::::: RIO DE JANEIRO - 14 DE JANEIRO DE 2008 :::::

 

Folha de São Paulo
14/01/2008
"Companhias serão punidas por atraso e cancelamento de vôos"
Governo deve discutir nesta semana propostas para aliviar a superlotação dos aeroportos do Estado de São Paulo
ELIANE CANTANHÊDE COLUNISTA DA FOLHA

A nova presidente da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), Solange Paiva Vieira, deu nota "seis, talvez sete" para o setor no Brasil, que já foi considerado equivalente ao do Primeiro Mundo e passou por sua pior crise em 2006. Segundo ela, o governo vai punir empresas por atrasos e cancelamentos de vôos.

As punições, afirmou, ocorrerão com o que "dói no bolso das empresas": o cancelamento de autorizações de vôo e da venda de bilhetes. "E vêm boas novidades para o consumidor por aí", disse Solange.

Mestre em economia pela Fundação Getúlio Vargas do Rio, Solange, 38, não se preocupa com a concentração da Gol e da TAM no mercado interno - o que chamou de "duopólio competitivo"-, mas defendeu o aumento de 20% para 49% no limite de capital estrangeiro nas companhias aéreas, para aumentar a competição nos vôos internacionais.

Cheia de elogios à Gol, Solange foi dura com a Ocean Air, criticando a compra de aviões Fokker-100, que já não são mais fabricados, não têm manutenção no Brasil e estão sendo aos poucos abandonados pela TAM. Perguntada se a Ocean Air tem fôlego para ser a terceira grande brasileira, respondeu secamente que não.

Em entrevista à Folha, a primeira desde a posse, em 20 de dezembro, ela disse que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai analisar nesta semana uma solução para São Paulo e defendeu o terceiro aeroporto: "Acho que São Paulo vai precisar de um outro aeroporto nos próximos dez anos, e isso significa começar hoje", disse.

FOLHA - Seu antecessor, Milton Zuanazzi, demorou muito para largar o osso?
SOLANGE PAIVA VIEIRA - É. E essa lentidão fez com que a Anac, que nem tinha se formado direito, se desgastasse muito. Agora, a agência está correndo contra o relógio. Eu não sabia quando o presidente da Anac iria sair, e ele saiu justamente dois dias após meu casamento.

FOLHA - A diretoria anterior era acusada de politização e apadrinhamento. Qual o perfil da nova?
SOLANGE - A diretoria não é apenas consultiva, é também muito executiva, com perfis específicos em segurança de vôo, infra-estrutura aeroportuária e regulação no setores doméstico e internacional.

FOLHA - E a sra.? A sra. também não é do ramo.
SOLANGE - Entro nessa estrutura conciliando o trabalho de todo mundo, e brinco que já me considero do ramo. Fui secretária de Previdência Complementar apenas sete meses, mas até hoje me marcam como especialista do setor. Fiquei quatro meses na Secretaria de Aviação Civil. Ajo tecnicamente, faço escolhas profissionais.

FOLHA - Por que a operação deu certo no pico do final do ano, se continuam os mesmos aeroportos, as mesmas pistas, as mesmas companhias e os mesmos controladores? O que, afinal, gerava o caos de antes?
SOLANGE - A gente correu um grande risco, porque refez toda a malha aérea às vésperas do Natal, do dia 20 para o dia 21. O que a gente fez, com a Infraero e o Decea, foi checar horário por horário e ver se era viável.

FOLHA - Como dizer a quem enfrentou o caos que foi só a Anac fazer um ajuste na malha para tudo voltar a funcionar?
SOLANGE - O ajuste da malha é importante, e não se pode esquecer que houve dois acidentes aéreos, greve dos controladores, problemas meteorológicos. Se o aeroporto fecha por algumas horas, por uma chuva tremenda, por exemplo, as companhias vão carregar o atraso por dois ou três dias, mesmo com o céu azul.

FOLHA - Com a queda do Learjet no Campo de Marte, descobriu-se que há 12 mil jatinhos e helicópteros voando aparentemente sem controle. E o risco?
SOLANGE - O setor é muito auto-regulado, ou seja, o piloto do avião tem uma responsabilidade muito grande, e vamos investir muito em capacitação. É impossível a Anac fiscalizar todas essas 12 mil aeronaves antes da decolagem, da mesma forma que é impossível um departamento de trânsito checar todo carro, ônibus e caminhão sem farol, com pneu careca.

