, pesou o fato de Lomanto ter respaldo político - foi indicado pelo PMDB, um dos principais aliados do governo no Congresso - e até indefinição sobre o futuro profissional de diretores de menor expressão, como Velozo e Barat.

“Apesar das divergência com o Milton, a Denise sempre achou que existia uma coesão dentro da agência”, avalia um executivo do setor, que conviveu com os cinco diretores desde a criação da Anac. “Agora, após a saída dela, é bem capaz que eles se unam.”

 

 

O Estado de São Paulo
26/08/2007
Mais polêmica que sucesso em 10 anos de vida pública
Denise Abreu colecionou desafetos e frases infelizes nos 17 meses em que esteve na direção da Anac
Bruno Tavarese Rodrigo Brancatelli

Difícil, forte, teatral, autoritária, bem relacionada. Em menos de dez anos de vida pública, a advogada paulistana Denise Maria Ayres de Abreu, de 45 anos, colecionou mais adjetivos, apelidos, polêmicas e desafetos do que sucessos propriamente ditos. Foi justamente no auge da carreira, ao assumir a direção colegiada da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) por 17 meses, que ela consolidou sua fama.

Formada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (foi colega de turma do deputado cassado José Dirceu na PUC, onde os dois se formaram em 1983), Denise foi procuradora do Estado e trabalhou por um breve período durante o governo Mário Covas na Secretaria de Administração Penitenciária. Prestou consultorias jurídicas na Junta Comercial do Estado, acompanhou processos de execução fiscal de empresas e atuou na área jurídica da extinta Fundação do Bem-Estar do Menor (Febem).

“Ela sempre foi truculenta”, diz o advogado Ariel de Castro Alves, coordenador do Movimento Nacional de Direitos Humanos, que teve vários atritos com Denise. “Não respeitava ninguém, costumava impedir advogado de entrar na Febem. Uma vez em 2000 eu fui com um relator da ONU na unidade de Franco da Rocha, e ela não nos deixou entrar. Ela queria mandar em tudo e em todos.”

Um ex-procurador que trabalhou com Denise na Procuradoria-Geral do Estado também critica a postura da advogada. “Na época em que ela estava na Febem, houve muitas denúncias dos internos de maus-tratos”, diz. “Mas ela não apurava, colocava a culpa nos próprios internos. Do pouco contato que tive com ela, sei que defende com muita ênfase, mais do que o necessário, as instituições que ela representa.”

Seu cargo mais vistoso foi o de assessora e subchefe-adjunta da Subchefia para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência, de 2003 e 2005, sob o comando do então ministro e seu amigo José Dirceu. Quando deixou o governo no escândalo do mensalão, Dirceu prometeu a Denise um cargo importante. Ele veio na forma de diretora da recém-criada Anac, que substituiu o Departamento de Aviação Civil - autarquia ligada ao comando da Aeronáutica.

Mal assumiu e já ganhou a alcunha de “piloto sem brevê”. Isso porque, embora tenha insistido que foi indicada para a diretoria por méritos profissionais, Denise nunca teve experiência para administrar o setor aéreo.

Nas quatro páginas do currículo, aprovado em 15 de dezembro de 2005 pela Comissão de Infra-Estrutura do Senado, ela recheia sua biografia com vagas experiências, sem citar detalhes. Do tipo: “experiência burocrática e executiva”, “experiência em assessoramento”, e “experiência em negociações de risco”. A bem da verdade, a “experiência” mais próxima com aviação está nessa citação: “participação em grupos de trabalho acerca do setor aéreo”.

A imagem de Denise perante as empresas aéreas não era muito diferente da retratada por seus pares. Por diversas vezes, protagonizou discussões acaloradas com executivos e integrantes do governo. Nos bastidores, sempre foi acusada de defender os interesses das companhias - fato reforçado pela descoberta de que o irmão dela, o advogado Olten Ayres de Abreu Júnior, havia prestado serviços para a TAM na Europa. “Apesar da personalidade forte, ela assumia as responsabilidades, enquanto os demais diretores ficavam atônitos”, diz um executivo do setor.

Na primeira crise, a primeira polêmica. Depois do acidente entre o Legacy e o Boeing da Gol, em setembro do ano passado, Denise teve de pedir desculpas aos parentes dos 154 mortos. De acordo com relatos de familiares das vítimas, ela teria reagido da seguinte forma quando abordada sobre a operação de resgate dos corpos: “Vocês são inteligentes, o avião caiu de 11 mil metros de altura, o que vocês esperavam? Corpos?”

Um oficial da Força Aérea Brasileira (FAB) lembra que, após a entrevista, parentes das vítimas se recusaram a receber informações da Anac. “A declaração foi tão desastrosa que fomos obrigados a intervir.” Em 30 de março deste ano, na mesma noite em que os controladores de vôo pararam os aeroportos do País, Denise foi flagrada pela reportagem do Estado fumando charuto na festa de casamento da filha de Leur Lomanto, também diretor da Anac, em Salvador. Participaram da celebração, além de dirigentes da Infraero, executivos da Varig, da BRA e da Gol. “Acho que o próprio ministro Waldir (Pires, demitido após o acidente da TAM) vai tomar a iniciativa de se retirar do governo”, disse Denise para os colegas durante a comemoração. “Essa crise tem sido estressante para nós, que já não somos brotinhos, imagine para alguém com 80 anos de idade.”

Questionada na CPI do Apagão Aéreo do Senado sobre a festa em Salvador, Denise adicionou mais uma frase à coleção de aspas infames: “Fui exposta à nação como uma mulher insensível. Não fumo charuto. Nunca fumei charuto. (O ex-premiê britânico Winston) Churchill, sim, fumava charuto. Ele veio de família humilde e foi um grande estadista”. Em tempo: neto do sétimo duque de Marlborough, Churchill vinha de uma das mais aristocráticas famílias britânicas.