Zero Hora
20/05/2007
Corrupção
"A Infraero deve ser investigada"
Entrevista: José Carlos Pereira - presidente da
Infraero
CAROLINA BAHIA/ Brasília
Desde que assumiu a presidência da Infraero, o tenente-brigadeiro-do-ar
reformado José Carlos Pereira, 64 anos, se especializou
em administrar crises. Começou com a derrocada
da Varig, passando pela greve dos controladores de vôo.
Agora, ele enfrenta a pressão de evitar que denúncias
de irregularidades na estatal administradora dos aeroportos
cheguem às CPIs do Apagão Aéreo.
Apesar de se confessar favorável às investigações,
J. Carlos, como é chamado, optou por cortar na
carne.
Por conta de auditorias da Controladoria-geral da União
(CGU), sete funcionários da Infraero foram afastados
até o momento. Entre os problemas em apuração,
está a suspeita de contratos irregulares na aquisição
do programa de computador que gerencia a comercialização
de espaços publicitários em aeroportos.
À frente da companhia desde março de 2006,
o brigadeiro é da cota do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva. Na quinta-feira, ele conversou com a Agência
RBS. A seguir, os principais trechos da conversa:
Zero Hora - Se a CGU e o Tribunal de Contas da União
(TCU) investigam problemas nos contratos da Infraero há
algum tempo, por que servidores foram afastados somente
agora?
José Carlos Pereira - Essa determinação
partiu da CGU. Quando a CGU assume a investigação,
afastamos os suspeitos e aguardamos as decisões.
ZH - O senhor já conhecia as irregularidades?
Pereira - Não. A atual investigação
se refere a coisas antigas. Muitos desses projetos falhos
que estão aí nasceram em 2001 e 2002. E
uma obra num aeroporto demora oito, 10 anos. Tenho na
minha mesa tudo o que o TCU tem registrado contra a Infraero.
É um livro grosso. Estabeleci como objetivo não
acrescentar nenhuma página àquele livro
e, na medida do possível, ir retirando páginas
dele. Consegui retirar umas 10 páginas, sem aumentar
nenhuma.
ZH - As duas CPIs no Congresso devem investigar a Infraero?
Pereira - Admiro muito o instituto da CPI. O problema
é quando sai do foco e entra na politicagem, é
horrível. Qual é o problema? Quais são
os problemas? O avião bateu. Tem de saber a razão.
Por que aconteceu? Pode acontecer outra vez?
ZH - Isso significa que, na sua opinião, a Infraero
pode ser investigada pela CPI?
Pereira - A Infraero não só pode como deve
ser investigada. Não só ela. Todo o setor
aéreo, incluindo empresas aéreas.
ZH - É verdade que o senhor tentou afastar pessoas
e não conseguiu por problemas políticos?
Pereira - Isso não é bem verdade. Assumi
um mandato tampão, no ano passado, sete meses antes
das eleições. Mandato tampão é
tampão. O próximo governo é que deveria
determinar mudanças.
ZH - O senhor vai ser trocado?
Pereira - Não sei. Estou louco para sair daqui.
Pode escrever isso.
ZH - Por quê?
Pereira - Estou ganhando pouco para suportar isto aqui.
Mas missão é missão. Não vamos
tumultuar o governo e, no meio de uma crise, abandonar
o barco.
ZH - Parlamentares afirmam que o esquema na Infraero
é muito parecido com o dos Correios. Obras foram
feitas, e recursos, desviados para campanhas. O senhor
também suspeita disso?
Pereira - Essas questões estão lá
no TCU. Abri um escritório para eles na Infraero
e dei computador, secretária, móveis. O
TCU vive aqui dentro. Todas as facilidades, arquivos,
senhas, está tudo aberto para eles. Não
cabe me intrometer em investigação. Não
somos polícia.
ZH - Existem desvios de recursos na Infraero?
Pereira - Olha, sou vigilante. Se aconteceu alguma coisa,
está sob investigação de quem é
competente. Optei por fazer uma auditoria sobre o planejamento
das obras. Quero saber como andou esse planejamento, principalmente
em São Paulo, o nosso calcanhar-de-aquiles. E a
nossa investigação está em andamento.
Agora, a auditoria não tem intenção
de descobrir culpados ou punir alguém, até
porque não tenho de punir ninguém. A idéia
da auditoria é nos alertar para vermos quais erros
cometemos no passado.