FOLHA - Aviões de segunda mão comprados no exterior não operam no Brasil com características desconhecidas da manutenção?
SOLANGE - Uma das nossas preocupações agora é com o Fokker-100. A fábrica dele não existe mais, e a Ocean Air está trazendo esse aparelho para cá.

FOLHA - A TAM já opera Fokker-100, que já tem uma imagem ruim por causa da queda em Congonhas.
SOLANGE - Mas a TAM tem manutenção própria, é diferente. Estamos observando e preocupados em saber quem e como a Ocean Air vai escolher para a manutenção dos seus aviões.

FOLHA - De zero a dez, que nota a senhora dá ao setor, agora que está dentro do sistema?
SOLANGE - Há cinco, dez anos, a gente tinha muita capacidade ociosa das companhias e de toda a infra-estrutura. Aí, é fácil ser bom. Hoje, eu daria seis pra gente, talvez sete. Há muito o que melhorar, e em todas as áreas, mas nós temos uma das melhores frotas de aviação regular do mundo. Os aviões da Gol são todos novos, com cinco, seis anos. A TAM está renovando toda a frota dela, retirando os Fokker-100. Nos EUA, por exemplo, há muitos aviões antigos, velhos turboélices.

FOLHA - Como compatibilizar o expressivo aumento da demanda com uma infra-estrutura praticamente estável?
SOLANGE - Eu não diria que a nossa infra-estrutura está estável, diria que cresceu menos do que o necessário. Mas vai crescer muito nos próximos anos. Um dos trabalhos que fechamos na Secretaria de Aviação Civil foi o plano para São Paulo. O ministro da Defesa vai se reunir na próxima [nesta] semana com a ministra Dilma e com o presidente [Lula] para discutir opções de investimento.

FOLHA - O terceiro aeroporto?
SOLANGE - Acho que São Paulo vai precisar de um outro aeroporto nos próximos dez anos e isso significa começar hoje. Mas, para construir um novo, é preciso um espaço monstruoso, de uns 10 mil km2, e as pessoas querem descer em locais centrais. Achar um local adequado não é uma tarefa fácil.

FOLHA - Com a área econômica cortando gastos e investimentos pós-CPMF, o projeto tem alguma chance? E o plano B?
SOLANGE - A gente já tem um terceiro aeroporto, Viracopos, e os estudos contemplam a terceira pista e o aumento da capacidade das atuais pistas de Guarulhos e da capacidade de Congonhas, o que é um exercício muito difícil. Temos de analisar também o custo-benefício.

FOLHA - No estudo que o presidente vai analisar, qual o melhor custo-benefício, o terceiro aeroporto ou investir no acesso a Viracopos?
SOLANGE - Viracopos é um aeroporto com bom potencial. Um bom sítio aeroportuário, uma estrutura de espaço aéreo excelente, com toda a lógica técnica para se investir nele. O complicador é logístico: o acesso a ele. Discute-se esse custo.

FOLHA - Do metrô?
SOLANGE - Exatamente. Um trem de 20 minutos.

FOLHA - Isso tudo, somado, não é um quebra-galho que só adia a solução real, que é o terceiro aeroporto?
SOLANGE - O terceiro aeroporto é uma opção também. Mas há um quebra-cabeça de opções. E, mesmo que a gente anuncie hoje um novo aeroporto, ele não fica pronto antes de cinco, seis anos. Então, é preciso também uma solução para os próximos cinco, seis anos.

FOLHA - Ou seja, vai ter uma solução emergencial e uma definitiva, o terceiro aeroporto?
SOLANGE - Parece que sim. O que não há dúvida nenhuma é que Congonhas e Guarulhos precisam ter um terceiro aeroporto, mas Viracopos pode ser esse terceiro aeroporto.

FOLHA - O Galeão opera com ociosidade. Não seria uma boa opção para desafogar São Paulo dos vôos internacionais?
SOLANGE - Não faz muito sentido eu dizer onde o avião "a", "b" ou "c" vai ter de descer. Eu posso e devo dizer que o máximo de Congonhas é tal, o máximo de Guarulhos é tal, mas não posso obrigar ninguém a descer no Galeão.

