::::: RIO DE JANEIRO - 16 DE AGOSTO DE 2007 :::::

 

Folha de São Paulo
16/08/2007
CPI: INFRAERO GASTA R$ 19,4 MI EM PROGRAMA USADO SÓ POR 2 ANOS


A Infraero gastou R$ 19,4 milhões, em 2005, na compra de um sistema de computador usado na venda de espaço de publicidade nos terminais, usado só por dois anos. À CPI do Apagão Aéreo do Senado os dois sócios da empresa FS3 confirmaram ter recebido, da estatal, o valor em 24 meses. Informaram que, com o software, a Infraero aumentou suas vendas de publicidade em R$ 7 milhões em 11 meses, valor que não cobre gastos com o programa. Hoje, a CPI do Senado deve ouvir o depoimento de Denise Abreu, diretora da Anac.

 

 

Jornal do Brasil
16/08/2007
Duas CPIs no caminho de Denise Abreu

BRASÍLIA. Na berlinda desde o início da crise aérea, a diretora da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) Denise Abreu terá de enfrentar hoje o depoimento nas CPIs da Câmara e Senado. O requerimento de convocação para que a diretora da Anac preste esclarecimentos à CPI do Apagão Aéreo na Câmara foi aprovado ontem.

A gota d'água para a convocação de Denise à CPI da Câmara foi mais uma suspeita de uso inadequado do cargo de comando na agência reguladora do setor aéreo. Segundo reportagem publicada no último fim de semana, Denise orientou as companhias aéreas a reagirem às medidas do Conselho de Aviação Civil (Conac) para desafogar o Aeroporto de Congonhas. A diretora nega que tenha orientado ou estimulado a reação das empresas.

- Não se pode ficar sob suspeição dessa maneira. O melhor é que ela se explique logo - disse o presidente interino da CPI, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

A comissão marcou a sessão para às 15h, depois do depoimento da diretora à CPI do Apagão Aéreo no Senado - onde foi convocada para depor na última semana. A convocação de Denise no Senado foi motivada pela acusação do brigadeiro José Carlos Pereira, ex-presidente da Infraero, de que a diretora tentou favorecer um amigo, Carlos Ernesto Campos, da Tead Terminais Aduaneiros, em uma tentativa para transferir o serviço de transporte de cargas dos Aeroportos de Congonhas e Viracopos, em Campinas, para o de Ribeirão Preto. Agora, com a denúncia de que Denise teria estimulado a reação das empresas, os senadores cobrarão novas explicações.

O autor do requerimento de convocação à CPI da Câmara, deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), disse que a diretora deve explicar a denúncia, assim como comentar o agravamento da crise aérea do país. Os deputados estão dispostos a pedir a quebra dos sigilos bancário, fiscal e telefônico da diretora para apurar a denúncia.

Pereira será ouvido hoje pela CPI no Senado, assim como Abreu, para comentar as denúncias. Os senadores também vão colher o depoimento do atual presidente da Infraero, Sérgio Gaudenzi. A CPI na Câmara também decidiu na tarde de ontem apresentar pedido de prorrogação de seus trabalhos por mais 30 dias para concluir as investigações sobre o acidente com o Airbus-A320 da TAM.

O relator da CPI, deputado Marco Maia (PT-RS), avalia que o período de prorrogação será suficiente para aprofundar as investigações sobre a crise aérea do país - agravada após o acidente em Congonhas. O pedido de prorrogação terá que ser aprovado pelo plenário da Câmara.

Ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que a crise aérea já foi, em parte, resolvida.

- Acho que a crise está resolvida em parte - disse Lula antes do almoço oferecido ao presidente de Benin, Boni Yaji, no Itamaraty.

O presidente disse ainda que aguarda sugestões do ministro da Defesa, Nelson Jobim, para executar mudanças na Anac.

- Na hora que tiver que mudar a Anac, o ministro Jobim me procura e propõe as mudanças. Nós temos problemas legais que têm de ser resolvidos. E nós temos de ver. Tudo isso é por conta do ministro Jobim.

Lula afirmou também que a parte mais complexa é a que se refere à construção da terceira pista no aeroporto de Guarulhos.

- O ministro Jobim está fazendo o que deve ser feito. Ou seja, reestruturar tudo que tiver que ser reestruturado. Obviamente que a coisa mais demorada é fazer uma pista no aeroporto, que você não faz de um dia para o outro. Demora tempo, mas também estamos estudando isso.