ZH - O conselho de administração investiga
a aquisição de programa de computador. Esse
é o principal problema?
Pereira - Essa investigação está
na CGU. É muito longa, pesada. Os afastamentos
têm tudo a ver com essa investigação.
ZH - Os contratos sob suspeita estão cancelados?
Pereira - Não. Mantivemos eles com a maior rigidez.
Mas gostaríamos de ter rentabilidade maior e não
temos. Não queremos arrecadar mais com isso, mas
também não queremos ser roubados.
ZH - Roubados?
Pereira - Não é bem roubado. Mas, quando
você não tem controle rígido dessas
coisas, as pessoas tendem a procurar brechas na lei para
usufruir. Isso é natural. Cabe à sociedade
se defender.
ZH - O Sindicato dos Aeronautas diz que no governo Fernando
Henrique Cardoso havia 80 cargos políticos na Infraero
e que agora são 247. O senhor confirma?
Pereira - O número é próximo a isso
mesmo, mas isso representa 2,5% do efetivo. Se você
comparar com outras estatais, está dentro da média.
Agora, concordo que 247 cargos políticos podem
ser considerados um número elevado. Estamos trabalhando
para corrigir essas coisas e manter os contratos naquilo
que é absolutamente sustentável para a empresa.
Frases
"Se você for comparar com outras estatais,
está dentro da média. Agora, concordo que
247 cargos políticos podem ser um número
elevado."
"A Infraero não só pode como deve ser
investigada. Não só ela. Todo o setor aéreo,
incluindo as empresas aéreas."
Zero Hora
20/05/2007
Corrupção
Pista escorregadia
Suspeitas contra a Infraero
CAROLINA BAHIA/ Brasília
Ao manobrar para evitar investigações de
corrupção nas CPIs do Apagão Aéreo
na Câmara e no Senado, o Planalto tenta esconder
o que o Tribunal de Contas da União, o Ministério
Público Federal e a Controladoria-geral da União
atestam: a empresa é um ninho de suspeitas de que
vão de superfaturamento em obras de aeroportos
a patrocínio a evento promovido pelo MST.
Blindada pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva
contra as investigações da CPI do Apagão
Aéreo, a Infraero é hoje alvo de mais de
70 processos em tramitação no Tribunal de
Contas da União (TCU), no Ministério Público
Federal e na Controladoria-geral da União (CGU).
As investigações, às quais Zero
Hora teve acesso, tratam de suspeitas de superfaturamento
de contratos, publicidade irregular e patrocínio
a evento do MST, entre outras.
Integrantes da oposição vêem semelhanças
entre essas irregularidades e as detectadas nos últimos
anos em estatais como os Correios.
- Analisamos alguns contratos e não temos dúvida:
o modus operandi é o do mensalão - adianta
o líder do Democratas na Câmara, deputado
Onyx Lorenzoni.
No contra-ataque, líderes governistas conseguiram
barrar o acesso aos relatórios do TCU. Na última
quarta-feira, em uma manobra contra a oposição,
os requerimentos que pediam acesso a documentos comprometedores
não foram aprovados.
A preocupação do Planalto se explica: se
conseguirem tirar o tema Infraero do limbo, PSDB e Democratas
buscarão evidências para demonstrar que o
esquema se apóia em duas frentes: a exemplo do
que ocorreu nos Correios, primeiro o governo teria aparelhado
o órgão público, rifando a Infraero
para o PTB, então comandado pelo ex-deputado Roberto
Jefferson (RJ) e para outros partidos aliados. O indicado
para a presidência da empresa, na ocasião,
foi Carlos Wilson, então integrante do PTB (hoje,
ele é deputado eleito pelo PT de Pernambuco). Depois,
funcionários corruptos teriam usado contratos de
publicidade e obras superfaturadas em aeroportos como
fonte de arrecadação.
- Não sabemos se os recursos foram desviados para
o financiamento de campanha. E o lugar ideal para essa
investigação teria de ser a CPI - reclama
o deputado tucano Gustavo Fruet (PR).
Distribuídos por diferentes ministros-relatores
do TCU, esses processos contam um pouco da história
de irregularidades na reforma de aeroportos brasileiros.
O principal deles é a reforma em Guarulhos. Sob
a responsabilidade do ministro Guilherme Palmeira, o relatório
do TCU de setembro de 2006 alertou para um sobrepreço
médio de 57,76% em obras do sistema de pistas.
