O
Globo
07/01/2006
O Dia
06/01/2007 - 23:15h
Calote nos planos de vida
Beneficiários do fundo
de pensão da Varig se preparam para o fim dos pagamentos,
em março
Rodrigo Nery
Rio - É de traição
a sensação do comandante aposentado Zoroastro
Ferreira Lima Filho, 75 anos, ao ler novamente o comunicado
nº 30 emitido pelo interventor nomeado pela Secretaria
de Previdência Complementar para beneficiários
do Aerus — fundo de previdência privada de funcionários
da Varig e da Transbrasil.
A circular informando que o pagamento a
aposentados e pensionistas só irá até
março é, até agora, o fim da linha
de uma história que começou há 58 anos,
quando ele ingressou na aviação. "Trabalhei
por 37 anos, tinha muito orgulho. Contribuía com
3% do meu salário e fiz parte da primeira turma de
aposentados pelo fundo, no plano 1, em 1986. Tudo isso para,
agora, não ter direito a um dinheiro que é
meu", revolta-se.
Desde a intervenção no Aerus,
em abril de 2006, a pensão de R$ 6.300 de Zoroastro
caiu à metade, o que o obrigou a cancelar o plano
de saúde, que custava mais de R$ 900. "O pior
é que sofro de diabetes, hipertensão e de
problemas cardíacos. Gasto de R$ 400 a R$ 500 por
mês em remédios. Tive que vender meu carro
e um imóvel. A partir de março, só
terei a pensão do INSS, de R$ 1.500", conta.
Assim como Zoroastro,mais de 8 mil aposentados
e pensionistas do Aerus contam os dias até março.
O navegador aéreo e piloto aposentado José
Herênio de Souza, 79, também recebe apenas
metade dos R$ 5 mil a que teria direito após aposentar-se,
em 1986.
José também teve de cancelar
seu plano de saúde de R$ 1.084, embora, por ter uma
ponte de safena, precise tomar até oito comprimidos
por dia. "Cada caixa com 20 comprimidos custa mais
de R$ 100. Tenho problema sério de coluna. Se andar
15 minutos, sou obrigado a parar para sentar, nem que seja
no meio-fio", afirma.
José teme ser obrigado a vender
o apartamento onde mora. "Temos uma filha que é
médica e disse que vai nos ajudar. Mas é triste,
depois de atravessar noites inteiras no ar, transportando
correspondências, bens e passageiros, e abrir novas
rotas para a Varig, acabar dependente dos outros",
desabafa.
Um dos casos mais dramáticos é
o de Jussiara dos Santos Martins, 67 anos, viúva
do mecânico da Varig Antônio Martins, que morreu
em 15 de agosto de 2006, de insuficiência renal. Até
hoje, ela não recebeu a pensão de R$ 1.300
a que teria direito.
Segundo a filha, Iara dos Santos Martins,
33 — desempregada —, Jussiara sofre de problemas
de audição e visão, mas não
tem como agendar tratamento ou conseguir diagnóstico.
"Ela recebe apenas R$ 1 mil do INSS. Meu pai trabalhou
na Varig por 38 anos, era do 1º plano. Ele ficou internado
no Hospital do Fundão por 15 dias antes de morrer
e, neste período, o Aerus interrompeu o pagamento",
conta.
AÉREA DEIXOU ROMBO DE R$ 2,5 BILHÕES
O Aerus foi criado em 1982, para funcionários
da Varig e da Transbrasil, e a primeira turma de aposentados
passou a receber o benefício em 1986, pelo plano
1. Em 1995, foi criado o plano 2, que recorreu a recursos
do fundo mais antigo. O Aerus era financiado pelos participantes
(funcionários) e patrocinadores (companhias aéreas).
A Varig, no entanto, deixou de contribuir durante anos,
totalizando rombo de R$ 2,5 bilhões. A companhia
chegou a fazer 21 repactuações da dívida,
sem nunca honrá-la.
No dia 12 de abril de 2006, a Secretaria
de Previdência Complementar (SPC) do Ministério
da Previdência Social decretou a intervenção
no Aerus e a liquidação extrajudicial dos
planos de benefícios 1 e 2, patrocinados pela Varig,
devido ao desequilíbrio contábil apresentado
pelo fundo. O interventor Erno Dionizio Brentano foi procurado
por O DIA, mas não retornou as ligações.
Também em 2006, o Sindicato dos
Aeronautas recorreu à Justiça para que a União
pagasse os benefícios devidos pelo Aerus. A Advocacia
Geral da União (AGU) recorreu e aguarda o fim do
recesso para que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgue
a ação.
Ao contrário do fundo da Varig,
os planos ganham em eficiência e oferecem mais segurança
A incerteza que tira o sono de beneficiários do fundo
de pensão Aerus, que agora agoniza, vai na contramão
do mercado de previdência complementar, comemorando
recorde de captações em 2006, com boa rentabilidade
aos participantes e ampliação das carteiras.
Enquanto uns vêem desmoronar o futuro
construído ao longo de anos de contribuição,
por má-gestão do patrocinador, jovens trabalhadores
despertam para a necessidade de aplicar em uma poupança
e garantir complementação de ganhos ao pendurar
as chuteiras.