O presidente reiterou que o ministro da Defesa tem carta branca para agir e fazer as mudanças que achar necessárias.

 

 

Revista Consultor Jurídico
15 de agosto de 2007
Excesso de cadeiras
Metástase de cargos é a causa do caos aéreo
por Claudio Candiota Filho

O presidente Lula comparou a crise aérea com metástase, quando o paciente que sofre de câncer em um órgão descobre que há ramificações da doença pelo corpo. O presidente está perto do diagnóstico correto, mas, não sabe o tipo de câncer. O nome é “loteamento de cargos”.

Começou com o Ministério da Defesa, órgão sem função, de imediato, atingido pelo “loteamento”. Nunca foi ocupado por técnico que entendesse alguma coisa de defesa e muito menos de aviação. Dali o câncer foi se alastrando. Houve a quebra da hierarquia, espinha dorsal de qualquer sistema de aviação civil. Criou-se o Comando da Aeronáutica, subordinado ao Ministério da Defesa. Subordinação inócua e inútil. Essa disfunção deu início ao esquartejamento do Sistema de Aviação Civil, que teve seu primeiro órgão retirado: a Infraero, rapidamente atingida pelo câncer do loteamento. Começou a metástase. O resultado na Infraero já se conhece, pois os aeroportos estão se deteriorando, assim como as estradas do país e outros serviços públicos.

A seguir, retirou-se do pobre Sistema de Aviação Civil, que já estava na UTI, mais um órgão: o DAC. Nesse momento, ocorreu a falência múltipla de órgãos. Em seu lugar, em março de 2006, inoculou-se a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), através da Lei 11.182. E deu-se a metástase a que se refere o Presidente da República. Junto houve a rejeição, pelo sistema, de um corpo estranho. De lá para cá tudo o que aconteceu não foi coincidência. Em poucos meses o loteamento de cargos espalhou-se pela Anac, atingindo todo o Brasil. O paciente entrou em colapso e não mais se recuperou. Até uma desnecessária 8a. Gerência Regional da Anac foi criada na Bahia, por razões políticas, apenas porque um dos diretores é daquele Estado.

O sistema de aviação civil do Brasil é um paciente terminal. Só sobreviverá se o câncer for extirpado e o paciente imunizado, como sempre esteve ao longo de seis décadas. O Ministério da Aeronáutica, a Infraero e o Departamento de Aviação Civil (DAC) eram organizações militares, imunes a indicações políticas, ao loteamento de cargos e ao conhecido troca-troca. A Lei 11.182 não serve para o Brasil. Precisa ser revogada, com urgência, através de outra lei federal que recoloque o antigo DAC no lugar, subordinado ao Comando da Aeronáutica.

Se isso não for feito, o paciente continuará na UTI, morrendo e matando inocentes. A aviação rejeita conxavos políticos, falta de profissionalismo, de disciplina e de hierarquia. Assim como é inadmissível substituir pilotos de uma aeronave por militantes políticos, é inaceitável fazer o mesmo com os gestores dos órgãos técnicos do setor aéreo. O presidente Lula precisa decidir entre preservar cargos e ministérios inúteis ou vidas. No país campeão mundial do loteamento de cargos, só uma organização militar resiste à pressão por cargos.

Não é possível aplicar no Brasil receitas do primeiro mundo. Em outros países, quando muda a administração federal, troca-se 100 cargos. No Brasil, a cada quatro anos, loteia-se cinquenta mil. Em outros países, se o presidente indica nomes de pessoas que não tem habilitação técnica para os cargos, o Senado rejeita. No Brasil, o presidente indica qualquer nome e o Senado aprova, porque, previamente, foi feito algum acordo político.

Pessoas que não entendem nada de aviação (senadores) sabatinam outras, que sabem menos ainda. Não há aviação nem país que resista. A lei 11.182 estabelece que a Anac não se subordina a ninguém. Isso representou a quebra da hierarquia do sistema. É fórmula que não se aplica ao país do loteamento de cargos, onde não há critério técnico para o preenchimento dos cargos.

O parágrafo único, do artigo 6o da Lei 11.182 estabelece “Quando, no exercício de suas atribuições, a Anac tomar conhecimento de fato que configure ou possa configurar infração contra a ordem econômica, ou que comprometa a defesa e a promoção da concorrência, deverá comunicá-lo aos órgãos e entidades referidos no caput [órgãos e entidades do Governo Federal] deste artigo, para que adotem as providências cabíveis”. Alguém tem dúvida de que a interrupção da “concessão” da Varig (não dá Varig) representaria infração contra a ordem econômica? Alguém tem dúvida de que a interrupção de 33% da oferta de vôos domésticos e 80% de internacionais, comprometeria a defesa e a promoção da concorrência?

