:::::RIO DE JANEIRO - 14 DE MAIO DE 2006 :::::

IstoÈ Dinheiro
14/05/06
Varig vai à leilão
As rotas e aeronaves da empresa serão vendidas sem o passivo de R$ 7,5 bilhões. Há vários interessados...
Por ADRIANA NICÁCIO E ELAINE COTTA

Começa em 30 dias um novo capítulo na história de 79 anos da Varig. Nessa data será publicado no site da empresa na internet o seu edital de Alienação Judicial e as regras do leilão no qual ela será vendida. O leilão terá lugar dois meses depois do edital. Duas opções de compra serão oferecidas ao mesmo tempo.

Na primeira, que despertou o interesse de fundos de investimento, as operações de vôo da Varig serão oferecidas sem o passivo de R$ 7,5 bilhões. Nesse modelo, o lance mínimo será de US$ 860 milhões e quem vencer terá comprado as rotas nacionais e internacionais e o leasing de 55 aeronaves.

Na segunda opção, apenas a Varig nacional será leiloada, também sem passivo, com lance mínimo de US$ 700 milhões. Para esse negócio, apenas as empresas nacionais – que já possuem concessão do governo – podem concorrer. Nos dois casos, somente a Varig que voa, chamada de Operacional, será leiloada, e sua parte internacional não será entregue separadamente.

Se não for arrematada como parte do pacote total, vai se integrar às operações de terra e ao passivo. Em qualquer modelo, os atuais administradores continuam com a Varig que não sai do chão e sua dívida, que será chamada de Varig Relacionamento. Ela prestará serviços à Varig leiloada: venda de bilhetes, controle do programa Smiles de milhagem e serviços aeroviários como balcão de atendimentos e operações na pista. “O modelo que vai despertar interesse é o que tem as rotas internacionais”, opina o economista Paulo Rabello de Castro, que assessora os funcionários da Varig na definição das regras do leilão. “Nas rotas nacionais a Varig perdeu espaço e tem hoje apenas 15% do mercado.”

Recém-divulgadas, essas normas ainda não foram digeridas pelos potenciais compradores da companhia. No final da semana passada, eles hesitavam em se pronunciar sobre a disputa. “Posso dizer apenas que temos interesse, mas as regras não estão claras”, disse Carlos Ebner, presidente da OceanAir.

O executivo não acredita em leilão com muitos participantes, uma vez que as regras da aviação brasileira restringem a participação de estrangeiros a 20% do controle acionário. Mesmo assim, grupos internacionais vêem a marca Varig como uma boa oportunidade de negócios. Uma fonte ligada ao empresário russo Boris Berezovski revelou à DINHEIRO que nesta semana chega ao País uma equipe de profissionais comandada pelo próprio investidor para tratar especificamente do leilão da Varig.

O russo sabe que terá de associar-se a um grupo nacional, de preferência do ramo aéreo. Já falou com TAM e Gol mas nada ficou acertado. “Ele está no jogo, sabe que há 60 dias de prazo, mas tem certeza de que tudo se definirá antes”, diz um interlocutor do empresário. Isabel Palma, porta-voz da companhia portuguesa TAP, é clara. “Mantemos nosso interesse na Varig e estamos acompanhando passo a passo a evolução do processo”, diz ela.

Um dos entraves que os especialistas enxergam para o leilão é a insegurança jurídica. Os compradores da Varig podem “herdar” parte dos enormes passivos da companhia. Esse risco é aventado pelo representante de um fundo de investimento americano que não quis se identificar. O professor Rabello reconhece o problema. “Quando se compra uma velhinha de 80 anos há sempre o risco de se assumir um passivo”, diz. Na semana passada, a Procuradoria Geral da Fazenda confirmou oficialmente que nos dois modelos de compra oferecidos no leilão há risco de “sucessão de dívida”. Será que a novela continua?


IstoÈ Dinheiro
14/05/06
O revolucionário do ar está chegando
O magnata inglês Richard Branson trará a sua extravagante Virgin Atlantic ao Brasil ainda este ano. O que as companhias aéreas brasileiras devem esperar?
Por FLÁVIA TAVARES

O cenário era perfeito: as Ilhas Virgens Britânicas (Caribe), mais especificamente, a ilha de St. Thomas. Foi lá que o bilionário Richard Branson, dono do império de 200 empresas chamado Virgin Group, conheceu, em 1997, o então diretor de marketing da falecida Transbrasil, Gianfranco Beting.