O mercado cresce, principalmente, no sentido
da previdência aberta, com planos oferecidos por bancos
e seguradoras a trabalhadores da iniciativa privada. Nesse
caso, regulamentação e fiscalização
do setor ficam a cargo da Susep (Superintendência
de Seguros Privados).
Aos participantes — que já
somam 7,7 milhões de pessoas — é garantida
a portabilidade, ou seja, a possibilidade de migrar seu
investimento para outra instituição.
"O participante procura prestação
de bom serviço e taxa de rentabilidade mais atraente",
explicou Luis Eduardo Torres, presidente da Comissão
de Tecnologia da Anapp (Associação Nacional
de Previdência Privada). E o processo de portabilidade,
que antes levava, em média, 32 dias, hoje dura oito.
A mudança tornou-se mais simples com a criação
do Side (Sistema de Intercâmbio de Documentos Eletrônicos),
que permite a troca de informações entre a
empresa que vai ceder e a que vai receber o crédito.
"Criamos um processo eletrônico
com 10 empresas conectadas. Hoje já são 18,
que respondem por 97% do volume comercializado. De abril
a dezembro de 2006, fizemos a portabilidade de 24.800 processos,
movimentando R$ 469 milhões. A média individual
é de R$ 36 mil", disse Luis Eduardo.
PREVIDÊNCIA FECHADA — São
os fundos de pensão. O patrimônio total atingiu
R$ 375 bilhões em 2006 (crescimento de 27% em relação
a 2005). A rentabilidade média ficou em 22,8%. Todos
os meses, os fundos pagam R$ 1,3 bilhão em aposentadorias
e pensões. Os benefícios vão para 617.700
pessoas, mas o total de participantes é superior
a 2,5 milhões.
PREVIDÊNCIA ABERTA — São
os planos oferecidos por bancos e seguradoras. De janeiro
a outubro de 2006, a captação chegou a R$
17,3 bilhões (crescimento de 21,59% em relação
ao mesmo período de 2005). O VGBL (ideal para quem
não tem renda tributável, pois não
é dedutível do Imposto de Renda) foi líder
na captação de novos recursos até outubro,
com ingresso de R$ 11,407 bilhões (65,9% da captação
e crescimento de 41%). Havia 7.755.017 planos individuais
no País, com 197.081 beneficiários, além
de 156.252 inscritos em planos corporativos.
INVERTIA AÉREAS
Sábado, 6 de Janeiro de 2007, 12h00
Varig tem passagens a partir de R$
79
A Varig informou que continua sua promoção
de passagens aéreas na ponte Rio - São Paulo
por R$ 79 enquanto durarem os assentos. Há também
tarifas econômicas em vôos de São Paulo
a Fortaleza (R$ 370), de São Paulo a Brasília
(R$ 159), de São Paulo a Porto Alegre (R$ 159), de
São Paulo a Manaus (R$ 509) e do Rio a São
Paulo (R$ 119).
Há ainda uma promoção
de passagens para Fernando de Noronha. Os vôos ida
e volta saindo de São Paulo (Guarulhos) são
vendidos por R$ 1.040,00 até 31 de janeiro.
A aérea informa que há vôos
promocionais de São Paulo a Porto Seguro (R$ 215
o trecho), São Paulo a Belo Horizonte (R$ 150 o trecho),
São Paulo a Florianópolis (R$ 159 o trecho),
São Paulo a Salvador (R$ 199 o trecho), São
Paulo - Rio - Recife (R$ 365 o trecho) e Rio a Recife (R$
259).
Para os clientes Smiles, a aérea
oferece a promoção para o verão. Ao
voar em uma das rotas escolhidas, o passageiro ganha milhas
em dobro, entre o período de 18 de dezembro e 18
de janeiro.
As milhas adquiridas também podem
ser utilizadas para vôos pelas empresas aéreas
Air Canada (para viagens à América do Norte)
e Pluna (para Montevidéo, capital do Uruguai). Mais
informações podem ser obtidas no site www.varig.com.br.
Jornal de Turismo
(05/01/2007)
Colapso da TAM - Uma companhia aérea
sem dono é como uma aeronave sem piloto
Uma perigosa equação se
formou no coração da TAM arranhando a sua
imagem e colocando a companhia em confronto direto com a
filosofia do seu fundador, o comandante Rolim Adolfo Amaro.
Nunca, na história moderna da aviação
comercial mundial, uma empresa líder passou por um
colapso operacional similar. As atenções do
mercado e dos especialistas se voltaram para tentar entender
como uma empresa líder em seu setor, com uma frota
de quase 100 aeronaves, consegue gratuitamente, hostilizar
os seus passageiros e colapsar os seus serviços no
ponto crítico que a TAM conseguiu às vésperas
do Natal.
Os acionistas majoritários da empresa
são os herdeiros diretos do comandante Rolim. Muito
mais do que zelar pelo seu patrimônio, têm o
dever de zelar pela manutenção dos princípios
que transformaram a TAM em um sucesso comercial, igualmente
sem paralelos, na história da aviação
mundial.