FOLHA - A sra. teme o duopólio de Gol e TAM?
SOLANGE - O duopólio competitivo não é nenhum ônus para a sociedade. Desde que as duas ocupam quase 90% do mercado, a gente tem visto uma concorrência grande de preços e de qualidade de serviços. A Gol trouxe um conceito de "low cost" [baixo custo] que deu uma dinâmica muito maior para o mercado. Temos concorrência no mercado doméstico, que é completamente livre, só que no internacional ainda não.

FOLHA - Quando a BRA quebrou, a Ocean Air rapidamente se ofereceu para ocupar esse espaço e ser uma das três grandes. Ela tem fôlego para isso?
SOLANGE - O que ela mostrou no final do ano e tem mostrado para a gente até agora, não.

FOLHA - A tendência, então, é manter o duopólio?
SOLANGE - Nós temos que identificar duas coisas. Uma é se o mercado brasileiro é suficiente para comportar três grandes, porque aviação precisa de escala. A gente já teve três grandes, e elas encolheram. Outra coisa é que a Anac não está criando mecanismos adequados para facilitar a entrada de novas empresas. Trabalhamos nisso.

FOLHA - Ampliando o limite do capital estrangeiro das empresas, por exemplo? Para quanto?
SOLANGE - Acho que o primeiro passo seria de 20% para 49%, que permitiria a estruturação de uma nova empresa para entrar no mercado. Isso é lei, precisa do Congresso e acho que há consenso entre vários partidos. Há projeto de até 100%, mas acho um passo muito grande para a estrutura regulatória que nós temos.

FOLHA - Com 100%, as companhias brasileiras sobrevivem?
SOLANGE - Não sei. A Gol, por exemplo, ganhou prêmio por maior eficiência de horas voadas por avião da Boeing.

FOLHA - E o "céu aberto" para as estrangeiras no Brasil, que era tabu para os militares?
SOLANGE - A evolução do mundo é por uma liberdade cada vez maior. Hoje, com exceção dos vôos para a América do Norte, quase todos os nossos vôos têm mais autorizações do que são utilizados para qualquer país. A gente dá muitas autorizações, mas as empresas não utilizam.

FOLHA - Uma das coisas que entopem os aeroportos é o excesso de segurança nos vôos domésticos, mas o 11 de Setembro não foi aqui. Pode amenizar?
SOLANGE - Já começamos a amenizar. O Brasil não precisa do mesmo nível de segurança que os EUA têm, que Londres tem, inclusive porque isso custa dinheiro. No fim do ano, tivemos congestionamento nas áreas de check-in das companhias, mas não na área de embarque da Infraero. Não precisa mais retirar o laptop da pasta, por exemplo. E vem mais até o Carnaval, não sei quais.

FOLHA - Vai ter mudança no valor ou na aplicação das multas por atrasos e cancelamentos?
SOLANGE - No valor, não há muita flexibilidade, mas a gente quer mudar o perfil da penalidade: menos multas e mais corte de autorizações de vôos, de venda de bilhetes. Regular as companhias pelo lado que dói: o bolso. Até o final de fevereiro teremos uma regra nova que exige qualidade e pontualidade. Com isso, vamos montar um índice, e os que não atingirem determinados limites serão penalizados.

FOLHA - E o "overbooking"?
SOLANGE - O ministro da Defesa está preparando um projeto que contempla essa questão. Virão boas notícias para o consumidor.

FOLHA - As empresas são concessões públicas. Como o Estado pode exigir ou estimular que assumam o chamado "osso" da aviação, os vôos necessários e não rentáveis?
SOLANGE - Em 1998, a aviação servia 180 cidades. Hoje, não chega a 140. Alguns vôos acabaram porque não eram lucrativos, porque num mercado aberto em que a gente não dá subsídios para as companhias, não faz sentido obrigá-las a voar para o lugar "a" ou "b", só se esse local envolver uma questão estratégica ou de saúde pública. Nos EUA, nestes casos, o governo tira dinheiro do Tesouro e dá subsídio cruzado.

FOLHA - É bom para o Brasil?
SOLANGE - Para locais estratégicos, não há outro jeito, a não ser subsídio. Ou a FAB faz, ou o o prestador comercial faz, mas, para isso, vai ter de ter subsídio.

