O Estado de São Paulo
24/08/2007
Anac já sabia em dezembro
que avião poderia 'varar' pista
Ata de reunião revela
que agência e empresas previram risco de aeronave
não conseguir parar em Congonhas
Luciana Nunes Leal
Um documento revelado ontem pela CPI do Apagão
da Câmara prova que, sete meses antes da tragédia
do Airbus, autoridades da Agência Nacional de Aviação
Civil (Anac) e da Empresa Brasileira de Infra-Estrutura
Aeroportuária (Infraero) tinham noção
exata do perigo que era pousar na pista do Aeroporto de
Congonhas. Em reunião de técnicos da Anac
e Infraero e companhias, em 13 de dezembro, foi discutido
o risco iminente de um avião perder o controle
e 'atravessar' a pista.
Os técnicos discutiram o assunto com o gerente
de Padrões de Avaliação de Aeronaves
da Anac, comandante Gilberto Schittini. Segundo ata da
reunião, realizada no Rio, Schittini 'reportou
que os três incidentes ocorridos recentemente poderiam
ser considerados indícios de que há um potencial
de ocorrências mais graves, com ultrapassagem do
final da pista (varar a pista)'. Foi o que aconteceu com
o Airbus, que cruzou a cabeceira e explodiu ao bater no
prédio da TAM Express, matando 199 pessoas.
O comandante acrescentou, segundo a ata, que o risco
existia 'principalmente se houver uma situação
de decolagem abortada ou uma situação de
pouso com velocidade e altura superior à de aproximação
(pouso alto e embalado)'. A ata da reunião foi
distribuída ontem aos deputados da CPI pela diretora
da Anac Denise Abreu, que prestou depoimento de mais de
sete horas.
No mês passado, o chefe do Centro de Investigação
e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos
(Cenipa), brigadeiro Jorge Kersul Filho, disse à
CPI ter feito uma reunião de emergência,
em 28 de dezembro, com Anac, Infraero e companhias. Segundo
ele, houve um comentário nos seguintes termos:
'Tudo leva a crer que teremos um acidente em Congonhas.'
Emocionado, lamentou: 'Não conseguimos evitar o
acidente que tínhamos previsto.'
A ata da reunião do dia 13 mostra que o encontro
foi aberto pelo superintendente de Infra-Estrutura Aeroportuária
da Anac, Luiz Kazumi Miyada, que classificou de 'preocupantes'
os três incidentes na pista principal de Congonhas.
Representantes de companhias revelaram a recomendação
aos pilotos, feita já naquela época, para
que pousassem no Aeroporto de Cumbica, caso não
tivessem segurança de aterrissar em Congonhas.
Também cobraram das autoridades informações
mais precisas sobre as condições da pista
de Congonhas.
Os representantes da BRA disseram que a empresa emitiu
boletim técnico 'após ter dificuldade de
frenagem em operação de pouso'. Pela ata,
o critério estabelecido pela BRA era o de que,
em dúvida, o comandante deveria alternar para o
aeroporto de Cumbica. E todas as operações
de pouso em Congonhas seriam feitas com autobreaking (sistema
automático de frenagem) em nível máximo.
O comandante Igor Bruno falou pela Gol. Cobrou a necessidade
de 'melhor qualidade de informação das condições
da pista'. 'Por precaução, (a Gol) vem utilizando
o autobreaking em máximo para todas as condições
da pista, não havendo pressão sobre os pilotos
para pouso em Congonhas.'
Representantes da TAM registraram ter distribuído
alerta aos pilotos detalhando operações
em pista molhada, 'realizadas somente pelo comandante
da aeronave', e também cobraram 'fornecimento das
corretas condições da pista'.
Ficou decidido que a Anac pediria o aval da Aeronáutica
para a suspensão de operações na
pista principal, 'visando medir a lâmina de água'
na pista. Em 24 de janeiro, portaria determinou que fossem
proibidas operações quando houvesse mais
de 3 milímetros de água em mais de 25% da
pista.
Anteontem, em entrevista ao Estado, o procurador federal
Márcio Shusterschitz, autor da ação
que pedia o fechamento da pista principal de Congonhas,
criticou a forma como a Anac conduziu a questão.
'A segurança nunca foi preocupação
primeira', disse. 'Antes do dia 17, havia o binômio
risco-desculpa. Depois, virou o binômio acidente-desculpa.
Todas as ações da agência fazem parte
de um contexto único.'
CRONOLOGIA
13 de dezembro: Técnicos da Anac demonstram preocupação
com as condições da pista de Congonhas.
Geraldo Schittini, da agência, fala do risco de
aviões vararem a pista e informa às empresas
que está elaborando uma norma para operações
em dias de chuva
16 de janeiro: A funcionária da Anac Doris Vieira
da Costa encaminha a Schittini, com cópias para
empresas e Infraero, sugestões para a elaboração
da norma
24 de janeiro: Procuradores federais em São Paulo
ingressam com ação em que pedem a interdição
da pista de Congonhas. No mesmo dia, a Anac edita portaria
para procedimentos com pista molhada. Nela, determina
a suspensão das operações quando
o nível de água estiver acima de 3 mm
31 de janeiro: A Anac encaminha documentos técnicos
à Justiça e sustenta que a pista tem condições
de uso. No mesmo dia, a agência divulga em seu site
a Instrução Suplementar que fixa normas
para operação em pista molhada. É
o documento que, mais tarde, a diretora Denise Abreu classificou
como 'estudo interno'
5 de fevereiro: O juiz Ronald de Carvalho Filho proíbe
o pouso na pista principal de Congonhas dos aviões
Fokker 100 e Boeings
22 de fevereiro: A Anac encaminha ao Tribunal Regional
Federal (TRF) recurso contra a restrição.
