Jornal do Brasil
12/08/2007
Rotas, a teia da crise nos ares
Kayo Iglesias e Rodrigo Camarão
A derrocada da Varig, a corrida desenfreada para ocupar
o espaço da então maior empresa de aviação
do país e a falta de critério no redesenho
da teia de rotas que compõem a malha aérea
foram as causas diretas do emaranhado que o governo tenta
desfazer depois do maior acidente aeronáutico da
história do Brasil. Especialistas apontam: a tarefa
do ministro da Defesa, Nelson Jobim, será árdua.
A crise que começou na década de 90 e culminou
no leilão da Viação Aérea
Rio-Grandense S/A, em 2006, fez com que o mercado se tornasse
apertado, de acordo com os estudiosos da área.
Aviões deixaram de levantar vôo. Um excedente
de milhares de profissionais engrossou a reserva de trabalho.
Os passageiros migraram das rodoviárias para os
aeroportos, por causa da queda no preço da passagem
e do aumento do poder de compra.
Mas, ao contrário do que se possa imaginar, o
número de pousos e decolagens diminuiu. Além
disso, as empresas concentraram suas operações
em pontos como Congonhas e Brasília, para otimizar
os custos - sem o planejamento nem a fiscalização
devidos do governo.
Durante seminário sobre a crise aérea
promovido pela Coppe/UFRJ, quinta-feira, a quebra da Varig
foi uma das principais causas apontadas pelos especialistas
para a crise aérea atual. O comandante Elnio Borges
Malheiros, presidente da Associação dos
Pilotos da Varig (Apvar), lembrou que a saída da
empresa do mercado fez com que aproximadamente 60 aeronaves
também deixassem os céus do país.
- Tiveram que aumentar o uso das aeronaves existentes
- alerta Elnio. - Os ciclos de manutenção
ficaram cada vez menores. Estão ainda dentro do
permitido, mas aumentam o risco da operação.
Houve uma absorção de um certo número
de passageiros, mas acompanhada de uma sobrecarga de equipamentos
e tripulação.
Elton Fernandes, professor de Engenharia de Produção
da Coppe/UFRJ, usa dados da Infraero, a estatal que administra
os aeroportos, para mostrar que, de 1998 ao ano passado,
houve um aumento de 59% do número de passageiros,
de 64.021.990 para 102.185.376. O número de movimentos
das aeronaves, calculado pelos pousos e decolagens, entretanto,
caiu aproximadamente 6% no período. Passou de 2.046.671
para 1.918.538.
- A Varig tinha 50% do mercado doméstico, mas
era um desastre financeiro - conta Elton. - Com a quebra,
não tivemos um aumento estrondoso de passageiros
que pudesse gerar constrangimento na estrutura. O que
houve foi a concentração de movimento nos
aeroportos de Brasília e, principalmente, Congonhas.
O governo deveria regular isso. O fim da Varig foi um
desserviço para a sociedade, e ela talvez esteja
pagando em crise aérea muito mais do que o prejuízo
da empresa. A conta é muito maior que o buraco
da Varig.
Jornal do Brasil
12/08/2007
Apagão faz passagens aumentarem
50%
Economista mostra o preço
do descaso
Rodrigo Camarão
O economista Paulo Rabello de Castro debruçou-se
sobre gastos diretos e indiretos de um passageiro para
dar aos transtornos nos aeroportos um preço. Nas
suas contas, ainda preliminares, ele ressalta: a crise
aérea fez as passagens aumentarem de valor de 50%
a 60%.
Na conta, o PhD em Economia pela Universidade de Chicago
leva em conta três variáveis: a passagem,
o tempo gasto pelo passageiro e o risco total. A primeira
etapa é a mais fácil, já que está
expressa no valor nominal do bilhete pago pelo passageiro.
O tempo gasto vai variar, segundo o especialista, de acordo
com o custo das horas que cada um desperdiça na
longa espera das salas de embarque lotadas, com vôos
atrasados.
- A partir da segunda hora de atraso, o preço
da passagem já subiu 50%, calculado pelo custo
médio das horas das pessoas envolvidas - ressalta
Paulo Rabello.
Para calcular o preço de um passageiro, o economista
usou como base um indivíduo das classes A ou B,
com renda acima de 10 salários mínimos,
em horário comercial. A partir daí, calculou
quanto ganha uma pessoa com esse perfil por hora:
- Cada um tem um custo. Uma pessoa que paga R$ 10 mil
para viajar num jatinho, quando poderia pagar R$ 1 mil
pelo mesmo percurso, tem o preço da hora muito
maior. Tempo é dinheiro.
O terceiro e último elemento da conta de Paulo
Rabello de Castro é o risco de pegar um avião.
Ele usou dados do Centro Nacional de Investigação
e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos
(Cenipa). Em 1990, havia uma média anual de 70
mortes por ano em acidentes aéreos. Em 1996, o
acidente com o Fokker 100 da TAM elevou o número
para 188. Em 2006, a cifra atingiu 215 mortos, com outro
acidente, desta vez da Gol, em Mato Grosso. Só
este ano, com a tragédia que matou 199 pessoas
no vôo 3054 da TAM, o número já saltou
para 228.
