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da Folha
08/03/2007
Manobra do governo adia a instalação
da CPI Aérea
O governo valeu-se de uma manobra regimental para barrar
a instalação da CPI do Apagão Aéreo.
Como previsto, o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia
(PT-SP), anunciou a decisão de inaugurar a CPI. Teleguiado
pelo Planalto, o líder do PT, Luiz Sérgio
(RJ), recorreu contra a decisão. Seguiu-se um motim
da oposição. A coisa só serenou depois
de uma guerra de discursos que durou cerca de três
horas.
A pedido de Chinaglia, os líderes
partidários reuniram-se para negociar um acordo.
Como não chegaram a um consenso, decidiram se autoconceder
um prazo até amanhã (8). De volta ao plenário,
os líderes de todos os partidos declararam-se "em
obstrução". O que levou à interrupção
da sessão, por falta de quem se dispusesse a votar.
Em reuniões que entraram pela noite, governo e oposição
tentariam chegar a um entendimento.
A confusão começou quando
Chinaglia informou aos deputados que decidira instalar a
CPI. O líder do PT recorreu imediatamente da decisão.
Argumentou: 1) o requerimento da CPI, de autoria do PSDB,
não especifica o fato a ser investigado, como exige
a Constituição. O termo “apagão
aéreo” seria genérico demais; 2) os
autores do pedido esqueceram de mencionar o prazo de funcionamento
da CPI.
Chinaglia rejeitou os argumentos. Disse
que há, sim, um fato determinado a investigar. Quanto
ao prazo de duração da CPI, disse que está
previsto no regimento da Câmara: 120 dias, prorrogáveis
por mais 60. De novo, o líder do PT recorreu, exigindo
que as dúvidas fossem submetidas à CCJ (Comissão
de Constituição e Justiça). E Chinaglia
decidiu que caberia ao plenário decidir se o requerimento
da CPI iria ou nao para a CCJ.
Se houvesse a concordância da maioria
dos deputados presentes, a instalação da CPI
seria suspensa. A CCJ teria um prazo de três sessões
legislativas para se pronunciar. Depois, o assunto retornaria
ao plenário, para deliberação final.
Estava claro que os partidos governistas tinham maioria
tanto para enviar o tema à comissão de Justiça
como para esmagar o pedido de CPI quando a encrenca voltasse
ao plenário.
A oposição estrilou. Antevendo
o cheiro de derrota, os líderes pró-CPI anunciaram,
de antemão, que recorreriam ao STF. Disseram que,
a prevalecer a chicana legislativa do PT, nenhuma CPI seria
instalada no Congresso. O governismo, em maioria, passaria
a patrola por sobre todo e qualquer pedido de CPI. Lembrou-se
a Chinaglia o caso da CPI dos Bingos, instalada no Senado
em 2005. José Sarney (PMDB-AP), à época
em que era presidente do Senado, arquivara, em decisão
judicial, o requerimento da CPI. A minoria foi ao STF. E
o tribunal obrigou a Mesa do Senado a desengavetar a comissão,
instalando-a.
Em meio ao sururu, os deputados Fernando
Gabeira (PV-RJ) e Miro Teixeira (PDT-RJ) pregaram o entendimento.
Ambos argumentaram que o governo não tem motivos
para temer a CPI Aérea. A investigação,
disseram os deputados, não visa atingir o governo.
Antes, objetiva ajudar a identficar os problemas e encaminhar
possíveis soluções. Diferentemente
de outras CPIs, esta teria um caráter administrativo,
não policialesco.
Miro deu um passo além: sugeriu
que se tentasse reescrever o requerimento de convocação
da CPI, de modo a deixar ainda mais claro que o alvo é
administrativo. Agarrando-se à sugestão, Chinaglia
arrastou os líderes para sua sala. Ali, decidiu-se
dar uma chance para a negociação. Na manhã
desta quinta-feira (8), vai-se verificar se o bom-senso
prevaleceu sobre a chicana governista.