FOLHA - Como explicar quase 9.000 passagens aéreas de graça para a Anac só em 2007? Há abuso?
SOLANGE - Seria prematuro eu dizer que há abuso. Esse número vem caindo, mas sempre será alto, porque a gente se desloca muito, para fiscalização. Mas agora só a diretora-presidente pode autorizar passagens internacionais e só os diretores podem autorizar as domésticas. E acabamos com os passes, não vamos mais voar sem pagar e, assim, vamos ter mais controle sobre o uso, com pedido formal.

 

 

Folha de São Paulo
14/01/2008
Economista assumiu posto após acidente
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A economista Solange Paiva Vieira, 38, assumiu o controle da Anac no final de 2007, após a crise que atingiu a agência com o acidente do Airbus da TAM, em julho.

Antes mesmo de responder a qualquer pergunta, foi aprovada por 21 votos a favor e dois contra na sabatina realizada em dezembro pela Comissão de Infra-Estrutura do Senado. Funcionária de carreira do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), ficou conhecida por fiscalizar os fundos de pensão como secretária de Previdência Complementar no governo FHC. Ocupou o cargo entre 2000 e junho de 2001.

Também participou da diretoria do Telos, fundo de pensão dos funcionários da Embratel, e foi assessora do ministro Nelson Jobim (Defesa), que a indicou para a Anac. Nascida em Valença (RJ), é casada e sem filhos.

Frase

Não faz muito sentido eu dizer onde o avião "a", "b" ou "c" vai ter de descer. Eu posso e devo dizer que o máximo de Congonhas é tal, o máximo de Guarulhos é tal, mas não posso obrigar ninguém a descer no Galeão

Frase

O duopólio competitivo não é nenhum ônus para a sociedade. Desde que as duas ocupam quase 90% do mercado, a gente tem visto uma concorrência grande de preços e de qualidade de serviços

 

 

O Estado de São Paulo
14/01/2008
Greve na Aerolíneas afeta passageiros no Brasil
Em SP, no Rio e em Florianópolis, vôos foram cancelados e houve atrasos de até 17 horas

Problemas de operação da empresa Aerolíneas Argentinas em Buenos Aires afetaram ontem passageiros em aeroportos brasileiros. Em Cumbica, Guarulhos, dos quatro vôos da empresa previstos para a capital argentina, dois foram cancelados e dois tinham previsão de atraso. O vôo 01240, com saída às 10h35, foi remarcado para 21h20. Apesar da confusão, a empresa não havia cancelado o vôo previsto para sair hoje de Guarulhos às 10h35.

No Aeroporto Tom Jobim, no Rio, dos dois vôos previstos ontem para Buenos Aires, um foi cancelado e outro registrou atraso de quase 18 horas. A decolagem estava marcada para 1h50, mas a aeronave chegou ao pátio somente às 19h10. A empresa confirmou os dois vôos para a capital argentina previstos para hoje.

A Aerolíneas também causou problemas em Florianópolis. Um vôo com decolagem prevista para 9h30 de ontem foi remarcado para 0h30 de hoje.

Funcionários da Aerolíneas em Buenos Aires entraram em greve no sábado, mas ontem retomaram gradualmente o serviço. No principal aeroporto da Argentina, Ezeiza, o caos que tomou conta do saguão na sexta-feira e no sábado - e incluiu a depredação dos guichês da Aerolíneas - acabou ontem.

Os vôos começaram a ser regularizados, de forma a embarcar os mais de 3 mil passageiros que ainda ontem esperavam seus vôos. A espera, em média, foi de 24 horas. No entanto, alguns clientes da Aerolíneas enfrentaram esperas de até 52 horas. No sábado, o pior dia, um total de 5 mil passageiros ficou retido. Um grupo mais irritado agrediu uma comissária e os pilotos entraram em greve.

No meio da noite, executivos da Aerolíneas negociaram com os funcionários e passageiros até que conseguiram um acordo para retomada das operações. Mesmo assim, a Aerolíneas ignorou os pedidos de ressarcimento financeiro ou de pagamento de hotéis durante a espera. No máximo, distribuiu alguns refrigerantes.