- O número de mortes já é três
vezes maior - calculou o PhD. Paulo apresentou rapidamente
o estudo durante um seminário sobre a crise aérea
promovido pela Coppe/UFRJ, quinta-feira.
O duopólio hoje formado por TAM e Gol no mercado
ainda restringiu as chances de o passageiro escapar do
prejuízo quase certo. Como avalia o economista,
uma das grandes contradições do sistema
foi que a desregulamentação, no lugar de
aumentar a concorrência, legou a apenas duas empresas
o transporte de 90% dos passageiros.
- O transporte aéreo exige um grau de especialização,
tem custos elevadíssimos com combustível,
manutenção das aeronaves - diz o professor
Respício Espírito Santo, colaborador da
Coppe/UFRJ. - O único país que tem um grande
oligopólio, com diversas empresas fortes no setor,
são os Estados Unidos. A liberalização
do setor foi benéfica no mundo inteiro. Deu mais
oportunidade para as classes C, D e E viajarem de avião.
Isso movimenta a economia positivamente. Quanto mais o
governo intervém, pior fica para a sociedade no
mundo inteiro.
Apresentado como uma das soluções para
a crise, o investimento em terminais de aeroportos também
foi duramente criticado no seminário. Anderson
Ribeiro Correia, presidente da Sociedade Brasileira de
Transporte Aéreo e professor do Instituto Tecnológico
da Aeronáutica, compara a construção
do terceiro terminal de passageiros do Aeroporto de Guarulhos
a uma obra inútil, se não for feita a terceira
pista.
- Temos de oferecer mais capacidade nos aeroportos no
lugar certo. O mercado escolhe esses lugares. Não
adianta fechar o Aeroporto de Congonhas e não investir
em Guarulhos - disse. - Se o governo fizer um terceiro
terminal sem construir uma terceira pista em Cumbica,
o aeroporto vai virar um depósito de pessoas. Há
hoje uma ânsia para se investir em terminais, mas
as pessoas têm que viajar na hora que precisam.
Jornal do Brasil
12/08/2007
Profissões da aviação
perderam o glamour
A crise aérea fez com que empregos que envolviam
glamour, viagens pelo Brasil e pelo mundo e bons salários
perdessem parte do charme e do status. A antes disputadíssima
profissão de comissário de bordo já
não é tão concorrida assim. A TAM
oferece 100 vagas em Congonhas e Guarulhos, conforme divulgou
em seu site na seção "Trabalhe conosco".
Logo depois do acidente com o vôo 3054, o JB mostrou
que a empresa paulista teve pelo menos 170 pedidos de
demissão e licença médica.
O candidato precisa ter altura mínima de 1,62
metro, Ensino Médio completo e saber, pelo menos
em nível intermediário, segundo idioma como
inglês, espanhol, francês, italiano, alemão
ou japonês.
As exigências são muito menores do que as
da época de ouro da profissão.
- O comissário de vôo tinha uma carreira.
Com 20 anos de atividade, chegava a ganhar R$ 4 mil, tinha
uma escala mais humana, com diárias em moeda estrangeira
- diz o comandante Marcelo Duarte, vice-presidente da
Associação de Pilotos da Varig (Apvar).
- Hoje, oferecem R$ 1,2 mil para a pessoa, geralmente
uma jovem de pouco mais de 20 anos, trabalhar em São
Paulo, com uma carga horária enorme e sem tanta
segurança.
Para Marcelo, o déficit de 100 comissários
de vôo é considerável.
- Para fazer a malha com 100 profissionais a menos,
alguma coisa está errada. Ou deixam de fazer vôos
ou estão com equipes sobrecarregadas - ressalta.
A presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas, Graziella
Baggio, evita a relação entre as contratações
e a tragédia do dia 17. Segundo ela, a maior concorrente
também está abrindo vagas.
- Em setembro, a Gol vai admitir 60 comissários,
e a Varig, 88 - enumera a sindicalista, que é ex-comissária
de vôo.
Na sexta-feira, em Brasília, procuradores do Trabalho
reuniram-se com representantes dos sindicatos de profissionais
da aviação. Depois de realizar trabalhos
de campo em aeroportos durante uma semana, a força-tarefa
do Ministério Público apontou uma série
de irregularidades detectadas - entre elas, sobrecarga
de trabalho, descumprimento de acordo coletivo da categoria,
falta de descanso, terceirizações ilícitas
e assédio moral.
- Depois do processo de investigação, o
MPT vai entrar em contato com as empresas aéreas
para firmar Termos de Ajustamento de Conduta para sanar
as irregularidades e, se necessário, também
poderemos ajuizar ações civis públicas
com pedido de pagamento de multas elevadas em caso de
descumprimento - explicou o procurador Alessandro Santos
de Miranda, que comanda a Coordenadoria Nacional de Defesa
do Meio Ambiente de Trabalho. (K.I. e R.C.)
