::::: RIO DE JANEIRO - 11 DE NOVEMBRO DE 2007 :::::

 

Revista Isto É Dinheiro
11/11/2007
A BRA no chão
A companhia paralisa suas atividades, deixa 70 mil passageiros sem vôos e inaugura um novo capítulo na longa crise da aviação brasileira
Por Adriana Nicacio e Daniel Leb Sasaki


QUARTA-FEIRA 7 DE NOVEMBRO: passageiros da BRA se desesperam no Aeroporto de Brasília:
o caos aéreo mostra mais uma de suas facetas

No dia 21 de agosto de 2007, um evento na fábrica da Embraer, em São José dos Campos, marcou a encomenda de 20 aeronaves E 195 pela BRA, a caçula entre as companhias aéreas de atuação nacional no País. Houve solenidade no evento. Afinal tratava-se de um forte sinal de que a BRA se preparava para alçar vôos mais altos e ambiciosos - e o mais ilustre convidado para a festa, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, destacou esse fato. Na terça-feira da semana passada, 6 de novembro, exatos 77 dias depois, a BRA anunciou inesperadamente que interromperia suas atividades no dia seguinte. De um dia para o outro (literalmente), a empresa demitiu 1,1 mil funcionários, deixou 70 mil passageiros no chão e ameaçou um calote de R$ 100 milhões, o valor da dívida declarada pelos controladores. O pouso repentino também colocou na berlinda o grupo de investidores que injetou US$ 180 milhões na companhia em dezembro de 2006. Nada disso é fato isolado. O caso expõe mais uma faceta da desordem que toma conta do setor aéreo.


FOLEGATTI, O FUNDADOR: disputa fatal com os sócios

Por qualquer ângulo que se olhe (financeiro, operacional, segurança), a aviação comercial brasileira está mergulhada no caos. Há exemplos sintomáticos dessa confusão. No momento em que a demanda por vôos bate recordes históricos, uma companhia, sufocada por dívidas, fecha suas portas e outra, a Gol, reporta uma redução em seu lucro trimestral. "Num mercado onde nós já temos um duopólio, um concorrente a menos não é bom para o País nem para os passageiros. Só é bom para quem quer o duopólio", afirma German Efromovich, dono da OceanAir.

O caso da BRA surpreende por outros aspectos. Enquanto Transbrasil, Vasp e Varig pousaram definitivamente após longas agonias, a BRA encerrou suas atividades da noite para o dia.

A origem da crise reside no relacionamento entre o fundador da companhia, Humberto Folegatti, e seu sócio, o fundo de investimentos Brazil Air Partners, formado pelo Gávea, de Armínio Fraga, o Bank of America, Goldman Sachs, HBK, Darby, Development Capital e Millenium. Segundo Danilo Amaral, vice-presidente de relações institucionais da empresa, os desentendimentos começaram logo nos primeiros meses da parceria e desviaram o foco da operação. Na semana passada, Folegatti parecia ter sucumbido e aceitou deixar a presidência. Passados alguns dias, tomou a decisão de parar de voar. Os sócios acusam Folegatti de desrespeitar o compromisso de profissionalizar a gestão tão logo a sociedade fosse sacramentada. Eles também irritaram- se com as poucas informações recebidas sobre o destino dos US$ 180 milhões colocados na companhia em dezembro de 2006. "Esse capital foi usado no pagamento de dívidas e para recursos de caixa. Num segundo momento, serviria para comprar aviões da Embraer e tornar a BRA uma companhia regional", diz Amaral, em entrevista à DINHEIRO. "Aviação exige dinheiro constante. Se não se torna rentável logo, começa a gerar dívidas." Foi o que aconteceu. A empresa perdia algo em torno de R$ 15 milhões por mês porque cobrava tarifas até 20% menores do que os bilhetes promocionais das concorrentes - e seus custos não apresentavam o mesmo ritmo de queda. Amaral estima que seriam necessários US$ 30 milhões para retomar os vôos. Para ele, a derrocada se deve à crise aérea. "Não conseguimos gerir a empresa em um ambiente de crise estrutural do País", diz.