 

 

Coluna Claudio Humberto
14/01/2008
Assalto

O serviço prestado é vagabundo e quase sempre atrasa, mas a TAM age com absoluta certeza da impunidade: cobra mais de R$ 6 mil, ida e volta, São Paulo-Miami e até R$ 2,5 mil pelo trecho Brasília-Recife.

 

 

Valor Ecoômico
14/01/2008
SulAmérica e Gol

A SulAmérica criou um pacote de assistências para quem for voar pela Gol. Por R$ 3, é possível contratar por dois dias um serviço com cobertura que prevê pagamento de indenização à família, no valor de R$ 50 mil, nos casos de morte acidental ou invalidez permanente por acidente e serviços como pagamento de gastos de acompanhantes, incluindo diárias em hotéis, em caso de internação.

 

 

Site Vude Versus
14/01/2008
Airbus entrega segundo avião gigante A380 para a Singapore Airlines


A Airbus entregou na sexta-feira a segunda unidade do avião gigante A380 à companhia aérea Singapore Airlines. O avião, cuja entrega ocorreu em Toulouse (sul da França), onde está a sede da Airbus, está equipado com quatro motores Rolls-Royce Trent 900. O primeiro A380 foi entregue à Singapore Airlines, primeiro operador do avião gigante, em 15 de outubro, e realizou seu primeiro vôo comercial dez dias depois. No vôo inaugural, os passageiros pagaram bilhetes com preços de US$ 560,00 a US$ 100 mil por uma "suíte" com televisão de tela plana, camas cobertas com lençóis desenhados por Givenchy e mesas de trabalho.

Enquanto isso, o A380 sofreu na sexta-feira seu primeiro incidente, ao sair da pista do aeroporto de Cingapura. O avião foi parar na grama enquanto era rebocado para preparar sua decolagem. Todos os passageiros do avião, que ia para Sydney, foram transferidos para um Boeing 747. O A380 saiu do asfalto e foi parar no gramado quando ainda não estava utilizando sua própria força. Ele estava sendo levado para a pista por um reboque, que sofreu uma falha no sistema hidráulico.

 

 

O Estado de São Paulo
13/01/2008
Famílias à espera de Denise Abreu
Ex-diretora da Anac foi intimada a depor na 3.ª; parentes de vítimas de acidente, ocorrido há 6 meses, preparam protesto
Roldão Arruda

A ex-diretora da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) Denise Abreu deve comparecer, na terça-feira, à sede do 27º Distrito Policial, em São Paulo. Intimada pelo delegado Antonio Carlos Barbosa, terá de prestar depoimento sobre a pior tragédia da história da aviação brasileira: a do vôo TAM JJ3054, que há seis meses, mais exatamente no dia 17 de julho do ano passado, resultou na morte de 199 pessoas no Aeroporto de Congonhas.

Não se sabe se ela virá, uma vez que já fracassaram as duas tentativas anteriores do delegado. Mas, mesmo sem ter a certeza de sua presença, os familiares das vítimas já estão organizados para recepcioná-la, às 14 horas, na porta da delegacia, no bairro do Campo Belo, nas imediações de Congonhas, com uma manifestação de protesto. Para eles, Denise, que dirigia a agência na época do acidente, pode ser uma das responsáveis pela morte de filhos, netos, pessoas amadas.

Apontar e levar a julgamento os responsáveis pelo desastre - quando o Airbus A320 da TAM não conseguiu frear ao pousar, espatifou-se contra um edifício e pegou fogo - virou uma missão para muitas pessoas. Malu Gualberto, advogada de 52 anos, que atuava na área de sucessão familiar, desistiu de seu escritório de advocacia para dedicar-se à apuração das causas da morte de seu marido, Antonio Gualberto Filho, de 56 anos. Funcionário da TAM, ele trabalhava no edifício ao lado da pista, na sala que recebeu o primeiro impacto do avião.

“Não vou descansar enquanto não souber a verdade”, diz ela, na sala de seu apartamento, no bairro do Planalto Paulista, na zona sul. “Aquele avião não poderia ter pousado em Congonhas. Pousou porque puseram incapazes em postos que envolvem a segurança das pessoas.”

No canto da mesa com tampo de vidro de sua sala repousa uma revista de circulação interna da TAM, que o marido pôs ali uma semana antes de morrer e ela não tem coragem de retirar.