O Globo
12/08/2007
Ancelmo Góis
O Estado de São Paulo
12/08/2007
Anac orientou empresas a enfrentar
governo
Leonencio Nossa
Apesar de ser funcionária de um órgão
criado para regular e fiscalizar serviços das empresas
aéreas, a diretora da Agência Nacional de
Aviação Civil (Anac) Denise Abreu incentivou
as companhias a reagirem contra a decisão do governo
de reduzir o tráfego no Aeroporto de Congonhas,
zona sul de São Paulo, tirando dele o papel de
ponto de conexão para a maioria dos vôos
do País. Em reunião no Rio, no dia 26, Denise
discutiu abertamente com representantes das empresas uma
forma de driblar a proibição das conexões
em Congonhas, palco, nove dias antes, da tragédia
com o Airbus da TAM, na qual morreram 199 pessoas.
O Estado apurou com três participantes da reunião,
em conversas separadas, que Denise disse, mais de uma
vez, que as empresas podiam recorrer à Justiça
contra a proibição. “Vocês podem
reagir a isso porque têm poder econômico.”
E acrescentou: “A Anac não pode fazer nada,
a Anac só fiscaliza, mas vocês podem.”
Outro participante da reunião contou que Denise
chegou a pedir que fossem ouvidos advogados do Sindicato
Nacional das Empresas Aeroviárias (Snea), que se
opõe ao pacote do Anac. “Vamos ouvir o setor
legal do Snea”, sugeriu.
Oficialmente, Denise estava na reunião para exigir
o cumprimento da Resolução nº 6 do
Conselho Nacional de Aviação Civil (Conac).
A resolução sintetiza um pacote anunciado
pelo Conac no dia 20 para desafogar Congonhas. A Anac
é subordinada ao conselho. “Ela conduziu
a reunião no sentido de criar obstáculos
à implantação das medidas”,
avaliou, taxativo, um participante da reunião.
O Estado procurou Denise na quarta-feira. Por meio da
Assessoria de Imprensa da Anac, ela disse que recomendou
às empresas o cumprimento das normas do Conac.
Ontem, por meio de sua assessoria, negou que tenha estimulado
as empresas a reagirem. Ela informou que, na reunião,
sugeriu que formalizassem dúvidas, queixas e propostas
em um documento dirigido à Anac e prometeu encaminhá-lo
ao ministro da Defesa, Nelson Jobim. Segundo a assessoria,
o que ela disse aos representantes das empresas foi: “Se
querem reagir, escrevam um documento e eu encaminho.”
O documento foi entregue à Anac e será repassado
a Jobim nesta semana.
A articulação de Denise com as empresas
segue linha oposta à de Jobim (que tomou posse
na véspera da reunião) e da ministra da
Casa Civil, Dilma Rousseff. Ambos já disseram que
o governo não aceitava mais a carga de conexões
em Congonhas. Jobim reiterou o discurso ontem em São
Paulo, quando anunciou investimentos em Viracopos, Jundiaí
e Guarulhos. Na visita, ele afirmou que o Conac será
a “cabeça” do setor. “Não
vejo problema na existência de todas essas entidades:
Aeronáutica, Anac e Infraero. A questão
é ter um Conac com capacidade de fixar as diretrizes.
Isso já está ocorrendo.”
O Estado de São Paulo
12/08/2007
Denise fez lobby por proposta de
sindicato
Articulação irritou
executivo, que disse que reunião não era
do Snea
Leonêncio Nossa
Para tentar driblar as resoluções do Conselho
Nacional de Aviação Civil, a diretora da
Anac Denise Abreu chegou a articular com os participantes
da reunião do dia 26 no Rio a aprovação
de um documento redigido pelo próprio Sindicato
Nacional das Empresas Aeroviárias (Snea). A ponto
de um executivo presente protestar: “Este encontro
não é uma reunião de sindicato.”
Denise, então, se viu obrigada a recuar e o encontro
terminou sem consenso. A diretora encerrou a reunião
com um apelo aos empresários: “Gente, não
vamos comunicar nada, é melhor não contar
nada lá fora.” E concluiu: “Falar com
a imprensa agora só vai gerar confusão.”
O encontro teve a presença de representantes da
TAM, Gol, Ocean Air, BRA, Trip, WebJet e Variglog. O documento
do Snea defendia a revisão do veto às conexões
no Aeroporto de Congonhas. Para convencer as autoridades,
os empresários sugeriram a adoção
de um tempo mínimo de conexão no aeroporto
- Minimum Connection Time (MCT), no jargão do setor
- de 60 minutos. Alegaram que a obrigatoriedade de manter
os aviões no solo por 1 hora, no mínimo,
reduziria o número de pousos e decolagens em Congonhas.
Antes do acidente com o Airbus, as conexões duravam,
em média, de 30 a 45 minutos, tempo considerado
apertado, mas altamente rentável para as companhias.
Com o MCT maior, as empresas teriam de abrir mão
de escalas de vôo muito apertadas. Isso traria outro
efeito positivo: reduzir o risco de que atrasos em Congonhas
se refletissem em outros destinos, num efeito dominó.
A tese dos defensores da idéia era a de que a
medida não representaria recuo para o governo e
ao mesmo tempo atenderia aos interesses das empresas.
“Um MCT de 60 minutos representaria uma diferença
pequena, de 15 minutos. Esse era o pulo do gato”,
disse um participante da reunião.
