|
O
Estado de São Paulo
04/10/2006
Legacy enganou
controle aéreo e ignorou alertas pelo rádio
Transponder
do jato fabricado pela Embraer voltou a funcionar após
choque com Boeing
Aeronáutica quer saber por que depois da colisão
o piloto retomou uso do rádio
Suspeita de crime coloca Polícia Federal no caso
Pilotos tiveram passaportes apreendidos
Caixa-preta do avião da Gol será enviada ao
Canada
Marcelo
Godoy, Tânia Monteiro
Os peritos da Aeronáutica
não têm dúvidas de que o jato Legacy
enganou os controladores de vôo do Cindacta 1, em
Brasília, e provocou a maior tragédia da aviação
civil do País: a queda de um Boeing da Gol, na sexta-feira,
que matou 155 pessoas. Todas as informações
da Aeronáutica mostram que os pilotos americanos
do Legacy voaram com o transponder desligado - aparelho
que identifica o avião no radar e integra o sistema
de alerta anticolisão -, impedindo que os controladores
de vôo vissem os dois aviões na mesma rota
e evitassem a colisão.
Mais grave e misterioso: a Aeronáutica quer saber
por que o piloto do jato não atendeu aos inúmeros
chamados que a torre do Cindacta 1 fez até o momento
do choque. Quer saber também como, após a
colisão, não só o transponder voltou
a funcionar como o piloto passou a chamar a torre, narrando
o choque com um objeto não identificado pelo mesmo
rádio que não havia atendido até então.
'Muito provavelmente, ele havia diminuído o volume
do rádio. Ele (o avião) começou a ser
chamado pela torre de Brasília e não respondia.
A resposta veio, como por milagre, após o impacto',
disse um oficial.
A Aeronáutica fez uma reconstituição
dos vôos das duas aeronaves envolvidas na colisão
para verificar possíveis falha de cobertura dos radares
ou na comunicação das torres de controle.
Não detectou nada de errado. Depoimentos colhidos
revelam ainda que o transponder do Legacy estava ligado
quando o jato levantou vôo em São José
dos Campos (SP) rumo a Manaus. Assim, as investigações
encaminham para o enquadramento do piloto do Legacy, Joe
Lepore, e do co-piloto, Jan Paul Palladino, por homicídio
culposo, caso fique provado que agiram com imprudência.
Segundo os peritos, sem o transponder do Legacy ligado,
o sistema anticolisão do Boeing não tinha
como registrar a aproximação do jato. Nem
os operadores de vôo tinham como verificar a posição
exata da aeronave. O radar indicava que o Legacy estava
a 36 mil pés de altitude (10.972 metros), daí
porque, apesar de o jato não responder aos chamados
da torre, os operadores não decidiram desviar o Boeing,
que vinha a 37 mil pés (11.277 m). A localização
do jato estava distorcida por causa do transponder desligado.
Para entender por que isso ocorreu é preciso saber
como os aviões são controlados pelos radares.
Há a detecção primária. Por
meio dela, qualquer objeto voador é acusado pelo
radar. Quando mais distante do radar, maior a distorção
na localização da aeronave. O Cindacta-1 de
Brasília controlava o Legacy, que sobrevoava a divisa
entre Mato Grosso e Pará.
Existe ainda o sistema secundário de radar. É
ele que se comunica com o transponder para receber a posição
exata e a altimetria do avião. Sem que o sistema
esteja ligado, o avião não deixa de aparecer
para a torre. Mas a identificação some e a
localização perde exatidão.
Os registros dos radares mostram que o transponder do Legacy
foi desligado pouco antes da colisão. E religado
depois, antes do pouso na Base Aérea do Cachimbo
(PA). Também mostram que o Legacy, enquanto ainda
estava sendo monitorado pelo radar secundário, voava
a 37 mil pés, mesmo depois de passar por Brasília.
Ao decolar de São José, o jato recebeu o plano
de vôo, assinado pelo piloto, que indicava que devia
viajar a 37 mil pés passando pelo eixo São
Paulo-Brasília e, então, descer para 36 mil
pés.
Isso é obrigatório por causa da mudança
de proa - sentido da aeronave - ao entrar no trecho Brasília-Manaus.
