:::::RIO DE JANEIRO - 23 DE OUTUBRO DE 2006 :::::

 

Site AEROCONSULT
23/10/2006
CONTAGEM REGRESSIVA
Guido Sonino

Os aposentados do Aerus que possuem um computador, não têm perdido ocasiões para se comunicar entre eles e para enviar e-mail a parlamentares e a jornalistas que tem demonstrado querer ajudá-los a resolver o maior e o menos esperado de seus problemas. Há alguns meses, eles estão recebendo 50% do valor de suas aposentadorias, se aderiram ao chamado Plano I da Varig e um pouco mais se pertencem ao Plano II.

Sem novas contribuições, depois da decisão da Secretária de Previdência Complementar, SPC, de liquidar os dois planos, os aposentados estão nas mãos de um interventor, incumbido de distribuir o dinheiro disponível e aquele eventualmente arrecadado com a venda dos ativos remanescentes, que incluem ações e imóveis. A previsão é de que em 2007 não haverá mais disponibilidades líquidas para o pagamento das aposentadorias do Plano I, enquanto a agonia do Plano II poderá se estender por mais tempo, talvez por um ano, ou mais. Neste ínterim, se houve a venda de alguns ativos, poderão ocorrer outros pagamentos parciais, mas ainda não se sabe se e como esses valores serão divididos a partir de 2007.

Essa é a situação, como se apresenta neste final de outubro, faltando apenas 60 dias para que o Aerus saia da atual fase de sobrevivência para entrar no estado de coma profundo. Se nada de positivo ocorrer, os aposentados, em particular aqueles do Plano I, a partir de janeiro deverão reestruturar ainda mais o seu “modus vivendi”, não somente abrindo mão de necessidades que passarão a ser consideradas não essenciais, como também cortando gastos que faziam parte de sua maneira de viver, além de ter que enfrentar prováveis graves dificuldades para adquirir medicamentos indispensáveis ou para pagar contas que integram as exigências da vida civilizada. Para a grande maioria será penoso, agora que superaram a fronteira da velhice, renunciar aos hábitos de uma vida inteira.

Nem será de consolo o fato que, segundo as estatísticas, no país há famílias que vivem até com um ou dois salários mínimos, pois é sabido que quem sempre pertenceu a essa categoria, tem outras entradas, fruto de atividades paralelas que é impossível iniciar quando a idade avançou além dos 60 anos.

Todavia não faltarão, como já há, famílias de aposentados procurando formas para aumentarem suas rendas, que em qualquer época de suas vidas já foram cortadas pela Receita Federal, que nelas avançou impiedosamente. Ainda agora a R.F. obriga o Aerus a aplicar descontos em folha sobre qualquer valor recebido pelos aposentados que exceda os limites pré-fixados. Limites esses que, teoricamente, deveriam ser válidos para a “renda” dos cidadãos na ativa, e não para os aposentados, que estão recebendo o fruto de décadas de trabalho, durante os quais contribuíram à previdência do INSS ou àquela complementar do Aerus, para ter na velhice uma aposentadoria digna.

Mas agora, ficando apenas com a aposentadoria paga pelo INSS, perderão a opção melhor, na qual haviam investido suadas poupanças. Sem considerar que, em muitos casos, os valores das aposentadorias concedidas pelo Instituto Nacional de Previdência Social foram inferiores àqueles de direito, sendo aceitos, na época, somente porque havia a tranqüilidade dada pela existência da aposentadoria complementar do Aerus.

E´ imoral o que está acontecendo, afirmam jornalistas, políticos e quantos acompanham o drama do Aerus; não é ético dizem os que sabem que a Previdência Social, contrariando liminares da Justiça, não quer assumir a responsabilidade de pagar as aposentadorias cujas integridade não soube proteger, falhando na supervisão dos fundos e se omitindo, ao aceitar barganhas com as empresas aéreas; e é também um péssimo exemplo das autoridades federais continuar ignorando que milhares de cidadãos perderam o maior de seus direitos, um daqueles que o recente Estatuto dedicado aos velhos hipocritamente protege. O mais elementar deles, aquele que um ancião preza realmente, ou seja seu direito a uma velhice decente, depois de uma vida de trabalho.

Num País oprimido pelo estigma da corrupção, no qual até o dinheiro das aposentadorias foi roubado e levado para o exterior, no qual circulam livremente muitos ex-parlamentares que deveriam ter sido presos, assim como muitos ricos , dezenas de juízes, muitos donos de lojas de luxo, muitos funcionários e até dezenas de policias de todos os níveis, não dá para acreditar que um governo de origem popular, permanecerá insensível à chamada de milhares de ex-aeroviários e ex-aeronautas, uma categoria de trabalhadores que não levou fortunas para o exterior, mas lá contribuiu para elevar nas asas da Varig o nome e o prestígio do País.

Poucos ainda acreditam numa reviravolta a favor dos aposentados, mas essa minoria está decidida a manter viva sua esperança pelo menos até 31 de dezembro. De fato, ainda não há motivo para temer que no mesmo País que doa milhões de cestas básicas aos necessitados - numa iniciativa considerada exemplar pela ONU - seu governo, de inspiração social, continuará ignorando uma liminar da Justiça, que reconhece o direito de alguns milhares de idosos, aposentados, receberem do Estado o que legalmente lhes pertence.