Ascom PDT
12/08/2007
Crise da Aviação:
debate na Fundação Brizola mostra que desregulamentação
do setor está na raiz da crise
por Osvaldo Maneschy
“O dia em que você soltar um ônibus
a 10 mil metros de altura e ele sair voando, o preço
de uma passagem de ônibus poderá realmente
custar o de uma passagem aérea” afirmou o
presidente da Associação de Pilotos da Varig,
Comandante Élnio Borges, em palestra nesta quarta-feira
(8/8) na sede nacional da Fundação Leonel
Brizola – Alberto Pasqualini, no Rio de Janeiro,
ao questionar o que chamou de “falsas verdades”
sobre a crise da aviação brasileira que
foram se cristalizando na opinião pública
por conta da ação, competente, dos que advogaram
a desregulamentação total do setor.
Segundo o Comandante Élnio Borges, inverdades
defendidas ao longo dos anos - a partir do Governo Collor
- pelos que querem o afastamento do poder regulador do
Estado; foram incutidas na população “partindo
da falsa premissa de que o mercado tudo resolve”.
Em linha frontalmente contrária, argumentou, que
a aviação “precisa da presença
forte do poder regulador porque quando isto não
acontece, advém o caos como o que o Brasil vive
hoje”.
Élnio Borges e Marcelo Duarte (na foto abaixo),
também comandante da Varig e vice-presidente da
associação de pilotos, argumentaram na palestra
que o afastamento do Estado brasileiro da gestão
da aviação civil, com a substituição
do Departamento de Aviação Civil (DAC) da
Aeronáutica pela ineficiente Agência Nacional
de Aviação Civil (ANAC), está na
raiz dos problemas.
Isto aconteceu, destacaram, porque o Estado brasileiro
– sob o domínio da ideologia neoliberal –
passou a se omitir na regulamentação a partir
de Collor de Melo e o DAC deixou de aplicar o Código
Brasileiro de Aeronáutica que determina expressamente
em seu artigo 188: “O Poder Executivo (do Brasil)
poderá intervir nas empresas concessionárias
ou autorizadas, cuja situação operacional,
financeira ou econômica ameace a continuidade dos
serviços, a eficiência ou a segurança
do transporte aéreo”. A Associação
de Pilotos da Varig nunca se omitiu.
Com a prevalência das “leis do mercado”,
a Varig foi quebrada por ações e omissões
de Governos e pela concorrência internacional predatória,
as empresas aéreas regionais faliram, as empresas
estrangeiras assumiram o tráfego aéreo internacional
brasileiro – prejuízo superior a 1 bilhão
de dólares anuais para o país; a malha aérea
nacional encolheu, a quantidade de municípios atendidos
diminuiu - de mais de 300 se reduziram para menos de aos
160; a frota nacional de aviões também encolheu;
a manutenção das aeronaves caiu de qualidade,
os aviões passaram a voar mais o tempo todo, aumentando
o lucro das duas companhias aéreas que restaram
– o duopólio privado TAM e Gol.
-- Ao contrário do que se diz no mundo inteiro,
avião não é o meio de transporte
mais seguro. Ele é o mais perigoso de todos. Só
que as suas normas de segurança são tão
rígidas, a necessidade de prevenção
é tão grande, que o índice de acidentes
é pequeno. Uma aeronave sempre tem redundância
em seus equipamentos de segurança porque a redundância
faz parte da aviação. Voar é perigoso
e é preciso ter alternativas – argumentou
Élnio Borges.
Um acidente começa, na verdade, quando regras
básicas de segurança são abandonadas
tipo pousar na pista curta de Congonhas em um dia de chuva
com um grande avião, pesado, sem reverso, e com
a pista fora das condições ideais. Ou obrigar
um controlador de vôo a monitorar até 30
aviões numa tela de radar – acompanhando
ao mesmo tempo e por longos períodos três
informações básicas de cada vôo
– rota, altitude e velocidade – fazendo o
monitoramente necessário para que nenhuma aeronave
se choque.
-- As normas internacionais determinam que um controlador
de tráfego aéreo monitore no máximo
12 vôos ao mesmo tempo. Permitir mais aviões
é atropelar a segurança. Os controladores
de tráfego aéreo do Brasil foram cozinhados
aos poucos, como as rãs, porque a cada dia que
passava recebiam ordens para monitorar cada vez mais vôos.
Passaram a acompanhar 13, 14, 15 vôos até
que chegaram ao ponto absurdo de controlarem cerca de
30 vôos ao mesmo tempo – algo impossível
de ser feito com segurança. A mente humana não
agüenta, se desliga, não permite isto. Os
controladores só despertaram para o problema quando
o Boeing da Gol se chocou com o Legacy da Embraer sobre
a Amazônia. A reação deles, no primeiro
momento, foi impedir que os aviões continuassem
decolando para que não tivessem que monitorar mais
de 14 tráfegos de uma mesma vez - daí começaram
as filas nos aeroportos.
Como os problemas acumulados ao longo dos anos de desregulamentação
não foram atacados de frente, o tráfego
aéreo se concentrou nas malhas que já eram
da TAM e Gol depois da saída da Varig do mercado
e passou a existir uma sobrecarga de aeronaves no Aeroporto
de Congonhas, já que a malha viária pela
Varig, que operava basicamente a partir do aeroporto Tom
Jobim, no Rio de Janeiro, não foi coberta –
ela simplesmente foi abandonada.
A sobrecarga nas rotas operadas pela TAM e a Gol, a partir
especialmente de Congonhas, geraram a sobrecarga no sistema.