Além disso, o tribunal determinou a revisão
de preços de 22 pontes de embarque e desembarque
de passageiros e a revisão de valores para serviços
da obra, o que representaria uma diferença de R$
30 milhões para o erário. A Infraero reconhece
que depois das determinações do TCU, o orçamento
inicial da obra em Guarulhos caiu de R$ 1,1 bilhão
para R$ 1 bilhão.
Zero Hora
20/05/2007
Ex-diretor denunciou irregularidade
em obra
Suspeitas contra a Infraero
Os problemas nas obras do aeroporto de Guarulhos provocaram
pelo menos um pedido de demissão de funcionário
da Infraero.
Um ex-diretor ouvido por Zero Hora, que pediu para não
ser identificado, diz que alertou o então presidente
Carlos Wilson para problemas nos editais, mas não
recebeu atenção.
Além de se negar a dar continuidade à licitação,
o ex-funcionário encaminhou o caso ao TCU. Sob
auditoria dos fiscais, o processo passou a ser monitorado
pelo tribunal. Até hoje a licitação
não foi lançada, apesar de a obra estar
prevista no Programa de Aceleração do Crescimento
(PAC).
- Sofri pressão, mas preferi não assinar
os editais e me afastar. Se tivesse ficado, hoje estaria
prestando esclarecimento em CPI. Há um esquema
de sete, oito grandes empreiteiras que fazem obras em
aeroportos e nunca brigam entre si. Cada um acaba levando
o seu - comenta.
Também o Ministério Público já
recebeu denúncia de ex-diretores que reclamaram
da falta de investimentos em segurança nos aeroportos.
O Sindicato Nacional dos Aeroportuários reforça
denúncias, acusando o governo de colocar dinheiro
em reformas que fizeram de aeroportos pontos conhecidos
de lojas e cafeterias - as chamadas obras de fachada -
em detrimento das melhorias nas áreas técnicas,
consideradas mais urgentes, mas bem menos vistosas. A
Infraero, porém, nega que haja esse desequilíbrio.
O presidente da empresa, José Carlos Pereira, brigadeiro-do-ar
reformado, garante que os investimentos respeitaram a
proporção de 45 % em obras de avião
(pista, equipamento e aviação).
Repasse de R$ 150 mil a evento do MST é
criticado por tucano
As suspeitas de irregularidades, porém, vão
além das grandes obras e algumas chegam a ser curiosas.
Um processo do TCU de 2005 avaliou a aplicação
de dinheiro da empresa no patrocínio de um evento
promovido por movimentos sociais, entre eles o MST. O
repasse foi de R$ 150 mil para um encontro que debatia,
entre outros temas, a reforma agrária. O que chamou
a atenção do denunciante, o deputado Luiz
Carlos Hauly (PSDB-PR), porém, não foi o
valor, mas sim o fato de a Infraero ter colocado a sua
marca em convites de um encontro chamado Conferência
Nacional Terra e Água.
- O que o cidadão ganha com isso? O trabalho deles
é cuidar dos aeroportos, do setor aéreo
e não financiar um evento do MST - provoca Hauly.
Zero Hora
20/05/2007
Um alerta contra risco de privilégio
a parentes no Estado
Suspeitas contra a Infraero
MARCIELE BRUM
O Tribunal de Contas da União (TCU) recomendou
à Infraero que evite contratar no Aeroporto Internacional
Salgado Filho empresas terceirizadas que empreguem parentes
de funcionários da estatal.
Em 2004, o TCU julgou uma representação
sobre irregularidades na contratação indireta
de familiares e amigos de empregados da Infraero em prestadora
de serviço terceirizado, sendo que um deles teria
"mordomia" por não precisar trabalhar
em finais de semana. A denúncia foi feita à
ouvidoria do tribunal.
Após investigação da Secretaria
de Controle Externo (Secex-RS), um relatório identificou
quatro casais, um pai e um filho, dois tios e três
sobrinhos trabalhando na Infraero e na empresa contratada.
Não foi detectada influência de empregados
da estatal nos contratos da firma terceirizada nem privilégios
aos parentes. Relator do processo, o ministro Walton Rodrigues
reconheceu que é difícil provar a suposta
irregularidade.