Essa dificuldade de gestão se refletiu na operação da companhia. Investigações preliminares da Anac apontaram a realização de vôos sem autorização de horário e uma sobrecarga imposta às tripulações - a agência recebeu denúncias de jornadas de até 22 horas. Entre 26 de agosto e 26 de setembro, a agência registrou 454 queixas de passageiros contra a empresa.

Dessas, 224 foram convertidas em multas. Segundo dados da Anac, de janeiro a setembro a BRA reduziu sua participação de mercado doméstico de 4,3% para 3,54% sobre igual período de 2006. A taxa de ocupação da companhia foi de 69%, ante 75% do mesmo intervalo de 2006. No mercado internacional, a participação da empresa até setembro subiu de 3,62% para 6,33%. A ocupação média no intervalo foi de 73%, ante 86% de 2006. Com uma frota de dez aeronaves Boeing e faturamento de R$ 400 milhões, a malha da BRA possuía 26 rotas domésticas e três internacionais.

Dois mundos: em agosto, a BRA encomendou 20 jatos à Embraer na presença de Lula e, 77 dias depois, parou de voar

A paralisação da BRA deixou viúvas no mercado. Em junho, a empresa e a OceanAir selaram um acordo para compartilhar as malhas aéreas. Menos de três meses depois, o namoro foi desfeito. A OceanAir amargou um prejuízo de R$ 400 mil. Os atritos com os sócios também não impediram a BRA de encomendar os 20 jatos E-195, da Embraer, no valor de US$ 1,4 bilhão. A fabricante de aviões pronunciou-se de forma lacônica. "Possíveis desdobramentos deste tema não afetarão negativamente previsões de entregas anteriormente divulgadas pela empresa", disse em comunicado. Procurado por DINHEIRO, Armínio Fraga, do Grupo Gávea, preferiu não se manifestar, alegando por meio de porta-voz ser acionista minoritário. É o silêncio do investidor que parece ter perdido o proverbial "toque de Midas" atribuído a ele no universo corporativo.


A crise com a BRA (assim como o caos nos aeroportos e os acidentes com os aviões da Gol e da TAM) reacenderam a polêmica sobre o setor aéreo no País - um problemaço, pois há discordância até mesmo no diagnóstico da situação.

Na segunda-feira 5, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, reclamou que as duas grandes companhias, TAM e Gol, não conseguem atender todos os passageiros de forma satisfatória.

Falta conforto e, sobretudo, pontualidade. Nos últimos três anos, o volume de passageiros cresceu em média 14% ao ano, a Varig quebrou e o duopólio TAM e Gol passou a dominar 92% do mercado. A avaliação do Sindicato Nacional das Empresas Aéreas (Snea), claro, é outra. Segundo Anchieta Hélcias, diretor da entidade, a média de ocupação das empresas é de 70% e, portanto, há vagas. A média de pontualidade era de 96% e de regularidade de 94%. "Com a queda do avião da Gol, todas as mazelas começaram a aparecer. Os controladores aumentaram o espaçamento entre as decolagens de três para sete minutos. Quando chove, aeroportos como Guarulhos e Galeão param, porque não têm instrumentos que permitem aterrissagem com visibilidade zero", reclama Anchieta. "Faltam 400 controladores, infra-estrutura e um ambiente tranqüilo para investimentos privados."