O que explica o uso da pista curta daquele aeroporto em
um dia de chuva e com problemas técnicos na aeronave.
Se a segurança de vôo tivesse prevalência
sobre a questão do lucro, o risco dos acidentes
diminuiria.
Segundo Elnio Borges, as causas de um acidente aéreo
precisam obrigatoriamente ser apuradas com muito cuidado
porque sempre são muitas e é fundamental
elimina-las para que acidentes não se repitam.
Só assim a aviação continuará
a ser um meio seguro de transporte. “É por
isso que saber as causas também interessa a sociedade.
O acidente foi causado pelo pouso contra a luz do Sol?
Por esgotamento da tripulação? Por falha
mecânica? Na aviação, a prevenção
é fundamental”, explicou.
Detalhando, Elnio Borges explicou que os problemas no
Brasil começaram em 1990 na Conferência Nacional
de Aviação Civil, quando foram lançadas
as sementes da atual desorganização. Foi
nessa reunião que foram tomadas duas decisões
estratégicas: o fim da mono-designação
e o fim do Sistema Integrado de Transporte Aéreo
(Sitar), órgão gestor da malha aérea.
Com base na legislação e tratados assinados
pelo Brasil, a Varig era a única operadora internacional
– tarefa que desempenhava há anos com competência
e segurança. O governo, então presidido
por Collor de Melo, abriu os céus do Brasil para
as empresas estrangeiras, ignorando a mono-designação
fruto de tratados internacionais, permitindo a título
de “quebrar o monopólio” da Varig -
que a Vasp e a Transbrasil também voassem para
o exterior, abrindo o mercado brasileiro para as empresas
americanas por conta da lei da reciprocidade, alinhando-se
à política de céus abertos defendida
pelo governo dos Estados Unidos.
A conseqüencia imediata dessa decisão de
Collor é que a Vasp e a Transbrasil sucumbiram
quase que imediatamente logo após entrarem nesse
mercado por conta dos preços praticados no Brasil
pelas gigantes norte-americanas do transporte aéreo
- e a Varig começou a operar sistematicamente no
vermelho. Donas de frotas imensas, para as americanas
voar para o Brasil era parcela ínfima de suas malhas
cobrindo praticamente o globo - podiam praticar o preço
que as interessasse no momento. Por conta da prevalência
das “leis de mercado”, nada foi feito contra
os preços predatórios e a semente da atual
crise se enraizou.
O quadro do transporte aéreo hoje é que
os aviões das companhias brasileiras que restaram
ficam mais tempo no ar, em detrimento da manutenção;
enquanto as tripulações são muito
mais exigidas. Da mesma forma, a infra-estrutura aeroportuária
brasileira também foi afetada por essa política
de omissão do Estado, já que investimentos
fundamentais para a modernização e ampliação
da estrutura aeroportuária deixaram de ser feitos,
levando ao quadro atual onde nem mais as pistas de pouso
e decolagem se encontram em bom estado – quase todas
precisam de reformas.
Marcelo Duarte, vice-presidente da Associação
de Pilotos, filiado ao PDT, em sua palestra, por sua vez,
relatou a história da Varig desde a sua fundação,
na década de 20, e sua ligação histórica
com Leonel Brizola, fundador do PDT. Marcelo disse aos
presentes que a segunda linha internacional da Varig foi
obtida graças a intervenção direta
de Jango e Brizola, junto a Getúlio Vargas, então
no exílio voluntário da Fazenda Itu, no
Rio Grande do Sul, para que o então presidente
Perón, da Argentina, permitisse que a Varig fizesse
a ligação Porto Alegre – Buenos Aires,
segunda linha internacional da empresa. Antes, a Varig
só operava no exterior para Montevidéu.
Relatou também que a Varig, na campanha presidencial
de 1950, colocou um avião a disposição
de Getúlio e outro a disposição do
brigadeiro Eduardo Gomes. E que o mesmo Getúlio,
já presidente eleito, autorizou a Varig a voar
para Nova Iorque, ajudando-a também com crédito
oficial para que ela pudesse comprar os seus três
primeiros aviões Constellations - o que abriu os
céus do mundo para a empresa de origem gaúcha.
Graças, mais uma vez, a solicitação
de Ruben Berta a Brizola - já líder do PTB
na ocasião.
Marcelo Duarte historiou a participação
do Brasil nas convenções internacionais
de aviação e explicou detalhadamente as
políticas de transporte aéreo adotadas depois
da Segundo Guerra Mundial pelos Estados Unidos e pela
Inglaterra, posições especialmente cristalizadas
na Convenção de Chicago de 1944. Enquanto
os EUA, abarrotados de aviões de longo alcance
devido ao esforço de guerra queriam a liberdade
absoluta no setor, a Inglaterra, que só tinha aviões
de transporte de médio porte, defendeu a necessidade
de cada país cuidar de sua soberania no setor que
deveria ser fortemente regulamentado, ao contrário
do que queriam os norte-americanos. A proposta dos EUA
foi unanimemente rejeitada pelos países participantes.