CORREIO
BRAZILIENSE
04/03/07
Aposentadorias VOADORAS
Fundo de pensão
dos trabalhadores da Varig e da Transbrasil só tem
dinheiro até abril.
Oito mil pessoas que contribuíram, pensando em ter
uma velhice mais tranqüila, ficarão sem nada
MARIANA MAZZA DA EQUIPE DO CORREIO
Milhares de idosos em todo o Brasil estão
dando adeus às suas aposentadorias por conta de uma
intrincada sucessão de atos da Varig e do governo
que dilapidaram um dos maiores fundos de previdência
privada do país, o Aerus. À míngua,
depois de anos sem a realização dos depósitos
previstos em lei pelos patrocinadores, o fundo de pensão
dos funcionários da Varig e da Transbrasil só
tem dinheiro para pagar as aposentadorias até abril
e, ainda assim, de forma parcial. Depois disso, o destino
dos mais de 8 mil beneficiários é absolutamente
incerto. “A visão que temos atualmente é
que o governo está esperando os aposentados morrerem”,
desabafa Ivan Martins, 65, e que hoje recebe apenas 45%
dos benefícios previstos após 38 anos de trabalho
ininterrupto na Varig.
Mesmo com o corte nos vencimentos, Martins,
que mora no Paraná, se considera um sortudo perto
dos seus colegas: com a saúde em dia, o aposentado,
que entrou para a aviação aos 15 anos, ainda
é capaz de administrar a redução dos
vencimentos mensais. Muitos de seus companheiros de Aerus
têm vivido em situação dramática,
por terem doenças que demandam cuidados periódicos.
Martins conta que, sem dinheiro para pagar por uma plano
de saúde privado, vários aposentados da antiga
Varig têm tido dificuldade para seguir com seus tratamentos.
Mas como o fundo de pensão de uma
empresa famosa como a Varig conseguiu chegar a tal ponto
de decadência? Para entender essa história,
que atualmente está em análise no Supremo
Tribunal Federal (STF) é preciso voltar alguns anos
no tempo, bem antes da crise financeira daquela que já
foi a maior companhia aérea do país. Criado
em 20 de outubro de 1982, o Aerus tinha como objetivo garantir
uma aposentadoria complementar para os funcionários
das companhias aéreas Varig e Transbrasil. Um moderno
sistema de capitalização foi implantado para
reunir os recursos que se transformariam em pensões
e aposentadorias.
Diferença
Basicamente, o sistema funcionava com um pagamento por parte
dos trabalhadores e outro por parte da patrocinadora, no
caso, Varig e Transbrasil. Para preencher a diferença
na contribuição dos funcionários que
estavam na ativa quando o Aerus foi criado, implantaram
uma “terceira fonte” de recursos, paga pelos
passageiros das companhias aéreas. A terceira fonte
vinha de um sobrepreço de 3% nas passagens vendidas
pelas empresas. Com essa fórmula, o Aerus se fortaleceu,
investiu em hotéis, comprou ações de
bancos importantes como o Bradesco e o Unibanco, investiu
em empresas proeminentes como a Vivo, Petrobras, Gerdau
e Usiminas, sem contar os inúmeros imóveis
que dispunha, entre eles o Centro Empresarial Varig, em
Brasília. Mas o destino do primeiro fundo de previdência
de uma empresa privada no Brasil começou a mudar
em 1991.
Nesse ano, as patrocinadoras foram liberadas
pelo hoje extinto Departamento de Aviação
Civil (DAC) do depósito da terceira fonte. “Foi
uma decisão absurda tomada por um órgão
que não tinha competência para isso”,
afirma o advogado Luís Antônio Castagna Maia,
responsável pela ação dos aposentados
do Aerus. Porém, não só o verdadeiro
órgão responsável — a Secretaria
de Previdência Complementar (SPC) — não
reverteu a decisão como teria referendado a liberação
do depósito. Era o início das confusões
com o dinheiro do Aerus.