Entre os documentos anexados está a norma 'extra-oficial'.
Denise e técnicos da agência entregam o recurso
à desembargadora Cecília Marcondes. No mesmo
dia, o tribunal libera as operações
17 de julho: Airbus da TAM vara a pista de Congonhas,
bate no prédio da TAM Express e explode, matando
199 pessoas
16 de agosto: Na CPI do Apagão Aéreo do
Senado, Denise diz que a norma era um 'estudo interno'
e foi divulgada 'por engano'.
20 de agosto: A desembargadora se diz 'enganada' por
ter recebido documento sem valor legal
22 de agosto: O ministro da Defesa, Nelson Jobim, anuncia
abertura de processo disciplinar para investigar o envio
da norma.
O Estado de São Paulo
24/08/2007
Na véspera da tragédia,
11 pousos com problemas
Marcelo Godoy
Pilotos de 11 aviões contaram à polícia
que enfrentaram dificuldades para pousar no Aeroporto
de Congonhas em 16 de julho, véspera do acidente
com o Airbus A-320 da TAM. Chovia naquele dia, mas de
forma moderada. Dois pilotos disseram que por pouco não
'vararam' a pista principal. Um terceiro, que comandava
o jato ATR-42 da Pantanal, derrapou e parou no gramado
ao lado da pista.
A culpa, afirmaram os pilotos, foi da pista escorregadia,
um 'sabonete'. 'Todos dizem que, se o grooving (ranhuras
que ajudam na drenagem) tivesse sido feito, teriam pousado
sem problemas', afirmou o delegado Antônio Carlos
Barbosa, do 27º Distrito, que preside o inquérito
sobre o acidente. Segundo ele, o número de pilotos
que relataram dificuldades indica que havia algo de errado
na pista - liberada em 29 de junho, depois de 45 dias
de reforma, sem o grooving concluído. O delegado
vai esperar os laudos da perícia sobre a pista
para definir se houve negligência na liberação
para pouso em dia de chuva.
A maioria dos pilotos que denunciaram problemas trabalha
na TAM, mas há casos envolvendo aviões da
Gol e da Varig, além do ATR-2. O delegado ouviu
ontem João Batista Nunes Ribeiro, que pousou no
dia 16 no comando de um Airbus A-320 da TAM. Quando tocou
no asfalto, o avião aquaplanou na pista encharcada.
'Só a muito custo ele conseguiu dominar a aeronave.'
O Airbus parou a cerca de 200 metros do fim da pista.
Ribeiro disse à polícia que não
informado pela torre de controle das condições
da pista. Depois do Airbus, pousaram um avião da
Varig e o ATR-42.
Foi identificado ontem o corpo da 195ª vítima
da tragédia. É o bancário Rodrigo
Benacchio, que trabalhava no Banco Real.
O Estado de São Paulo
24/08/2007
OceanAir inicia vôos para
o México
A OceanAir começa no dia 31 a voar para o México,
sua sua primeira rota internacional. A empresa informou
que terá cinco freqüências semanais
para o país. Os vôos serão feitos
com um Boeing 767-300R, com 212 lugares, sendo 182 na
classe econômica e 30 na classe executiva. Os próximos
destinos internacionais da empresa serão Luanda,
em Angola, Lagos, na Nigéria e Los Angeles (EUA).
O Estado de São Paulo
24/08/2007
EUA multam empresas por cartel
Um tribunal federal americano aprovou ontem a aplicação
de uma multa contra a British Airways e a Korean Air Lines,
que assumiram ter fechado acordo sobre tarifas para passageiros
e cargas em vôos internacionais, violando assim
a lei antimonopólio. Outras duas companhias aéreas,
a também britânica Virgin Atlantic e a Lufthansa,
da Alemanha, cooperam com a atual investigação
da justiça americana.
Coluna Claudio Humberto
24/08/2007
Três horas de chiliques para
viajar pela TAM
Anotações de bordo
para o superministro Nelson Jumbão:
- O vôo TAM 3575 Brasília-São Paulo
devia decolar na manhã de ontem, às 10h08.
Não decolou porque o avião não conseguiu
sair de São Paulo.
- Mudaram os passageiros para o vôo TAM 3703, com
decolagem prevista para 10h37. Só chamaram para
embarque às 11h15.
- Ao apagão aéreo, somou-se o rodoviário.
Não havia ônibus suficiente para levar os
passageiros até o avião. O único
ônibus disponível foi e voltou quatro vezes,
até embarcar todo mundo. Aí já eram
11h45.
- Às 12h15, com todo mundo a bordo, o avião
não fechava a porta. A culpa era do deputado Clodovil
Hernandez (PTC-SP). Ele aguardava numa van da TAM, ao
pé da escada, enquanto alguém desse a vaga
que ele exigia no avião: "O deputado só
viaja na poltrona 1A", avisou o comandante, gerando
uma explosão de revolta no avião. Os passageiros
não topavam ceder o lugar, Clodovil não
se dignava a descer da van.
- Às 13h, cansado de esperar, Clodovil desistiu
e foi embora. Só então o avião decolou
para São Paulo, com um atraso de três horas.