Na rota Manaus-Brasília, a altitude de 37 mil pés
é o espaço usado pelos aviões que vêm
no sentido contrário, como o Boeing.
A Aeronáutica quer saber o que desligou o transponder.
Pode ter sido decisão do piloto ou pane, o que é
pouco provável. O equipamento tem cinco posições:
desligado, stand by e os módulos A,B e C. Só
neste último o transponder envia ao controle de vôo
os dados de altimetria. Suspeita-se que o piloto o desligou
para fazer manobras não-autorizadas com o jato recém-adquirido
pela empresa de táxi aéreo ExcelAire ou ganhar
altitude e velocidade a fim de economizar combustível.
COMUNICAÇÃO
Outro fator que pode ter contribuído para o acidente
é uma improvável falha de comunicação.
A regra é cumprir o plano de vôo. Para alterá-lo,
é preciso pedir autorização. Assim,
a torre entendia que o Legacy não ia descumpri-lo.
Ele estaria em sua aerovia e não havia por que avisar
ao Boeing sobre a existência de alguém em sua
rota.
Só depois que percebeu o transponder do Legacy desligado
é que o controle tentou contato com o jato, para
pedir que ele religasse o aparelho. Ao depor, Lepore teria
dito que estava fora da cabine do avião.
Técnicos da Aeronáutica rejeitaram suposições
de haver um ponto cego no monitoramento de tráfego.
Na fita do controle do tráfego aéreo pode
ser visto outro avião, da TAM, na mesma rota. Há
anomalias na comunicação por rádio
na área do acidente, mas insuficientes para impedir
o contato do Cindacta com as aeronaves.
O
ESTADO DE S.PAULO
04/10/2006
Comandante pode não ter habilitação
para Legacy
Adriana Carranca
A
empresa de táxi aéreo ExcelAire informou ontem
que os funcionários Joseph Lepore e Jan Paul Paladino,
que comandavam o Legacy quando o avião colidiu com
o Boeing da Gol,matando 155 pessoas na sexta-feira, têm
licença de pilotos de vôos comerciais e ambos
estão habilitados para comandar aeronaves Embraer.
Nos registros da Federal Administration Agency (FAA), a
agência americana de aviação, no entanto,
não consta a habilitação de Lepore,
piloto da aeronave, para aviões da Embraer.
A
informação foi passada ao Estado pelo porta-voz
da FAA, Les Dorr. Segundo os registros, Lepore tem o chamado
type rating, tipo de habilitação exigida pelo
regulamento de aviação americano para aeronaves
Cessna e Gulfstream. Só Paladino, co-piloto do Legacy,
possui a habilitação para Embraer. Mas a legislação
americana exige tal certificação do piloto.
'Normalmente, o piloto que detém a type rating estaria
no comando da aeronave, e o outro, como co-piloto', explicou
Dorr. 'Mas não podemos especular sobre nada nesse
momento. Isso será considerado nas investigações.'
Door
informou que existe a possibilidade de o piloto ter obtido
a habilitação de Embraer 'muito recentemente',
não constando ainda no registro da FAA. O Estado
solicitou à empresa que enviasse cópia da
habilitação de Lepore, mas, até as
23 horas, não havia recebido retorno.
Os
dois, de acordo com a FAA, têm licença como
pilotos de transporte aéreo, que seria o mais alto
grau de qualificação que um piloto pode obter,
exigido para capitão de vôos. Mas, de acordo
com especialistas da Flight Safety Foundation (FSF), organização
não-governamental na área de segurança
em aviação, ainda assim, no caso do Legacy,
o piloto deve seguir o regulamento, que exige a habilitação
específica.
'Os
pilotos do Legacy são fundamentais na investigação.
Acho um erro do governo brasileiro ameaçá-los.
Pela lei americana, eles não seriam obrigados a falar
antes de terminadas as investigações', disse
o vice-presidente da FSF, Bob Vanel. A ExcelAire informou
que Lepore é piloto comercial desde 1984, com 8 mil
horas de vôo, e Palladino, desde 1996, e tem 6.400
horas de vôo.
Procurada
pelo Estado, a porta-voz da ExcelAire, Lisa Hendrickson,
não quis comentar os rumores de que os pilotos teriam
desligado o transponder, equipamento que identifica a aeronave
para os radares, ou sobre a possibilidade de a Justiça
brasileira pedir sua prisão.