Nos 15 anos que se seguiram até
a intervenção da SPC no Aerus, uma série
de irregularidades teriam sido praticadas pela Varig com
o aval da secretaria que deveria fiscalizar o fundo. Segundo
documentos levantados por Castagna Maia e incluídos
no processo, a equipe da SPC autorizou sucessivos adiamentos
nos aportes obrigatórios das patrocinadoras no fundo.
Pelos cálculos do advogado, foram feitas 21 renegociações
de dívidas da Varig e oito da Transbrasil, todas
prorrogando o prazo para pagamento das cotas, muitas vezes
por anos. Os efeitos dessa quase isenção dos
depósitos só foram vistos claramente em abril
de 2006, quando a SPC iniciou oficialmente a liquidação
do Aerus por conta da crise financeira da Varig.
Caixa vazio
Quando o fundo começou a ser liquidado, no dia 12
de abril de 2006, as reservas estavam contabilizadas em
R$ 756,960 milhões, segundo informações
prestadas pelo interventor Emo Dionizio Brentano ao Sindicato
Nacional dos Aeronautas (SNA). Mas este total não
é o valor efetivo do dinheiro disponível para
o pagamento das aposentadorias. Por ter uma parte considerável
das reservas aplicadas em imóveis e outros investimentos,
somente R$ 326,968 milhões estavam efetivamente disponíveis
para cobrir os benefícios. É o que se chama
de liquidez do fundo de pensão, ou seja, a capacidade
de resgatar esses recursos para serem usados no pagamento
das pensões e aposentadorias.
Esse valor foi rateado entre as 8 mil pessoas
ligadas ao Aerus e o resultado foi assustador: o dinheiro
só dava para pagar os aposentados somente por um
ano e ainda assim com cortes que variam de 80% a 55% do
benefício previsto inicialmente. Essa margem de pagamento
termina no dia 12 de abril. E, depois disso, restará
esperar para que a Justiça autorize uma indenização
por parte da União pelas decisões da SPC que
lesaram o fundo.
Os aposentados tentam responsabilizar judicialmente
a União por ter sido omissa em seu papel fiscalizador
e ter colaborado com a delapidação do Aerus
ao renegociar os contratos. A SPC, por sua vez, alega que
toda a responsabilidade pelo caixa é das empresas
Varig e Transbrasil. “A SPC não foi omissa
com relação ao Aerus”, alega a secretaria.
“Nenhuma ação da SPC teria resolvido
o problema básico do Aerus, que é a falta
de pagamento de contribuições pelas empresas
privadas que patrocinavam os planos de benefícios”,
completa. O debate sobre a responsabilidade da União
no caso está nas mãos da presidente do STF,
ministra Ellen Gracie, e o julgamento poderia pôr
um fim ao sofrimento dos funcionários da Varig.
O aposentado Sílvio Emiliano de
Godoy, 73 anos, é um dos tantos que precisam do dinheiro
para sobreviver. Cardíaco, o carioca Godoy foi submetido
a uma cirurgia para colocar seis pontes-de-safena há
dois anos e acabou tendo um Acidente Vascular Cerebral (AVC)
que deixou fortes seqüelas. A filha está preocupada
com a proximidade do fim dos pagamentos, hoje em R$ 2 mil
mensais aproximadamente. “A gente continua com esperança
de que a Justiça decida a favor, mas não adianta
vir o dinheiro quando eles (aposentados) não estiverem
mais aqui. Não sei quanto tempo agüentamos assim.
Eu não posso ficar vendo meu pai morrer sem remédios
porque não recebeu um dinheiro a que ele tinha direito
depois de contribuir por toda a vida”, afirma Rogéria
de Lima, que hoje está desempregada.
“NÃO SEI QUANTO TEMPO
AGÜENTAMOS ASSIM. EU
NÃO POSSO FICAR VENDO
MEU PAI MORRER SEM
REMÉDIOS PORQUE NÃO
RECEBEU UM DINHEIRO A
QUE ELE TINHA DIREITO
Rogéria de Lima, filha do
aposentado Sílvio de Godoy”
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