Segundo Jobim, a melhor solução é estimular a concorrência. "As companhias grandes não estão dando conta. Os aeroportos estão em condições de operar, o controle aéreo também", garante. "O que está ocorrendo é que as empresas esgarçaram a malha aérea." Dessa forma, começaram a circular sugestões para a adoção de uma política de "céus abertos", ou seja, permitir que companhias estrangeiras atuem no mercado brasileiro. Ou pelo menos alterar o Código Brasileiro de Aeronáutica e aumentar a participação de empresas estrangeiras no capital de companhias aéreas brasileiras de 20% para 49%¨. "Abrir o setor para o capital estrangeiro não resolve a crise. A BRA recebeu uma injeção de US$ 180 milhões de fundos estrangeiros e, mesmo assim, fechou", afirma Efromovich, da OceanAir. "Eu sou a favor de abrir tudo para todo mundo, desde que o outro abra. Se o senhor gringo pode vir aqui abrir uma empresa aérea, eu tupiniquim brasileiro quero ir lá abrir uma empresa." O presidente do Centro de Estudos Estratégicos e de Políticas Públicas em Transporte Aéreo (Cepta) e professor da UFRJ, Respício Espírito Santo não acredita que a alternativa para a crise seja a abertura completa dos céus, mas uma quebra de barreiras para integrar a América do Sul. "Vamos aumentar a oportunidade dentro da América do Sul como os EUA e a União Européia estão fazendo."

SEM CAIXA: a BRA recebeu US$ 180 milhões dos fundos. Hoje deve US$ 100 MILHÕES

O primeiro passo para colocar a casa (ou os céus) em ordem é entender o que ocorre na malha aérea. Foi o que a economista Solange Paiva Vieira ouviu dias atrás ao visitar o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Solange está às vésperas de assumir a presidência da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Os professores e técnicos do ITA lhe falaram que só um conhecimento exato das origens e destinos dos usuários permitirá a elaboração de uma política correta para o Plano Aeroviário Nacional. Solange garantiu que o mapeamento será uma de suas primeiras providências no novo cargo. "Não há solução a curto prazo. Se a Anac, que tem todas as informações, não consegue antever que uma empresa aérea vai fechar, quais soluções a academia pode sugerir?", questiona o professor Carlos Muller, chefe da divisão de Engenharia e Infra- estrutura Aeroportuária do ITA.

"É preciso que um conjunto de pessoas se debruce sobre essa situação para entender o que ocorre." E daí apresentar soluções para encerrar de vez a longa noite em que a aviação comercial brasileira mergulhou nos últimos meses.

 

 

Jornal do Brasil
11/11/2007
Lula embarcou na BRA

O presidente Lula transpirava animação ao irromper na sede da Embraer, à frente da gorda e risonha comitiva, na tarde de 21 de agosto. Depois do longo e tenebroso apagão, o Brasil voltara a voar em céu de brigadeiro. O ministro Nelson Jobim dera um jeito nas complicações de Congonhas. Semanas antes, em rede nacional, Lula confirmara a construção do terceiro aeroporto em São Paulo. E a companheirada da Anac fora enquadrada.

Agosto nem sempre é cruel, imaginou o presidente na penúltima terça-feira do mês historicamente aziago. As coisas estavam entrando nos eixos. Prova disso era o evento que presidiria em São José dos Campos: contrato assinado, seria oficialmente anunciada a compra de 20 jatos da Embraer pela BRA.

Parida em 1999 pelos irmãos Humberto e Walter Folegatti, que antes disso taxiavam nos hangares dos agentes de viagens, a empresa alcançara a maioridade aos oito anos - e com suficiente musculatura para encarar uma transação orçada em R$ 1,4 bilhão. Ponto para a Embraer. Ponto para a BRA. E ponto para Lula.

Mais uma vez, o campeão do improviso poderia infiltrar no palavrório a expressão que tanto aflige os pessimistas, os inimigos do povo, os incapazes de celebrar as grandezas da pátria. "Nunca antes neste país se vira um negócio daquele tamanho", disse a si mesmo ao empunhar o microfone.

Primeiro festejou a competência da Embraer, capaz de construir, como constatara a comitiva, até aviões com espaço suficiente para ministros grandalhões. "Nem o Jobim e o Miguel Jorge se queixaram das poltronas", alegrou-se. Afagado o vendedor, partiu para o abraço no comprador.

"Eu tenho certeza que nos próximos anos a BRA vai colher com o lucro e o crescimento do número de clientes pela aposta certa que está fazendo de acreditar cada vez mais na aviação regional", prognosticou em linguagem de pré-primário. Um dos irmãos Folegatti sorriu.