Folha
de São Paulo
04/10/2006
"Foram os 30
minutos mais assustadores da minha vida"
Joe
Sharkey, repórter do "The New York Times" que estava
no jatinho que se chocou com o Boeing da Gol, conta em artigo
como foi o acidente
JOE SHARKEY
DO "NEW YORK TIMES"
ERA
UM VÔO confortável, sem sobressaltos.
Com as cortinas fechadas, eu estava relaxando em minha poltrona
de couro, a bordo de um jato executivo de US$ 25 milhões
que voava 11 quilômetros acima da vasta floresta tropical
amazônica.
As sete pessoas que ocupavam o jato com capacidade para
13 passageiros estavam repousando, sem conversas.
De repente, senti um terrível abalo e ouvi um estrondo
alto, seguido por um silêncio perturbador. Apenas
o zumbido das turbinas era audível.
E então as duas palavras que nunca vou esquecer:
"Fomos atingidos", disse Henry Yandle, um passageiro que
estava sentado na poltrona do corredor perto da cabine de
pilotagem do Embraer Legacy 600.
"Atingidos? O que nos atingiu?", eu imaginei. Ergui a cortina.
O céu estava claro, o sol começava a cair.
A floresta se estendia interminável. Mas lá,
na ponta da asa, vi os destroços, mais ou menos um
metro de metal retorcido, na posição em que
o winglet, de um metro e meio, costumava estar.
E assim começaram os 30 minutos mais assustadores
da minha vida. Nos dias que se seguiram, ouvi de muita gente
que ninguém sobrevive a uma colisão aérea.
Eu tive muita sorte por ter sobrevivido e só descobriria
mais tarde que os 155 passageiros a bordo de um Boeing 737,
que fazia uma rota doméstica e nos havia atingido,
não tiveram a mesma sorte.
Os investigadores de acidentes ainda estão tentando
descobrir o que aconteceu exatamente. Nosso jato, bem menor,
se manteve no ar enquanto o Boeing 737, mais longo, largo
e mais de três vezes mais pesado, despencou do céu
em mergulho vertical.
Mas às 15h59 da última sexta-feira, tudo que
eu conseguia ver, tudo que eu sabia era que parte da asa
havia desaparecido. E estava claro que a situação
piorava rapidamente. A parte frontal da asa estava perdendo
rebites, e o revestimento metálico estava sendo arrancado
da estrutura.
Para meu espanto, ninguém entrou em pânico.
Os pilotos começaram calmamente a examinar os controles
e os mapas, à procura de um aeroporto nas imediações,
ou a olhar pela janela em busca de um local para um pouso
de emergência.
Mas os minutos se passavam, e o avião continuava
a perder velocidade. Àquela altura, todos sabíamos
o quanto a situação era ruim. Eu imaginava
o quanto uma aterrissagem forçada, eufemismo otimista
para queda, poderia doer.
Pensei na minha família. Não fazia sentido
pegar o celular e tentar ligar, não havia sinal.
E enquanto nossas esperanças se apagavam, como o
sol, alguns dos passageiros começaram a escrever
bilhetes para os cônjuges e familiares e a guardá-los
nas carteiras, na esperança de que viessem a ser
localizados mais tarde.
Quando o vôo começou, as anotações
que me ocupavam eram outras. Escrevo a coluna semanal "On
the Road", para a seção de viagens de negócios
do "The New York Times", há sete anos. Mas minha
presença a bordo do Embraer 600 era um trabalho freelancer,
para a revista "Business Jet Traveler".
Meus colegas a bordo incluíam executivos da Embraer
e de uma empresa de táxi aéreo chamada ExcelAire,
a nova proprietária do jato. David Rimmer, vice-presidente
sênior da ExcelAire, havia me oferecido carona de
volta aos Estados Unidos no jatinho que sua empresa acabara
de receber da Embraer.
E o vôo começou muito bem. Minutos antes do
acidente, eu fui à cabine conversar com os pilotos,
que disseram que o aparelho estava apresentando excelente
desempenho. Eu verifiquei nossa altitude no altímetro:
11 mil metros.
Voltei ao meu assento. Minutos depois veio a colisão
(que, descobrimos mais tarde, também havia arrancado
parte da cauda da aeronave).