O brasileiro, fã de Branson, estava lendo a biografia do empresário inglês e se aproximou para pedir um autógrafo. Aproveitou para dizer “Ei, senhor Branson, que tal fazer negócios no Brasil?”. Para surpresa de Beting, o magnata respondeu que não era má idéia.

Depois de trocar alguns fax, porém, o todo-poderoso da Virgin desistiu de trazer sua companhia aérea, a Virgin Atlantic, para cá – escapando de uma boa, pois a proposta da Transbrasil era de realizar um “code-share” de assentos. Disse que o plano de expansão da sua empresa não passava pelo Brasil naquele momento.

Nove anos depois, Sir Branson parece ter revisto seus conceitos. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) acaba de confirmar que a Virgin Atlantic realizará sete vôos semanais entre Londres e Rio de Janeiro a partir de outubro. Será uma contrapartida aos vôos que a TAM realizará para a Inglaterra a partir do mesmo mês. O excêntrico ricaço inglês, enfim, vai fincar sua bandeira por aqui.

Fontes da Anac dizem que os vôos podem acontecer antes mesmo de outubro, já que o governo britânico é sempre muito aberto para receber novas companhias aéreas e pode abrir espaço para a TAM antes do programado. Assim, o governo brasileiro deve, seguindo o acordo bilateral entre os dois países, antecipar a abertura para a Virgin também. Da sede da empresa em Londres, os executivos desconversam, mas não negam. “A Virgin Atlantic ainda está avaliando se deve voar entre Londres e Rio de Janeiro e para a América do Sul”, disse à DINHEIRO Paul Charles, diretor de comunicação da Virgin Atlantic.

Mas o que significa exatamente a chegada da Virgin aos aeroportos brasileiros? Para as companhias aéreas locais, pode representar uma concorrência difícil de engolir, especialmente em termos de serviços. “Acredito que a entrada da Virgin no mercado brasileiro será um passo muito positivo até mesmo para TAM e Varig, que crescerão ao se desdobrar para acompanhar as invencionices da Virgin”, afirma analista Bob Booth, presidente da americana Avgroup e ex-consultor de Branson.

A Virgin Atlantic é famosa por oferecer aos passageiros mimos como massagistas, manicures, camas de casal e serviço de bar permanente na classe executiva e na primeira classe.

“A empresa é tão fantástica que o índice de fidelidade entre os passageiros de primeira classe é de 99%”, conta Beting, fundador do website Jetsite.com.br. Todas essas inovações tornaram a Virgin Atlantic não a maior, mas uma das mais criativas empresas aéreas mundiais – e ajudaram-na a aumentar o número de passageiros transportados de 124,7 mil em 1984 para 4,4 milhões em 2004. O lucro cresceu de US$ 15,6 milhões em 1989 para US$ 127 milhões em 2004. Resultados tão expressivos levaram a Singapore Airlines (a mais luxuosa companhia aérea do mundo) a comprar, em 1999, 49% da Virgin, elevando seu valor de mercado para US$ 2,3 bilhões.

A vinda para o Brasil não é exatamente uma invasão. Será a primeira rota de Branson para a América do Sul. Mas quem conhece a trajetória desse disléxico de 55 anos sabe que ele pode chegar de mansinho para, aos poucos, tornar-se uma rocha no sapato dos concorrentes que atuam nas mesmas rotas que ele.

Foi assim que a Virgin Atlantic começou. Em 1984, com apenas um 747 de segunda mão da Aerolineas Argentinas, Branson iniciou a companhia aérea que hoje tem 33 aviões (e 26 encomendados, incluindo seis A380, o mamute da Airbus) e voa para 26 destinos. O lema que ele repete como um mantra ajuda a entender seu estilo de fazer negócios: “Sempre enfrente os líderes de mercado”.

A criatividade de Branson se estende as outras empresas do grupo. Quando não está dando expediente em sua ilha particular, a Necker Island, no Caribe, ele é o garoto-propaganda de quase todas as suas 200 companhias.