Para coibir uma eventual afronta aos princípios
constitucionais da impessoalidade e da moralidade, Rodrigues
determinou uma medida restritiva nas próximas licitações
no aeroporto. "A existência de parentes desempenhando
serviços terceirizados apenas indica a possibilidade
de ilegalidade. Nesse contexto, uma determinação
com conteúdo impeditivo mostra-se a melhor solução
para evitar que funcionários da administração,
com poder de influência, beneficiem parentes nos
contratos de terceirização de serviços",
justificou.
Situações como essa não são
comuns no Salgado Filho. Desde a sentença do TCU,
a Controladoria-geral da União (CGU) verifica anualmente
se a orientação está sendo observada.
Como o cumprimento é obrigatório, a estatal
pode ser multada, ter as contas anuais consideradas irregulares
e os responsáveis penalizados, caso ignore a orientação.
- A recomendação é muito forte.
Mas esse tipo de situação de emprego de
parentes é rara. Não me recordo de outro
caso em órgão federal no Estado. É
muito comum em prefeituras - disse o diretor técnico
da Secex-RS, Claudio Thomas.
Em 12 de abril, a diretoria de administração
da Infraero enviou cartas aos dirigentes da empresa no
Estado. Cada gestor teve de se comprometer em mandar correspondência
formal a empresas terceirizadas e cobrar a substituição
de contratos de familiares de funcionários da estatal,
que não passaram por processo seletivo. Nas próximas
licitações, a ordem é evitar parentesco.
Contratação de outdoors é
investigada no Estado
Segundo o secretário da Secex-RS, Carlos Fernando
Fagundes, atualmente, há uma investigação
de supostas irregularidades na contratação
de outdoors no Salgado Filho, a ser concluída até
o fim da próxima semana. Dependendo da conclusão,
o relatório será remetido para avaliação
do TCU ou a secretaria definirá uma medida sob
a orientação dos ministros relatores. A
suspeita surgiu em 2006 quando uma empresa entrou com
representação contra a Infraero denunciando
o suposto descumprimento da Lei de Licitações
e Contratos. Detalhes do processo não podem ser
divulgados.
- Às vezes, recebemos muitas denúncias
descabidas, sem elementos, que não podem ser levadas
adiante. É preciso muito cuidado - afirmou Fagundes.
Outro processo de 2003 sobre suposta irregularidade na
colocação de máquinas de refrigerante
sem licitação no aeroporto foi encerrado
em março. Mesmo depois do arquivamento, o TCU mantém
sigilo sobre a decisão tomada em sessão
fechada.
Zero Hora
20/05/2007
Sete servidores foram afastados
em nove meses
Suspeitas contra a Infraero
Brasília
Desde o início das recentes investigações
da Controladoria-geral da União (CGU) sobre a Infraero,
em agosto do ano passado, sete servidores da estatal -
entre eles, dois diretores e dois ex-diretores - foram
afastados.
A investigação que resultou nesses afastamentos
está em andamento desde 18 de agosto, quando o
ministro da Defesa, Waldir Pires, solicitou à CGU
uma auditoria sobre contratação de um software
para a gestão de publicidade na empresa. Em nota,
o ministro da Defesa explica que o afastamento não
significa julgamento definitivo, mas um procedimento para
evitar possível interferência nas investigações.
Também está sob inquérito a renovação
do contrato de concessão à empresa Shell
Brasil S/A para exploração comercial de
posto de abastecimento de venda de combustível
na área do aeroporto de Brasília.
No loteamento político da Infraero, pode estar
a explicação para essa escalada de problemas.
Para agradar aos aliados, no primeiro mandato do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva, a empresa foi dividida
principalmente entre PTB, PT, PMDB e PSB. Diretor do Sindicato
Nacional dos Aeroportuários, Leandro Castro Pinheiro,
afirma que, enquanto faltam técnicos, o inchaço
dos cargos de confiança acaba prejudicando até
mesmo a fiscalização das ações.
Segundo o sindicato, no governo Fernando Henrique Cardoso
eram cerca de 80 cargos de confiança na Infraero.
Com Lula, esse número passou para 247.
Nos bastidores, o atual presidente e o ex-deputado Carlos
Wilson - brigam pelas nomeações. No auge
da crise do apagão, o mal-estar teria chegado a
tal ponto que o brigadeiro teria reclamado da falta de
liberdade de mexer na equipe.