Não tivemos muito tempo para conversar nos minutos
que se seguiram ao acidente.
Rimmer, um homem corpulento, estava encolhido no assento
diante do meu, observando a asa danificada.
"É muito grave?", eu perguntei. Ele me olhou fixamente
e respondeu: "Não sei".
Percebi a linguagem corporal dos dois pilotos. Eram como
soldados trabalhando em completa sintonia em uma situação
de perigo, exatamente como foram treinados para agir.
Pelos 25 minutos que se seguiram, os pilotos Joe Lepore
e Jan Paladino dividiram sua atenção entre
os instrumentos e a busca por um aeroporto. Não tiveram
sorte.
Enviaram pedidos de socorro pelo rádio, e um avião
de carga que voava em algum lugar da região os recebeu.
Não houve contato com qualquer outro avião,
especialmente com um Boeing 737, no mesmo espaço
aéreo.
Então, por entre as copas escuras das árvores,
Lepore avistou uma pista de pouso. "Estou vendo um aeroporto",
disse.
Os pilotos tentaram contatar a torre de controle do que,
mais tarde, descobrimos ser uma base militar escondida nas
profundezas da Amazônia. Eles manobraram o avião
de maneira suave para evitar qualquer desgaste adicional
na asa danificada. Quando se aproximaram mais da pista,
conseguiram seu primeiro contato com o controle de tráfego
aéreo.
"Não sabíamos qual era a extensão da
pista de pouso, ou o que havia nela", diria Paladino, naquela
noite, na base de Cachimbo, em meio à selva.
A aterrissagem foi rápida e árdua. Vi o esforço
dos pilotos para manter o avião sob controle devido
à perda de muitos dos comandos automatizados. Eles
conseguiram completar o pouso com boa margem de segurança.
Cambaleamos em direção à saída.
"Belo trabalho", eu disse aos pilotos quando passei por
eles. Na verdade, inseri uma palavra que não se pode
publicar entre "belo" e "trabalho".
"Estamos aqui para isso", disse Paladino com um sorriso
de ansiedade.
Mais tarde, naquela noite, jantamos e tomamos cerveja bem
gelada, na base militar. Especulamos sem parar sobre o que
poderia ter causado o impacto. Um balão meteorológico
descontrolado? Um jato de combate abandonado pelo piloto
depois de problemas em alguma manobra arrojada? Um jato
de passageiros que houvesse explodido nas proximidades,
varrendo nosso avião com destroços?
Qualquer que tivesse sido a causa, ficou claro que passáramos
por uma verdadeira colisão aérea, aquelas
das quais ninguém sobrevive.
Em um momento de humor negro, no alojamento coletivo onde
dormimos, eu disse "talvez estejamos todos mortos, e isso
seja o inferno, reviver a experiência de virar a noite
conversando e tomando cerveja, no dormitório da faculdade".
Por volta das 19h30, Dan Bachmann, executivo da Embraer
e o único de nós que falava português,
veio à mesa em que estávamos instalados no
refeitório e nos contou o que lhe havia sido informado
no escritório do comandante. Um Boeing 737 com 155
pessoas a bordo estava desaparecido, exatamente na região
em que fôramos atingidos.
Antes daquele momento, nós estávamos brincando,
rindo sobre a nossa experiência quase fatal. Éramos
os "Sete do Amazonas", sobreviventes improváveis
aos quais o tempo que vivíamos não mais pertenciam.
Realizaríamos uma reunião anual e contaríamos
uns aos outros a que dedicamos nossas vidas. Mas em lugar
disso, nós inclinamos nossas cabeças em um
longo momento de silêncio, interrompido pelo som de
choro contido.
Ambos os pilotos, experientes na condução
de jatos executivos, ficaram muito abalados. "Se alguém
deveria ter caído, seríamos nós", repetia
sem cessar Lepore, 42, de Bay Shore, Nova York.
Paladino, 34, de Westhampton, Nova York, mal conseguia falar.
"Estou tentando me conformar com a perda de todas essas
pessoas. E dói", disse.
Yandle disse aos pilotos "vocês são heróis,
vocês salvaram nossas vidas". Eles sorriram, desanimados.