Marcelo explicou detalhes da Convenção
de Chicago de 1999, 55 anos após a primeira, onde
o governo do Brasil não se fez representar oficialmente,
participando apenas uma delegação enviada
pela Associação de Pilotos da Varig, quando
todos os países do mundo defenderam os respectivos
espaços aéreos nacionais e suas políticas
para a aviação comercial.
Falaram em seguida o Deputado Paulo Ramos, líder
do PDT na Alerj, que relatou os detalhes da CPI da Varig,
especialmente a nebulosa venda da empresa a três
pessoas físicas por um preço irrisório,
multiplicado várias vezes, quando a empresa foi
repassada ao atual controlador – a Gol. Paulo Ramos
criticou a Justiça fluminense por não permitir
que nada fosse apurado na CPI e também seus colegas
deputados, que não se empenharam para que a verdade
dos fatos viesse a tona.
Pedro Porfírio, por sua vez, explicou detalhadamente
a questão do fundo Aerus, dos aeronautas, e o não
pagamento dos benefícios aos aposentados. Porfírio
chamou a atenção para o ato que os Trabalhadores
do Grupo Varig farão no próximo dia 17,
às 8 da manhã, no Aeroporto Santos Dumont,
e conclamou a todos os aeronautas e aeroviários
presentes à reunião, que se filiassem ao
PDT. Tanto Paulo Ramos quanto Porfírio elogiaram
a iniciativa do presidente nacional do PDT, Ministro Carlos
Lupi, do Trabalho, de dar entrada no Supremo Tribunal
Federal (STF) a ADI 3934, em defesa dos 10 mil funcionários
da Varig, demitidos com base na nova lei de liquidação
judicial, sem direito a qualquer indenização
trabalhista.
O Estado de São Paulo
12/08/2007
Monomotor cai e mata 2 pessoas no
RS
Duas pessoas morreram na queda de um monomotor na região
do Vale dos Vinhedos, em Bento Gonçalves, na Serra
Gaúcha. A aeronave, com registro em Garibaldi (RS)
caiu no pátio de uma casa, causando a morte de
seus ocupantes, Cláudio Flores da Cunha Marques
e Henrique Sartori Balbinoti. Em terra ninguém
se feriu. Segundo o capitão da Brigada Militar
(a polícia militar gaúcha), José
Paulo Marinho, “o avião tentou fazer uma
manobra, entrou em parafuso e se espatifou no pátio
da residência”.
Folha de São Paulo
12/08/2007
"Anac não poderá
mais formular nenhum tipo de política aérea"
Chamado por Lula para conter
a crise aérea, o novo ministro da Defesa planeja
um sistema em que a agência apenas cumprirá
as diretrizes do Conac
FERNANDO RODRIGUES DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A Agência Nacional de Aviação Civil,
a Anac, "não poderá mais formular nenhum
tipo de política" para o setor. Apenas cumprirá
diretrizes vindas do Conac (Conselho Nacional de Aviação
Civil), comandado pelo novo ministro da Defesa, o gaúcho
Nelson Jobim, 61. A formatação desse novo
sistema será concluída em 20 ou 30 dias,
diz o peemedebista. Uma proposta de lei ordinária
será enviada ao Congresso. Embora não tenha
ainda o desenho definitivo do projeto, Jobim admite com
clareza a desidratação da Anac. "Se
a conseqüência for o enfraquecimento da Anac,
assim será", diz ele na sua primeira entrevista
mais longa depois de assumir o cargo, no dia 25.
Nelson Jobim foi chamado para tentar reduzir os efeitos
de uma crise de dez meses no setor aéreo. Assumiu
logo depois do maior acidente aeronáutico da história
do Brasil, que deixou 199 mortos no dia 17 de julho depois
da explosão de um Airbus-A320, da TAM, num prédio
ao lado da pista principal do aeroporto de Congonhas,
em São Paulo. Cuidadoso, ele não faz julgamentos
sobre a gestão passada.
Fala apenas sobre a necessidade de eliminar as superposições
de poderes no sistema que comanda o setor aéreo.
A Anac é o principal alvo. Na nova lei em estudo
acredita ser preciso refletir sobre "a necessidade
de a Anac ter diretores com mandato". Diz ainda não
ter opinião a respeito, mas "talvez possa
se concluir que não seja necessário".
Os diretores poderiam ser demitidos a qualquer tempo pelo
presidente da República.
Sobre sua pasta, pretende finalmente conseguir integrar
Exército, Marinha e Aeronáutica -missão
não cumprida por todos os seus antecessores. Recusa-se
a tratar da possibilidade de seu nome figurar na lista
de postulantes ao Planalto em 2010. Lula teria dito a
ele que se consertasse o setor aéreo seria um candidato
a presidente imbatível? Em meio a risos, Jobim
responde: "Imagine. Isso não existe".
Ex-deputado federal, ex-ministro da Justiça e ex-presidente
do Supremo Tribunal Federal, ao aceitar o convite de Lula,
comunicou sua decisão a alguns amigos. Entre eles,
os tucanos José Serra (governador de SP) e Fernando
Henrique Cardoso (ex-presidente). Foi acusado por petistas
de "tucano infiltrado" no governo Lula. Jobim
dá risadas ao comentar a crítica e tem uma
explicação para a reação dos
petistas: "Talvez possa ser alguma síndrome
de conspiração tardia ou algo desse tipo".