O papel do proprietário deve ser
exercido e para isso a Dona Noemi Amaro e os filhos Maurício,
Maria Cláudia e Marcos foram devidamente preparados
pelo comandante Rolim ainda em vida. Um dos sinais do início
deste colapso foi a tentativa seguida de promover a profissionalizar
uma gestão sem a presença da figura do líder
ou do dono. Reeditou-se o mesmo erro da Varig, que por anos
foi uma empresa à deriva, sem a presença do
rosto do proprietário.
A TAM foi construída tendo como
base a competência, o tino comercial e, principalmente,
o carisma do comandante Rolim. Ele era, sobretudo, um exemplo
para os empregados e fazia isso com uma primazia nata, sem
carregar em doses teatrais. Era natural o seu ímpeto
de pegar um papel no chão, de cumprimentar um passageiro
na porta do avião em plena alvorada. Se as suas largas
risadas ainda ecoavam, o mesmo poderia se dizer dos seus
“pitos” e da rudeza dos seus enquadramentos
quando os mais leais colaboradores pisavam na bola. Enquadrava,
mas perdoava. Dava pelo menos uma chance. Porém,
era duro e não permitia a repetição
contumaz do erro.
Logo após o seu falecimento, a TAM
passou pela sua segunda grande crise. A primeira foi o fatídico
vôo
402 e a sórdida campanha que se urgiu tentando grudar
o selo de “companhia aérea mais insegura do
mundo”, atribuído por uma fantasiosa Air Travel
Association (ATA). Tal campanha foi implodida por um artigo
que assinei no The Brazilian Post e transcrito pelo comandante
Rolim, simultaneamente nos maiores jornais brasileiros.
Na segunda crise, que teve Daniel Mandelli à frente
da empresa, a conjuntura do mercado e as graves influências
do poder concedente foram aliviadas com ações
corajosas como o code-share com a Varig. Com isso, a empresa
fez um doloroso dever de casa.
A saída de Mandelli foi também
a perda do jeitão afetuoso e da figura do líder
da própria companhia. O atual presidente, Marco Antonio
Bologna, agora neste cargo, não chegou a ocupar este
espaço, tanto que durante toda a crise no Natal,
não houve nenhuma exposição pública
do gestor principal da empresa, sendo o fardo de falar com
a imprensa delegado ao diretor Paulo Castello Branco.
Como presidente do Sindicato Nacional das
Empresas Aéreas (Snea), Marco Antonio Bologna acabou
tendo uma posição dura no início de
dezembro contra o Governo Federal e recebeu o troco do próprio
poder concedente na proporção da acidez das
suas posições. Para a TAM foi um momento muito
infeliz, o de ter o seu executivo maior na dupla função
de presidente do Snea e da companhia. Dias depois, Bologna
teve de engolir calado a ordem presidencial de embarcar
os passageiros da empresa nos sucatões da FAB. Só
este fato é de absoluta desmoralização
pública.
Os especialistas em comunicação,
além de notar a ausência do dirigente maior,
notaram que até nos comunicados pagos em horário
nobre das televisões, faltou um ingrediente básico
à TAM e que era a marca de Rolim: a humildade. Em
nenhum momento a palavra DESCULPA foi utilizada. Aliás,
só no fechamento desta edição um pedido
de desculpas finalmente apareceu numa mensagem do presidente
no site da companhia. Antes tarde do que nunca... No entanto,
já estava cristalizada a soberba, que não
faz parte do DNA da família fundadora da empresa.
Durante a crise da Varig, o mercado já havia identificado
uma arrogância da TAM, materializada no aumento dos
preços das passagens e no endurecimento das negociações
sobre comissionamento com os agentes de viagens.
O afastamento da equipe de dirigentes escolhidos
pelo próprio fundador e o afastamento gradual dos
amigos e pessoas que contribuíram historicamente
para o crescimento da empresa e até o visível
esvaziamento das funções de Wagner Ferreira,
vice-presidente comercial, - que foi milagrosamente preservado
da crise natalina por estar fora do país (Wagner
sempre foi um guardião dos princípios da família
Amaro dentro da empresa), contribuíram para o desequilibro
e o colapso que a TAM passou. Não houve interna e
externamente uma rede de solidariedade em torno da companhia.
A TAM ficou sozinha por conta do nariz em pé dos
seus executivos.
Para o bem do país, a TAM tem que
voltar a ser a TAM do comandante Rolim. Tem que fazer valer
a sua filosofia empresarial. Tem que ter a humildade de
pedir publicamente desculpas à nação,
ao poder concedente, à cadeia produtiva do turismo
e principalmente ao passageiro. O célebre tapete
vermelho deve voltar a ser um referencial de reverência
ao usuário e perder a coloração de
“vermelho da vergonha” que passou a ter nos
últimos dias. Cabe aos acionistas majoritários
reestabelecer as bases que fizeram da TAM a empresa que
foi a razão de viver do comandante Rolim Adolfo Amaro.
Cláudio Magnavita
é presidente da Associação Brasileira
de Jornalistas de Turismo (Abrajet), membro do Conselho
Nacional de Turismo e diretor do Jornal de Turismo.
|