Era evidente que o peso do que aconteceu ficaria com eles
para sempre.
No dia seguinte, a base estava repleta de autoridades brasileiras
investigando o acidente e dirigindo operações
de busca pelo Boeing 737 perdido, o qual um oficial me disse
estar em uma área menos de 160 quilômetros
ao sul de nós, acessível apenas para desbravadores
que abrissem uma picada na selva.
Também pudemos ver o nosso avião, que estava
sendo estudado por inspetores. Ralph Michielli, vice-presidente
de manutenção da ExcelAire e um dos passageiros
do vôo, subiu comigo em um monta-cargas para me mostrar
os danos sofridos pela asa, perto do winglet decepado.
Um painel próximo à parte frontal da asa exibia
um rombo de mais de 30 centímetros. Manchas escuras
perto da fuselagem mostravam um vazamento de combustível.
Partes do estabilizador horizontal, na cauda, haviam sido
esmagadas, e faltava um pedaço do elevon esquerdo.
Um inspetor militar brasileiro que observava o avião
me surpreendeu por sua disposição de conversar,
ainda que ele não soubesse muito inglês, e
eu, português nenhum.
Ele estava especulando sobre o que poderia ter acontecido
e, em resumo, disse o seguinte: ambos os aviões,
inexplicavelmente, ocupavam a mesma posição
e altitude ao mesmo tempo. Os pilotos do Boeing 737, que
voava rumo ao sudeste, avistaram nosso Legacy 600 que voava
rumo a noroeste, para Manaus, e conduziram uma frenética
manobra de evasão. A asa do 737, varrendo o espaço
entre nossa asa e a cauda elevada, nos atingiu duas vezes,
e o avião maior então prosseguiu em sua espiral
destrutiva.
A situação parecia impossível, reconheceu
o inspetor. "Mas acredito que seja isso que aconteceu",
disse. Ainda que ninguém ainda saiba ao certo a causa
do acidente, três outros oficiais brasileiros me disseram
ter sido informados de que ambos os aviões estavam
na mesma altitude.
Por que eu, o passageiro mais próximo do impacto,
não ouvi o som, o rugido de um grande 737?
Perguntei a Jeirgem Prust, piloto de testes da Embraer.
Isso foi no dia seguinte, quando fomos transferidos da base,
em um avião de transporte militar, para o comando
da polícia de Cuiabá, cidade cujas autoridades
têm jurisdição sobre a área de
impacto e na qual pilotos e passageiros do Legacy 600, entre
os quais eu, seriam interrogados até o nascer do
dia por um comandante de polícia e seus tradutores.
Prust pegou a calculadora e saiu fazendo contas, computando
o tempo disponível para que eu ouvisse o rugido de
outro jato se aproximando, com os dois aparelhos voando
a cerca de 800 km/h em direções opostas. Ele
me mostrou o resultado: "Uma fração de segundo".
Nós dois olhamos para os pilotos, esparramados, em
pose deprimida, em um sofá do outro lado da sala.
"Esses caras e aquele avião salvaram nossas vidas",
eu disse. "De acordo com os meus cálculos, sim",
ele concordou.
Mais tarde imaginei que talvez o piloto do jato de passageiros
brasileiro talvez também tenha salvo nossas vidas,
devido à rapidez de sua reação. Pena
que o mesmo não se aplique às vidas de seus
passageiros.
No comando da polícia, fomos solicitados a escrever
nossos nomes, endereços, datas de nascimento, ocupações
e nível de educação, bem como os nomes
de nossos pais. Também fomos submetidos a exame por
um médico de cabelos compridos, usando um jaleco
branco que lhe chegava quase aos pés. Tivemos de
nos despir da cintura para cima, para sermos fotografados
de frente e de perfil.
Isso, explicou o doutor cujo nome eu não descobri
mas se descreveu como "médico forense", serviria
para provar que não fomos torturados "de maneira
alguma".
O humor negro voltou, apesar de nossas tentativas para desencorajá-lo.
"Aquele cara é o legista", explicou Yandle mais tarde,
acrescentando: "Acho que isso quer dizer que estamos mesmo
mortos".
Mas as risadas, não muito animadas, duraram pouco
enquanto voltávamos a pensar incessantemente nos
corpos ainda perdidos na selva e em como aquelas vidas e
as nossas se haviam cruzado, literal e metaforicamente,
por uma horrível fração de segundo.