A seguir, trechos da entrevista concedida na sexta-feira:
FOLHA - O Congresso divulgou dados das caixas-pretas
do Airbus-A320 da TAM. Há prejuízo nisso?
NELSON JOBIM - É necessária cautela para
tirar conclusões, mas não vejo prejuízo
na decisão dos deputados.
FOLHA - O governo federal foi lento ao reagir à
crise aérea?
JOBIM - Meu compromisso é resolver de agora para
a frente. Não julgarei o que foi feito ou deixou
de ser feito.
FOLHA - Ao assumir, o sr. usou a frase "aja ou saia".
Qual o seu prazo para agir e apresentar resultados?
JOBIM - O Conac [Conselho Nacional de Aviação
Civil] estabeleceu uma série de prazos. Primeiro,
atacaremos a desconcentração de Congonhas
até fevereiro. A tranqüilidade da prestação
de serviços deve vir dentro de 30 dias.
FOLHA - Está havendo intervenção
do Conac na Anac, que tem a prerrogativa para comandar
o setor?
JOBIM - O problema é que o Conac não exercia
sua função legal, de formular as diretrizes
em relação ao tráfego aéreo
brasileiro. A Anac foi criada em setembro de 2005. O Conac
não se reunia desde 2003. Veio a ter uma reunião
só agora. Ou seja, tudo estava sem um norte.
FOLHA - Mas a Anac tem o direito de não acatar
as decisões do Conac?
JOBIM - Não. O Conac fixa diretrizes para a Anac.
E ela decide a forma de executá-las. Não
altera diretrizes. Não cabe à Anac formular
a política aérea.
FOLHA - O Conac pode então dizer quantos vôos
por hora Congonhas pode suportar?
JOBIM - Exatamente.
FOLHA - Mas a Anac pode discordar e não implantar...
JOBIM - Não farão isso.
FOLHA - Por que não?
JOBIM - Porque o que existe é um sistema e não
ilhas de autonomia. E um sistema sempre pressupõe
a existência de uma cabeça. E ela se chama
Conac.
FOLHA - Muitos acreditam estar havendo uma intervenção
indevida do governo sobre uma agência reguladora
que deveria ser independente. Como o sr. responde a isso?
JOBIM - É necessário que se defina quais
setores da economia de fato requerem uma agência
reguladora e qual o grau de autonomia de cada uma.
FOLHA - No caso da aviação civil a idéia
da agência sempre foi dar mais previsibilidade ao
setor para atrair mais investimentos, mais empresas.
JOBIM - Mas não foi o caso. Há uma sobreposição
de competências entre o Ministério da Defesa,
o Conac, a Infraero e a Anac. O problema é institucional.
A lei 11.182, de setembro de 2005, criou a Anac. Traz
no seu artigo 3º: "A Anac, no exercício
de suas competências, deverá observar e implementar
orientações, diretrizes e políticas
estabelecidas pelo Conselho de Aviação Civil
(Conac)". Ou seja, está claro. A função
da Anac não é formular políticas
nem diretrizes. Ocorre que o Conac não se reunia
desde 2003. O sistema ficou desbalanceado. A agência
foi criada e nunca foram dadas diretrizes.
FOLHA - Mas como fica a autonomia da Anac?
JOBIM - A mesma lei determina no artigo 8º: "Cabe
à Anac adotar as medidas necessárias para
o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento
e fomento da aviação civil, da infra-estrutura
aeronáutica e aeroportuária do país,
atuando com independência, legalidade, impessoalidade
e publicidade, competindo-lhe implementar, em sua esfera
de atuação, a política de aviação
civil". Como se vê, a Anac implementa a política
criada pelo Conac. Mas muitos lêem apenas a frase
"atuando com independência" e acham que
se trata de uma independência absoluta. Quero propor
a revisão institucional do sistema para definir
competências. Vou fazer uma proposta de alteração
legal para deixar tudo ainda mais claro.
FOLHA - Quando ela fica pronta?
JOBIM - Em 20 ou 30 dias. Com o novo sistema, a Anac não
poderá mais formular nenhum tipo de política.
FOLHA - Essa mudança na lei não será
interpretada como uma redução do poder da
Anac?
JOBIM - Pode ser. Se a conseqüência for o enfraquecimento
da Anac, assim será. Mas eu não sei ainda
qual será o formato final. Só digo que é
necessário revisar o sistema e suas competências.
É o momento para isso.
FOLHA - Uma das possibilidades também é
o "recall" (destituição) para
os diretores da Anac?
JOBIM - É uma hipótese. Outra também
será colocar em xeque a necessidade de a Anac ter
diretores com mandato. Talvez possa se concluir que não
seja necessário. Ainda não tenho opinião
formada a respeito.
FOLHA - Se o governo se dedicar a escolher melhor os
diretores das agências não se evitaria problemas?
JOBIM - Na minha área, sim. A Infraero é
um exemplo.
FOLHA - Como será o processo de reformulação
da Infraero?
JOBIM - O novo presidente, Sérgio Gaudenzi, é
um homem de gestão, com experiência. Nos
anos 80 foi secretário-executivo do Ministério
da Previdência. Recentemente esteve na Agência
Espacial. Tem grande prestígio na Aeronáutica.