O orador retribuiu a gentileza tratando pelo prenome o dono do sorriso: "O que eu quero dizer, meu caro amigo Humberto, é que a BRA está dando uma demonstração de que não é o coração que é brasileiro, ou a cabeça que é brasileira", arremeteu o piloto de palanque. "Ela é uma empresa que acredita no crescimento da oferta de passageiros neste país para cumprir a demanda que eles vão oferecer".

Na quarta-feira passada, menos de 100 dias depois da festança, o improviso delirante de Lula estava entre os escombros da empresa quebrada por aventureiros amigos. Os 1.100 funcionários foram sumariamente dispensados. Todos os vôos foram suspensos. A BRA deixou de existir.

E os 70 mil bilhetes já emitidos? E os passageiros aprisionados em aeroportos distantes pela amputação do vôo de volta? "Isso não é problema do governo", lavou as mãos o ministro Nelson Jobim. Muito menos problema de Lula. O presidente esteve especialmente falante nesta semana. Mas não soltou sequer uma vírgula sobre a BRA. Sempre feliz, só falou de petróleo.

 

 

Jornal do Brasil
11/11/2007
Governo quer fim do duopólio TAM e Gol
Fernando Exman

Brasília. O governo prepara medidas para acabar com o duopólio da TAM e da Gol, detentoras de 86% do mercado doméstico de aviação comercial. Capitaneada pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, a missão envolve a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e a Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda (Seae). Entusiasta do fortalecimento das empresas aéreas regionais, a ministra do Turismo, Marta Suplicy, também aderiu à iniciativa.

A idéia do governo é aumentar a concorrência no setor a fim de reduzir o preço das passagens e aumentar o número de aeroportos atendidos pelas companhias aéreas. O acordo firmado na sexta-feira com a intervenção da Anac para que a OceanAir assumisse parte da operação da BRA é um exemplo do esforço para evitar que mais fatias do mercado caiam nas mãos das duas grandes empresas.

- O duopólio de TAM e Gol é altamente prejudicial, pois há a quebra do princípio da concorrência - criticou o presidente da Associação Nacional em Defesa dos Direitos dos Passageiros do Transporte Aéreo (Andep), Claudio Candiota.

Detentora da fama de dura no trato com o setor privado, reputação surgida quando foi secretária de Previdência Complementar no governo Fernando Henrique Cardoso, a economista Solange Vieira foi escolhida por Jobim para executar a operação. Atualmente, Solange ocupa a Secretaria de Aviação Civil do Ministério da Defesa. A intenção do ministro é indicá-la para a presidência da agência reguladora, cargo vago desde a renúncia de Milton Zuanazzi. Marcelo Guaranys, outro diretor da nova Anac, também é peça-chave no plano. Ex-funcionário da Seae, Guaranys possui especialização em direito econômico. Mantém contato com representantes das pequenas empresas aéreas.

- Por enquanto, as conversas com o governo ainda não avançaram. Estamos esperando que os novos diretores da Anac assumam - disse o presidente da Associação Brasileira de Empresas de Transportes Aéreos Regionais (Abetar), Apostole Lazaro Chryssafidis. - A perpetuação da participação no mercado das companhias grandes é nítida. Se o governo não editar regras que protejam as empresas menores, a situação vai se acentuar. O governo precisa subsidiar por período determinado a criação de linhas regionais até o tráfego ser gerado.

Segundo pesquisa feita pela Anac em junho, a TAM detém 48% do mercado. Segunda maior companhia, a Gol tem 38,3%. Varig e BRA respondem, respectivamente, por 5,1% e 3,1% do transporte aéreo doméstico. Os outros 5,5% são divididos por OceanAir e demais empresas regionais. O efeito disso é a redução do número de aeroportos atendidos pelas empresas de transporte aéreo regular.