Para lançar a marca de vestidos de noiva Virgin Bride, por exemplo, vestiu-se de branco e raspou seu lendário cavanhaque. No anúncio da empresa de celular Virgin Mobile, desceu a fachada da loja de CDs Virgin Megastore de Londres (primeiro negócio oficial de Branson) pendurado em uma corda. “A marca Virgin é incrível. Mas o que sempre conta mais é o carisma e o charme dele”, diz Booth. Bem, fica fácil ser carismático e aventureiro quando se tem uma fortuna pessoal de US$ 6 bilhões.

Branson atravessa oceanos de balão, quebra recordes de velocidade, faz aparições relâmpago em filmes de James Bond. Mas também comete erros. E admite que o pior deles foi o lançamento Davi vs. Golias do refrigerante Virgin Cola – o produto sumiu de muitas prateleiras, mas – Branson não cansa de repetir – é líder de mercado em Bangladesh.

O Virgin Group é um conglomerado fechado. Os analistas falam em um subestimado faturamento de US$ 8 bilhões por ano. Além da Virgin Atlantic, há a Virgin Blue (na Austrália), a Virgin America (EUA), a Virgin Nigeria e a Virgin Express, de baixo custo e baixa tarifa, na Europa. E mais a Virgin Rail, que opera duas ferrovias, e anunciou um programa de US$ 3,2 bilhões para renovar sua frota de trens.

A sua próxima aventura será levar passageiros para o espaço, com a Virgin Galactic. Em uma entrevista ao jornal britânico “The Guardian”, Branson anunciou que criará a Virgin Entertainment, para atuar em TV e cinema. Aproveitou para revelar quem é o próximo Golias na sua lista de adversários: o rei da mídia e dono da Sky, Rupert Murdoch. Te cuida, Murdoch.


O Estado de São Paulo
14/05/06
Aos 25 anos, milhagem dá sinais de exaustão
Criado em 1981, o programa aéreo de fidelidade começa a apresentar problemas estruturais
David Leonhardt

Tom Plaskett voava de Boston a Dallas, num certo dia de 1980, com um problema para resolver. Aos 36 anos, ele acabava de herdar o principal cargo de marketing da American Airlines de Robert Crandall, que se tornara o presidente da empresa. Crandall, como centenas de outros executivos, procurava um modo de manter os consumidores fiéis à sua companhia.

O problema era que o governo americano havia desregulamentado o setor, liberando as companhias aéreas para competirem no preço. Se a única maneira de garantir a fidelidade era comprá-la com tarifas mais baratas, Crandall sabia que a American estava encrencada.

Para Plaskett e sua equipe, o caso era fazer os viajantes comprarem passagens da American mesmo que esta não oferecesse o preço menor. Enquanto ele pensava sobre o que mantinha as pessoas voando pela mesma companhia, sua mente viajava para a cozinha da casa de sua infância em Raytown, Montana, onde ele se sentava com a mãe e lambia Selos Verdes S&H. Os selos tinham vindo de um supermercado local como brinde para quem fazia as compras ali, e quando os Plasketts colocaram um número suficiente deles num caderno, eles o levaram a um centro de troca da S&H para reclamar um prêmio.

Uma vez foi uma torradeira elétrica. Outra, um aspirador de pó. Não eram artigos muito interessantes, mas eram o bastante para amarrar a família Plaskett àquele supermercado.

"Era a idéia de obter algo de graça, realmente", disse ele. "Aí eu comecei a pensar, por que não poderíamos trabalhar assim com empresas aéreas? " No ano seguinte, Crandall, Plaskett e seus colegas desenvolveram um plano secreto espelhado nos selos verdes, uma surpresa para pegar os rivais com a guarda baixa. Em 1.º de maio de 1981, eles anunciaram um programa chamado AAdvantage. Nascia a milhagem para viajantes freqüentes.

A milhagem se tornou uma das idéias comerciais mais bem-sucedidas da história do capitalismo moderno. Ela tem sido um expediente diabolicamente brilhante para tirar dinheiro das pessoas, que são levadas a sentir que estão recebendo um presente.