O Governo Federal descumpriu, no caso da concessão da Varig, o artigo 175 da Constituição e a Lei que o regula 8987/95, que estabelece intervenção, encampação e nova licitação de serviços públicos essenciais e contínuos. Se são “contínuos” não podem ser “descontinuados”. E foram. A concessão da Varig, literalmente, parou. Isso significou a destruição de um terço da malha aérea do país (patrimônio público), infração contra a ordem econômica (artigo 170, da Constituição) e o fim da concorrência. Milhões de passageiros foram jogados sobre apenas duas empresas, uma muito nova, e sem experiência (Gol), e outra que havia perdido seu principal líder (Tam). Nenhuma das duas tinha condições de absorver essa enorme quantidade de passageiros.

O que fez a agência reguladora nesse caso? Nada. Com isso, descumpriu o parágrafo único do artigo 6o da lei que a criou. E descumpriu, porque seus diretores não eram técnicos e estavam atrelados ao Governo. E assim estavam, porque os senadores que sabatinaram os diretores, descumpriram o artigo 12, da mesma lei 11.182, que, claramente estabelece: “Os diretores serão brasileiros, de reputação ilibada, formação universitária e elevado conceito no campo de especialidade dos cargos para os quais serão nomeados pelo Presidente da República, após serem aprovados pelo Senado Federal (grifou-se)...”., Ora, é público e notório que os diretores da Anac não se enquadram nesse perfil. O caos aéreo, portanto, decorre do descumprimento da lei, por parte de todos aqueles que deveriam estar defendendo seu cumprimento.

Importante lembrar que esse mal atinge toda a administração pública, levando à falência dos serviços de educação, segurança, saúde, às filas nos hospitais e às mortes nas rodovias. Os usuários do transporte aéreo se acostumaram com os bons serviços prestados por profissionais. Por isso o espanto, quando tudo veio abaixo, em poucos meses de gestão política. Os usuários dos demais serviços públicos assistem, anestesiados, à falência do Estado. Se há esperança não se sabe. O que se sabe é que, no setor aéreo, a solução não começa sem revogar a lei que criou a Anac, que é uma anomalia, e sem extingüir o Ministério da Defesa, que é outra, pois não tem função nenhuma. Câncer se mata extirpando. Se ficar como está, os serviços aéreos públicos continuarão tão ruins quanto todos os demais. A morte das rodovias atingiu as aerovias.

 

 

Coluna - Claudio Humberto
14/08/2007
Infeliz coincidência

Assim se passaram 60 anos: em 1947, o presidente argentino Juan Domingo Perón autorizava a operação da Varig em Buenos Aires. Em 2007, a Argentina proíbe a operação, por descumprir as obrigações trabalhistas.

 

 

O Globo Online
14/08/2007 às 19h16m Globo Online
Bode expiatório para o acidente em Congonhas
Por Luiz Pinguelli Rosa

O acidente do Airbus da TAM entristeceu o país em um momento que seria de alegria com o bem-sucedido Pan-Americano no Rio e o crescimento da economia. A pura análise lógica de tudo que ocorreu no setor aéreo coloca várias questões. Por que o governo indicou e o Senado aprovou, inclusive a oposição, a diretoria da ANAC sem exigir conhecimento técnico sobre aviação nem experiência no setor? Segundo, como foi possível ceder às grandes empresas aéreas interessadas em fazer de Congonhas o maior centro aeroviário do país, sem ter condições? Na década de 80, ele foi limitado aos vôos diretos ao Centro, como os da ponte aérea Rio-São Paulo para o Santos Dumont. Isso foi revogado muito antes do atual governo. Agora, a Infraero acaba de investir dezenas de milhões de reais em obras para ampliar as instalações do prédio de Congonhas, que ficarão, em parte, ociosas, pois felizmente o governo decidiu voltar a limitar os aviões que operarão nele.

Sabe-se que mais de dez edifícios interferem com o pouso e decolagem em Congonhas, segundo relatório da Aeronáutica. O absurdo maior: acaba de ser construído um prédio junto ao aeroporto reduzindo em 100m, para efeitos práticos, sua pista de cerca de 1900m, considerada curta, no limite, sem área de escape para o avião em caso de um acidente. E havia um posto de gasolina na rua ao fim da pista, ao lado do prédio da TAM atingido pelo avião. Portanto, os erros vão desde o Executivo ao Legislativo, do governo à oposição, do nível federal ao municipal.