O estudo Liberalização econômica e universalização do acesso no transporte aéreo: É possível conciliar livre mercado com metas sociais e ainda evitar gargalos de infra-estrutura, de autoria de Alessandro Vinícius Marques de Oliveira, coordenador do Núcleo de Estudos de Competição e Regulação do Transporte Aéreo (Nectar) do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), demonstra que a malha aérea brasileira chegou a ser integrada por mais de 300 cidades na década de 1960. Atualmente, os 15 principais aeroportos do país concentram cerca de 70% dos vôos.

- As empresas regionais fazem ligações diretas sem passar pelos hubs (centros de distribuição de vôos), com maiores freqüências - disse o presidente da Abetar.

 

 

O Estado de São Paulo
11/11/2007
'Só não vamos ocupar o espaço da BRA se não deixarem'
Presidente da terceira maior empresa de aviação do País, Efromovich defende medidas contra o duopólio da TAM e Gol
Mariana Barbosa

O presidente da OceanAir, German Efromovich, passou os últimos dois anos atacando o “duopólio” TAM e Gol e a influência das duas na condução das políticas do setor. Mas, na gestão de Nelson Jobim no Ministério da Defesa, chegou a vez de Efromovich exercer sua influência. Boliviano naturalizado brasileiro, ele é hoje o empresário do setor aéreo com mais trânsito junto a Jobim. Em pouco mais de três meses de gestão do novo ministro, foi o único a ser recebido em audiência por ele - nem Marco Antonio Bologna (TAM) nem Constantino Junior (Gol) tiveram esse privilégio.

Na semana que passou, quando se viu diante de mais uma crise do setor - 70 mil passageiros desassistidos com a suspensão das operações da BRA -, Jobim pediu ajuda a Efromovich, que se transformou na grande aposta do governo para fazer frente ao poder de mercado de TAM e Gol. A pedido do governo, a OceanAir assumiu as operações de fretamento da BRA. Com isso, garantiu-se que os turistas que compraram pacotes da PNX, empresa do mesmo grupo da BRA, para este fim de semana, viajem tranqüilos. Efromovich recebeu a reportagem do Estado na quarta-feira, dia da paralisação da BRA, mas antes do anúncio do acordo.

Mesmo comandando negócios bem mais rentáveis no campo de exploração de petróleo e construção de estaleiros, o empresário empolga-se mesmo é conversando sobre aviação. A empresa aérea brasileira responde por menos de 4% das receitas do grupo Sinergy (US$ 3 bilhões), vai dar prejuízo este ano, mas toma 30% de seu tempo.

A OceanAir vai ocupar o espaço da BRA?

A OceanAir tem condição de absorver esses passageiros com sua própria frota. As malhas são quase iguais. Só não vou ocupar esse espaço se não deixarem. E esse ‘deixarem’ só cabe aos órgãos reguladores e autoridades. Não acredito que vamos persistir no erro depois de toda a experiência que aconteceu no nosso País nos últimos dois anos. Mas as autoridades vão se dar conta de que as companhias menores não conseguem suportar a política de cobertura ao duopólio.

Existe uma política de cobertura ao duopólio?

Existia até agora. Tenho certeza que o governo quer modificar isso aí. O caso BRA é mais um alerta para as autoridades de que é preciso se preocupar com o que o Brasil necessita e não com o que o duopólio quer.

E como modificar?

É só fazer com que o marco regulatório seja respeitado. Veja essa resolução do Conac (Conselho Nacional de Aviação Civil) com as restrições de vôos em Congonhas. Não estão respeitando, estão ignorando.

Mas a lei tem brechas, foi mal escrita.

Nos países civilizados, a Constituição tem uma folha só. Se as pessoas estão bem intencionadas, interpretam e fazem direito. Não existe inocência. Tenho certeza de que quando a nova diretoria da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) assumir, sob orientação do ministro Jobim, vai fazer com que as regras sejam respeitadas.

O governo está se deixando enganar?

Vamos dar um desconto. O ministro assumiu agora, em meio ao caos. Tenho certeza que não é do estilo do ministro Jobim se deixar enganar. Ele é um homem experiente e inteligente demais para isso.

O que fazer para combater o duopólio?