Claro, você acabou de gastar U$ 800 consertando seu carro, mas pagou com um cartão de crédito que rende milhas, colocando-o muito mais perto de umas férias gratuitas. Se acreditar na idéia de que uma milha vale cerca de US$ 0,01, os 14 trilhões de milhas não pagas que os viajantes possuem valem mais que todo o dinheiro americano em circulação, como observou a revista The Economist. Isso não inclui os pontos juntados nos muitos programas de imitação. Em meu restaurante local Tex-Mex, sou membro de um clube de comedores freqüentes de burritos.

"Nós imaginamos que, se desse certo", disse Crandall, "substituiríamos os Selos Verdes S&H." Eles certamente fizeram isso, e mais. Mas a comparação também tem um lado escuro. Os selos verdes, afinal, não existem mais. Foram vítimas de sua própria espiral inflacionária nos anos 60, quando as lojas começaram a duplicar e triplicar os selos, o que lhes custou um dinheirão.

Logo, alguns gerentes de lojas perceberam que poderiam oferecer descontos atraentes, em vez deles, disse Joseph C. Nunes, professor de Marketing da Universidade do Sul da Califórnia. O único lugar onde ainda se podem encontrar os selos é na arte de Andy Warhol.

Houve outro exemplo da noção de que o meio empresarial americano tende a fincar cada boa idéia no solo como uma estaca de tomateiro, como disse o escritor James Granty sobre Wall Street. Agora a milhagem para viajantes freqüentes segue um caminho parecido.

Ela deslanchou porque fez um trabalho maravilhoso de exploração da natureza humana. De sua própria experiência com os selos verdes, Plaskett sabia que colecionar adesivos ou pontos podia parecer uma realização em si. Assim, a American Airlines deliberadamente entregou centenas deles de uma vez, porque "10 mil milhas" soava muito melhor que "seis etapas de vôo." A companhia transformou as milhas viajadas em unidade de moeda em vez de dólares gastos, para reduzir as chances de as empresas reclamarem os prêmios de seus empregados. Afinal, eram os viajantes de negócios que decidiam por qual companhia iam voar, ainda que a conta fosse paga por seus empregadores. A milhagem para viajantes freqüentes se tornou uma espécie de comissão.

O melhor de tudo, os prêmios principais - férias -, eram exatamente o tipo de coisa para fazer sonhar acordado. Entretanto, seu custo para a American era quase nenhum porque a companhia teve o cuidado de usar assentos que, não fosse aquilo, ficariam desocupados.

Não espanta, então, que a United Airlines tenha copiado a American pouco tempo depois, e todas as outras grandes empresas as acompanharam em seguida. Como era sua intenção, os programas retardaram o avanço das empresas aéreas econômicas. Um estudo feito nos anos 90 revelou que os viajantes a negócios que faziam uma viagem de mil milhas pagavam U$ 170 extras, em média, para voar numa companhia com seu programa de usuário freqüente.

Mas eu aposto que não se encontraria a mesma vantagem hoje. As companhias aéreas econômicas são um pouco maiores do que eram, e têm seus próprios programas de fidelidade. Os gerentes de viagens de empresas, por sua vez, podem usar software para forçar os viajantes de negócio a escolherem a passagem mais barata.

E a milhagem não tem o mesmo ímpeto que já teve, porque também ela foi engolfada numa espiral inflacionária. Os viajantes que antes viam transferências para a primeira classe como um direito inalienável, hoje têm dificuldade em consegui-las porque muitas milhas estão respingando profusamente e os aviões andam cheios demais. Reclamar passagens gratuitas em rotas populares também pode parecer quase impossível.

Os programas de viajantes freqüentes não estão em via de desaparecer, porque nenhuma empresa aérea pode se dar o luxo de abandonar unilateralmente o seu. Mas comparada com o objetivo original de Crandall - impedir que os assentos de aviões se tornassem uma commodity - a milhagem está parecendo muito velha e cansada aos 25 anos.

Basta observar o que a United está fazendo para comemorar o 25º aniversário de seu programa. Está deixando seus melhores clientes usarem suas milhas para comprarem tacos de golfe Callaway, óculos escuros Coach e câmeras digitais Canon. Isso transforma a milhagem em mais um desconto em vez da garantia de fidelidade que Plaskett vislumbrava.