Passando ao que se lê sobre fatores que contribuíram para o acidente, sabe-se que o avião voava com o reverso de uma das duas turbinas enguiçado. A reversão auxilia na frenagem e é uma redundância para a segurança do pouso. A redundância é um dos princípios básicos da indústria aeronáutica. Como a empresa aérea faz o avião voar assim? Noticiou-se que o fabricante, a Airbus, permite o vôo com o reverso travado por alguns dias. Com base em que critério definiu tal prazo? Por que a TAM não seguia a recomendação da ANAC para não operar com reverso travado? Por que a ANAC não a obrigava a segui-la? Afinal, aconteceram outros acidentes de frenagem com Airbus fora do Brasil, embora sem tantas vítimas.

Apesar da atitude corretamente discreta da Aeronáutica, noticiou-se que a posição da alavanca que comanda a aceleração estaria errada e, por isso, o freio aerodinâmico nas asas também não funcionou. Mas há a possibilidade de mau funcionamento do computador que supervisiona o pouso e restringe a ação do piloto, limitando suas opções em situações de emergência. A Airbus se precipitou e negou defensivamente qualquer falha do avião. Esta afirmação não é aceitável.

Por outro lado, a pista estava molhada. Somente agora se fazem ranhuras para escoar água na pista principal, que esteve antes fechada para reparos por ser julgada insegura e se reconhece o risco de pousos em Congonhas com a pista molhada. O comandante Elnio Malheiros, presidente da Associação dos Pilotos da Varig, hoje controlada pela Gol, declarou que quando a pista de Congonhas estava molhada, aquela empresa tinha por norma a redução do peso máximo na ponte aérea, limitando o número de passageiros. Pensemos na situação do comandante Kleyber Lima ao pousar o Airbus, pesado, com o reverso de uma turbina enguiçado, em uma pista molhada insegura e curta, sem área de escape. É fácil colocar o piloto como bode expiatório.

No clima caótico criado, alguns economistas propuseram privatizar a Infraero, mas caíram em contradição ao cobrarem do governo autoridade sobre a ANAC, uma agência em princípio independente. Foram as empresas aéreas, com lucros altos e crescentes, que pressionaram para fazer de Congonhas um centro nacional de conexões. Houve falta de intervenção da ANAC para proibir isso. E a Infraero atuava como se fosse privada, promovendo shopping centres nos aeroportos.

Aliás, a falta de intervenção do Estado começou no caso da Varig, que era um paradigma do ponto de vista técnico e tinha-se desenvolvido dentro da filosofia de concessionária de uma malha aeroviária para cobrir o país. Quando ela quebrou por má gestão da Fundação Rubem Berta, o número de aviões no país se reduziu muito. Hoje, as horas voadas por cada um deles diariamente aumentaram ao máximo, para atender o mercado em expansão. A operação dos aviões foi otimizada de modo a reduzir o tempo no solo ao mínimo. Isto exige uma manutenção com prazos curtos para ser executada. Ademais, os vôos internacionais de bandeira brasileira reduziram-se, com prejuízos para os passageiros e para o país, pois o vácuo foi ocupado por aviões de outros países.

Quando houve a crise da Varig, estive com o ministro Waldir Pires, um homem íntegro, para falar do resultado de um seminário na COPPE mostrando o problema que o colapso daquela empresa traria. Ele concordou em muitos pontos, mas infelizmente o governo tinha tirado a questão da alçada do ministro e a deixou falir.

Foi criada agora, através da mídia, uma expectativa no ministro Nelson Jobim, como se tudo que ocorreu fosse culpa do seu antecessor. De seu encontro com o governador José Serra saiu a idéia de investir para fazer novo aeroporto em São Paulo ou ampliar os de Cumbica e Viracopos, para onde foram transferidos vôos de Congonhas. Já se tinha cogitado distribuir parte das conexões, concentradas em São Paulo, para o Galeão, que dispõe de grande capacidade ociosa, pistas extensas e área de escape. A pressão das empresas é para manter o máximo de conexões em São Paulo. Embora lucrativo para elas, isso é dispendioso para os cofres públicos e é inseguro, pois sobrecarrega o tráfego aéreo em poucas rotas, como revelou a crise dos controladores de vôo que emergiu após o acidente trágico anterior, com o avião da Gol, hoje quase esquecido.