Nada. É só permitir que as menores cresçam.

Como?

Regulamentando a distribuição de slots (autorização para pousos e decolagens) em aeroportos mais concorridos. Havia uma resolução que dizia que uma aerolínea não poderia ter mais de 30% dos slots em um aeroporto, mas hoje isso não vale mais. O órgão regulador também deveria permitir que uma regional escolhesse um destino e desenvolvesse um mercado sem que chegue uma grande e ponha um vôo em cima por metade do preço.

Mas aí é reserva de mercado.

Não é reserva de mercado. O DAC, antigamente, controlava. Quando a demanda chegava em 70%-75%, ele não permitia que outra companhia entrasse. Acima disso ele abria. A lógica era: até atingir essa taxa de ocupação, a empresa que entrou primeiro vai oferecer um bom preço para atrair mercado.

Mas não é atribuição da Anac controlar oferta e demanda.

É, sim. Ela é o órgão regulador, aprova vôos. Tem obrigação de impedir o monopólio, o duopólio e a concorrência predatória. Foi o que aconteceu com a BRA. E ficamos com 70 mil pessoas que precisam voltar não sei de onde.

A BRA foi vítima de concorrência predatória?

Sem dúvida. A BRA teve os problemas dela, mas não foi falta de dinheiro. Os investidores estrangeiros botaram cento e muitos milhões na empresa. Não acho que foi só má administração. Eles tiveram os mesmos problemas que a OceanAir. Mas o grupo Sinergy é sólido. Investimos US$ 5 bilhões em aviões novos, para a OceanAir e para a Avianca. Mas uma empresa que só tem esse negócio não agüenta.

Qual o prejuízo da OceanAir com a crise aérea?

Em três anos investimos US$ 150 milhões na capitalização da empresa, para cobrir prejuízo. Fora os investimentos nela como aerolínea. A OceanAir é estratégica para o grupo por causa do Brasil, da posição geográfica e por causa da Avianca. O grupo está aqui para ficar. E vai ficar. E vai investir. Temos pulmão para isso.

Está queimando o dinheiro...

Não mais. Nos últimos dois meses, a OceanAir conseguiu se equilibrar.

Então a empresa não está sofrendo com a crise.

Está, porque não tem espaço para crescer.

Como a OceanAir pretende se transformar em uma terceira força da aviação? Pleiteando reserva de mercado?

O que queremos é isonomia. Não precisa ajudar, é só não atrapalhar. Cabe ao governo e ao regulador regular o mercado. Se alguém perguntar como, eu posso dar opinião.

Como o sr. controlaria o duopólio?

Se tem um leilão de slots, não deixe entrar quem tem mais de 40% dos slots. Leiloa entre o resto. Faça uma fiscalização eficiente para não deixar os caras manipularem os slots. Os caras juntam passageiros de um vôo no outro só para não deixar slots abertos. Não utilizam e ficam segurando slots, enganando todo mundo. É simples. É só fazer que se respeite as regras do jogo. Olha o que está acontecendo com a Varig nos vôos internacionais. Voa dez dias para um destino, dez dias para outro. Me engana que eu gosto? Tenho certeza que o ministro não vai permitir isso aí.

Mas o que está sendo feito para impedir isso?

Esperar do ministro Jobim um resultado já é uma maneira de atrapalhar o trabalho dele. Até a mídia tem de entender que pegar um pepino desses, na situação que está hoje, com militar fazendo greve, não é simples, tem de dar um tempo.

O ministro Jobim está ouvindo o sr, bastante, não? Mais do que a seus concorrentes.

Não é verdade, é fofoca. Estive duas vezes com ministro, uma vez em um evento e depois em uma audiência, em Brasília. E tive a melhor das impressões.

A OceanAir tem fôlego para brigar com as grandes?

Estamos investindo US$ 2 bilhões em aviões. São 30 A320, com entrega prevista entre 2008 e 2012. Devemos chegar a 7% ou 8% até o fim de 2008. E a intenção é alcançar de 15% a17% do mercado até 2010.