O que vai mudar na Infraero é a eficácia.
A empresa estava correndo atrás dos fatos. No caso
das pistas, fomos atropelados. O presidente que saiu da
Infraero disse que a pista principal de Guarulhos tem
20 anos e nunca foi reformada. Perguntei a ele se sabia
disso e o que havia feito. Não houve resposta.
Porque não tinha planejamento. Nós precisamos
planejar a infra-estrutura aeroportuária e estar
à frente dos fatos.
FOLHA - Como será a eventual privatização
da Infraero?
JOBIM - Eu me pergunto por que o capital privado entraria
numa empresa como a Infraero, sem governança corporativa.
Por isso vamos melhorar a governança. Mas isso
demora.
FOLHA - Ou seja, demora também para abrir o capital?
JOBIM - Neste primeiro momento não é possível
fazer a abertura de capital. Seria irresponsabilidade
até fixar um prazo. Lembre-se também que
os aeroportos não fazem parte do ativo da Infraero.
O ativo da Infraero são recebíveis, as taxas
cobradas nos aeroportos. Uma empresa para abrir capital
também precisa ter ativos e esse aspecto ainda
não foi resolvido.
FOLHA - O setor aéreo tem apenas duas grandes
empresas. Há espaço para mais, inclusive
estrangeiras?
JOBIM - O que temos de fazer é recompor a aviação
regional, que nem temos. O Brasil é o único
país do mundo que não compra aviões
da Embraer.
FOLHA - O sr. criticou o espaço entre as cadeiras
dos aviões. O melhor para esse problema é
obrigar as empresas a dar mais conforto ou estimular a
concorrência?
JOBIM - Ao ministro da Defesa cabe dizer que o sistema
não existe para servir só às empresas,
mas aos usuários. Houve alguma diretriz da Anac
para que reduzissem o espaço entre as cadeiras?
Não, foi uma decisão das empresas. Decidiram
sacrificar o conforto do usuário em benefício
de si próprias. É isso que tem de acabar.
As empresas têm de ser parceiras nesse processo
em que todos devem ser beneficiados, não só
elas. Mas se quiserem ir para a queda de braço,
podemos ir.
FOLHA - Como o sr. pretende fazer para o Ministério
da Defesa se afirmar e existir de fato?
JOBIM - Quero incluir o tema da defesa nacional na agenda
do país. É necessário mostrar a defesa
nacional vinculada ao desenvolvimento da nação.
As Forças Armadas não podem ser vistas como
um mero interesse corporativo. Temos de ter uma força
de dissuasão forte e uma concepção
de defesa. Esse é o projeto. Sem esse tipo de definição
não se tem uma aliança com o setor privado.
Nós precisamos ter uma relação com
uma indústria de defesa brasileira. Não
podemos ter um sistema no qual os insumos para a defesa
dependem de fornecimento de estrangeiros. É necessário
esse acoplamento.
FOLHA - Haverá um plano para recuperar a indústria
de armamentos?
JOBIM - Só por hipótese, vamos pensar no
sistema aéreo, que depende dos aviões de
monitoramento. Por que não fizemos isso com a Embraer?
Quero discutir nesses termos. Vamos ter um plano estratégico
de defesa para saber o que queremos do Exército,
da Marinha e da Aeronáutica.
FOLHA - Essas Forças têm orçamentos
separados. Deveriam ser juntos?
JOBIM - O mais importante não é o orçamento
unificado, mas haver uma estratégia conjunta de
operações.
FOLHA - Dê um exemplo.
JOBIM - O Brasil precisa ter forças terrestres
aquarteladas em toda a fronteira nacional ou isso se justifica
apenas na Amazônia? Nos locais onde não se
justifica é necessário ter uma força
tática de deslocamento rápido. Dependemos,
portanto, da integração das três Forças.
FOLHA - Qual a principal prioridade da Defesa?
JOBIM - A Amazônia, pela questão ambiental,
pelos casos de biopirataria e do narcotráfico na
região. Além de termos de continuar oferecendo
apoio logístico e suporte na área de segurança
pública, mas não como agentes diretos de
frente.
FOLHA - O sr. terá dinheiro para fazer tudo isso?
JOBIM - Temos de ter primeiro o projeto. Depois depende
de decisão do presidente.
FOLHA - Ao ser nomeado, o sr. ligou para algumas pessoas,
inclusive para o governador de SP, José Serra (PSDB).
Com quem mais falou?
JOBIM - Eu comuniquei ao Serra, ao senador Pedro Simon
(PMDB-RS) e ao Fernando Henrique Cardoso.
FOLHA - Por conta dessa proximidade com políticos
do PSDB alguns petistas o consideram um "infiltrado
tucano" no governo. O que acha?
JOBIM - [risos] Quem tem de achar é o presidente
da República. Eu vou continuar do mesmo jeito,
com minhas relações com o Serra e com o
ex-presidente Fernando Henrique.
FOLHA - Como reagiu FHC a sua entrada no governo Lula?
JOBIM - Disse que eu fiz muito bem, pois considerou um
desafio, embora também um risco.
FOLHA - A que o sr. atribui a reação do
PT à sua nomeação?
JOBIM - Talvez possa ser alguma síndrome de conspiração
tardia ou algo desse tipo.