O administrador de empresas Luiz Moyses, de 36 anos, desfez-se de tudo em Porto Alegre e mudou-se para São Paulo. Instalado num flat em Moema, também na zona sul, dedica-se a acompanhar a investigação do acidente no qual morreu Nádia, sua mulher, aos 33 anos.

“Em nome dela, não vou deixar esse inquérito morrer”, assegura. Ele e Nádia namoraram desde a adolescência e estiveram casados por sete anos. Uma das lembranças dela que Moysés ainda conserva foi a mensagem que enviou pelo celular, ao embarcar no Airbus. “Estou no avião. Ligo quando chegar. Beijos.”

Para conduzir melhor sua luta, eles criaram a Associação dos Familiares e Amigos das Vítimas do Vôo TAM JJ3054 e reúnem-se uma vez por mês em hotéis de São Paulo ou Porto Alegre. Tudo é custeado pela empresa aérea, em decorrência de um termo de compromisso assinado em setembro, na sede da Secretaria de Justiça do Estado de São Paulo.

A próxima reunião está marcada para o fim de semana que vem, num hotel da zona sul de São Paulo. Ao final, deverão ir para Congonhas e realizar mais um ato de protesto na fila de check-in da TAM, reclamando da falta de esclarecimentos.

O presidente da associação é o professor de Matemática Dario Scott, de 44 anos, morador de Porto Alegre. “Nosso objetivo é descobrir o que aconteceu”, explica. “Não tem sido fácil, porque o inquérito é dificultado pela lentidão das autoridades federais na liberação dos documentos que estão em seu poder. Na transcrição que nos entregaram do material da caixa preta, com 30 minutos, faltam 23 minutos. Cobramos o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos, o Cenipa, e responderam que não é relevante. Pode não ser, mas temos direito de ouvir.”

A única filha do professor, a menina Thaís, de 14 anos, tinha embarcado no Airbus com o objetivo de passar o restante das férias de julho na casa dos avós, em São Paulo. Ele e a mulher, Ana, de 48 anos, ainda choram todos os dias. “Ela era a alegria da casa”, diz Dario.

Foi só às vésperas do Natal que eles se desfizeram de roupas e brinquedos da filha, doando quase tudo para crianças pobres. “Estamos pensando em recomeçar”, conta o professor. “Estamos tentando um novo filho. Se não conseguirmos, vamos buscar a adoção.”

Thaís tinha convidado para a viagem a amiga Rebeca Haddad, também de 14 anos. Seu pai, o consultor de empresas Christophe Haddad, francês de 41 anos, 30 dos quais vividos no Brasil, também faz parte da diretoria da associação; e sua segunda mulher, Ana Behs, de 43, é voluntária na assessoria de comunicação da entidade.

Haddad, que também é pai de um garoto de 12 anos, diz estar convencido de que a tragédia não foi acidental. “Pelo que estamos vendo no inquérito policial, houve dolo, houve uma seqüência de negligências. Estamos acompanhando para evitar que acabe em pizza, como aconteceu com as duas CPIs do Apagão Aéreo.”

No dia do acidente, Haddad chegou em casa no começo da noite e ligou a TV, para ver novela. “De repente entrou aquela música de edição extraordinária da Globo. Eu fiquei assistindo. Vi, da sala da minha casa, minha filha ser cremada.”

Para vencer o dia-a-dia, o consultor está recorrendo à ajuda de um psicólogo. O filho, a ex-mulher, a madrasta e os avós de Rebeca também freqüentam terapeutas - cujos serviços são pagos pela TAM, dentro do mesmo acordo assinado em setembro.

Nas conversas com os parentes, as queixas voltam-se quase sempre contra o governo federal. A paulistana Lili Mello, de 40 anos, diz que nunca vai esquecer o gesto obsceno que Marco Aurélio Garcia, assessor especial da Presidência da República, fez quando soube que a causa do acidente poderia ter sido uma falha mecânica. “Ele riu da morte do meu marido. Deveria ter sido demitido na hora.”

O marido de Lili, o engenheiro Andrei Mello, foi uma das quatro vítimas cujos corpos, de tão destruídos, não puderam ser identificados pelo Instituto Médico-Legal (IML) de São Paulo.