Quanto a OceanAir representa para o grupo Sinergy?

Nada. Em rentabilidade, é negativo. Em receita, 4%.

Quais os planos de investimento do grupo para o próximo ano?

Vamos investir US$ 1,5 bilhão. Isso inclui parte da encomenda dos aviões. Vamos construir um terceiro estaleiro, de US$ 500 milhões, no Espírito Santo. Estamos investindo em agroindústria, um projeto de biodiesel, mas não posso divulgar detalhes ainda.

 

 

O Estado de São Paulo
11/11/2007
Quem é: German Efromovich

É empresário naturalizado brasileiro, nascido na Bolívia e no Brasil desde os 13 anos de idade

Entre muitos outros empregos, vendeu enciclopédias e fundos de investimentos e foi dublador de filmes

Hoje, é proprietário de linhas aéreas, empresas de petróleo, construção de estaleiros e agroindústria.

 

 

O Estado de São Paulo
11/11/2007
Denise pede à PF que investigue dossiê

A ex-diretora da Anac Denise Abreu pediu anteontem à Polícia Federal que investigue um dossiê contendo denúncias contra ela. Os documentos chegaram pelo correio, na semana passada, à casa dela. No dossiê, estão dados sobre contas no Uruguai e movimentações bancárias e de cartões de crédito, que poderiam sugerir evasão de divisas. A assessoria da ex-diretora afirma que as informações são falsas e que Denise nunca teve contas no exterior.

 

 

O Estado de São Paulo
11/11/2007
Cena de aeroporto em 2014
Ugo Giorgetti

Estamos em 2014.

O senhor Hans Reutberger- Sieblinsky está parado no meio do aeroporto de Guarulhos, perplexo. Ele é o chefe da delegação de um pequeno, porém tradicionalíssimo, país europeu, que tinha, no último minuto, obtido classificação para a Copa no Brasil. Depois de 13 horas de vôo e esperar por um tempo a seu ver intolerável para sair da alfândega com as malas e material esportivo, o senhor Sieblinsky estava realmente confuso. Olhava para o monte de passagens aéreas em suas mãos com o nome da empresa brasileira que faria a conexão de seu vôo com Belo Horizonte.

Certamente herr Sieblinsky estava entendendo mal o que lhe diziam. Afinal seu inglês não era grande coisa. O do seu interlocutor brasileiro, infelizmente, não era melhor. O fato é que tinha conseguido entender que a companhia aérea na qual sua delegação deveria embarcar tinha encerrado as atividades. Fechado. Closed down. Kaput. Como seria possível uma coisa dessas?! Ontem mesmo tinha falado com a companhia! Ela não só existia como confirmou o vôo!

Mas realmente não havia ninguém atrás do balcão da empresa. Nobody. Personne. Procurou imediatamente entrar em contato com o embaixador de seu país no Brasil. Uma gravação em português respondeu: “Esse número não existe.”

Depois de ouvir com toda a atenção por três vezes a mesma mensagem, resolveu ligar para o cônsul, em São Paulo. Ao receber uma resposta em sua língua nativa, quase foi às lágrimas de alegria. Mas apenas por um momento. Logo depois o cônsul em pessoa o informou que sim, não só era possível empresas de aviação no Brasil quebrarem da noite para o dia, como a sua realmente quebrara. Olhando desnorteado para as inúteis passagens o sr. Sieblinsky arriscou: “Bem, podemos ir de trem.” Julgou ouvir uma risada abafada do outro lado e soube que no Brasil há muito tempo não há trens. Pelo menos o que um europeu considera trem.

Já apreensivo, ao ver seus jogadores e a Comissão Técnica se amontoando no chão do aeroporto lotado, o homem teve forças para dizer: “Ônibus, então?” Ônibus, muito bem, vamos verificar. Horas depois, o cônsul ligou de volta, e para surpresa do sr. Sieblinsky, com voz natural, de quem está no Brasil há vários anos, declarou: ônibus também não dá. Haverá grande reunião de evangélicos em BH, onde são esperados 5 milhões de fiéis. Não há passagens.

Pelo som que o pobre sr. Sieblinsky emitiu pelo telefone, o cônsul percebeu que sua presença era requerida no aeroporto. Antes, porém, resolveu avisar: não tinha a menor idéia de quando ia chegar em Guarulhos, porque ameaçava chover e a Marginal ia virar um inferno. Além disso, o mecânico que tinha prometido entregar o carro do consulado “o mais tardar lá pelo meio-dia” não estava respondendo aos insistentes telefonemas. Ao desligar, uma coisa continuou intrigando o cônsul: por que herr Sieblinsky tinha reservado vôo para Belo Horizonte? Será que ele não sabia que a sede dos jogos do seu país tinha sido transferida, no último instante, para Goiás? Ninguém avisou? No fim o cônsul mandou chamar um táxi especial e saiu rumo à Marginal, soltando palavrões em sua língua nativa.

Na mesma noite foi ouvido o seguinte diálogo entre dois garis do aeroporto:

-Você viu o gringo que pirou no meio do saguão?

- Que time que era?

- Sei lá, Itália, eu acho.

BRAZIL!! ZIL ZIL!!

 

 

Folha de São Paulo
11/11/2007
Passageiros da BRA embarcam em outras aéreas
DA REPORTAGEM LOCAL

Os passageiros da BRA não enfrentaram tantos problemas ao embarcar por outras companhias ontem, apesar da falta de informações no aeroporto de Cumbica (São Paulo).

Onze vôos fretados da companhia foram operados pela Ocean Air, que fechou acordo com a BRA para operar outras 19 saídas previstas para ontem nos aeroportos de Cumbica e de Brasília.

Na terça, a BRA pediu o cancelamento de todos os seus vôos à Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) e anunciou aviso prévio para 1.100 funcionários.

Desde então, os passageiros são realocados nas aeronaves da TAM, Gol, Varig, WebJet e OceanAir, que se comprometeram a endossar as passagens emitidas pela BRA.

 

 

O Dia
10/11/2007 11:13:00
Presidente da OceanAir diz que não comprará a BRA

Rio - O presidente da OceanAir, German Efromovich, afirmou ao Jornal da Globo, que, pelo menos por enquanto, não existem planos de compra da BRA. A empresa anunciou, na tarde desta sexta-feira, que irá operar parte da frota e assumir todas as rotas da companhia que interrompeu as atividades esta semana.

Efromovich disse à reportagem que "neste momento, não está sendo ventilado mesmo porque nós já temos uma empresa aérea no país, mas não é uma possibilidade descartada visto que no mundo dos negócios tudo acontece duma maneira bastante dinâmica. Mas neste momento a resposta é não."

A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) informou nesta sexta-feira em nota que a OceanAir já se responsabilizará pelo transporte de passageiros de pacotes turísticos da BRA neste fim de semana.

Na próxima semana, serão acertados os detalhes de um acordo temporário de cooperação entre as duas companhias, provavelmente com duração de três meses.

Questionado se o entendimento poderia se encaminhar para um acordo definitivo, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, afirmou que essa é uma questão que cabe às empresas decidir.

"Por ora, o que importa é que vai-se resolver o problema dos 50 mil clientes. Espero que, depois, se torne definitivo", afirmou Jobim a jornalistas.

"Ou a BRA consegue superar a situação, ou há uma negociação da BRA com a OceanAir para uma incorporação. São especulações para o futuro", acrescentou.

O brigadeiro Allemander Pereira, diretor da Anac, informou que o acordo temporário valerá "provavelmente por 90 dias".

A companhia BRA Transportes Aéreos, que enfrenta crise financeira, anunciou na terça-feira a suspensão temporária de todos os seus vôos e a demissão dos 1,1 mil funcionários.

A BRA fazia, em média, 315 vôos por mês para 26 destinos nacionais e três internacionais. Segundo dados da Anac de setembro, a BRA tinha 4,6% do mercado doméstico, à frente da OceanAir, com 2,6%.
Com informações do Terra