O
Dia
04/10/2006 00:53h
Boeing e jato
em rota de colisão no ar
Jornalista
americano diz que militares confirmaram que aviões
voavam a 37 mil pés
Rio - Em artigo publicado ontem no jornal ‘The New
York Times’, o repórter norte-americano Joe
Sharkey afirma, com base em informações de
autoridades brasileiras, que o jato Legacy-600 e o Boeing
737-800 da Gol voavam a 37 mil pés. “Eu li
o mostrador que mostrava a altitude”, lembrou.
Segundo
Sharkey, três oficiais da Base Aérea de Cachimbo
confirmaram a informação. O comandante da
Aeronáutica, brigadeiro Luiz Carlos da Silva Bueno,
já havia informado que o plano de vôo do Legacy
determinava que o jato ficasse a 36 mil pés —
abaixo do que foi visto pelo jornalista americano.
As
informações de Sharkey foram dadas por inspetor
militar brasileiro. O repórter frisou que o piloto
do Boeing, Decio Chaves, viu o Legacy se aproximando de
frente e tentou desviar. O jornalista, que estava no jato,
conta que não ouviu o 737-800, mas sentiu a batida.
Ele detalhou que o avião da Gol teria feito manobra
brusca, mas mesmo assim bateu na asa do jato e, em seguida,
começou a cair em espiral. “Assim começaram
os mais angustiantes 30 minutos de minha vida”, contou.
A
tripulação passou desesperadamente a procurar
pista ao ver a asa atingida se desintegrar no ar. Já
em terra, na Base de Cachimbo, Sharkey elogiou os pilotos
Joseph Lepore e Jean Paul Palladino. “Bela pilotagem”.
O grupo ainda fez piada na base. “Talvez estejamos
mortos e isto aqui seja o inferno”, brincou Sharkey.
Henry Yandle, passageiro, foi além — mesmo
ao saber da tragédia. “Vocês foram heróis.
Salvaram nossas vidas”, destacou. O comentário
irritou internautas brasileiros, que congestionaram o fórum
de leitores do ‘NYT’. “Senhor Sharkey,
e se os seus ‘heróis’ forem considerados
culpados?”, postou Jorge Silva.
O
Papa Bento 16 enviou mensagem de solidariedade aos familiares
das vítimas. Dizendo-se profundamente consternado,
ele pede misericórdia divina e eterno descanso para
passageiros e tripulantes mortos.
Segundo
a Agência Nacional de Aviação Civil
(Anac), as caixas-pretas do Boeing estão muito danificadas.
Foi encontrada apenas parte do registrador de voz. O restante,
incluindo a unidade de armazenamento de dados do vôo,
essencial para a investigação, ainda não
foi localizado. Esses equipamentos serão enviados
para análise na sede da Boeing, nos Estados Unidos.
A caixa-preta do Legacy e as gravações das
torres de controle já estão com comissão
de investigação.
APURAÇÃO
PRELIMINAR
Apuração
preliminar também indica que o Legacy alterou o seu
plano de vôo. Ele estaria a 37 mil pés no trajeto
entre Brasília e Manaus, mas a Aeronáutica
ainda não informou se essa alterção
foi autorizada pela torre de comando. O confronto de dados
das caixas-pretas do Legacy e do Boeing é fundamental
para confirmar esse dado. Mas há a hipótese
de que Lepore estivesse testando a aeronave na viagem de
entrega aos americanos. Por isso, teria desligado o equipamento
anticolisão.
Com
o aparelho do jato fora de operação, o Boeing
conseguiria identificar a presença de aeronave no
seu radar, mas não seria capaz de precisar o posicionamento,
segundo especialista. Em depoimento à Polícia
Civil do Mato Grosso, Lepore negou o teste. Disse que treinou
em equipamento semelhante e voou no jato em São José
dos Campos.
Federal
vai investigar piloto
A Polícia Federal (PF) participará das investigações
sobre o acidente. Segundo o superintendente da PF em Mato
Grosso, Geraldo Pereira, será apurada a possibilidade
de o piloto Joseph Lepore ter cometido homicídio
culposo (não intencional). “Ele não
teria tomado os cuidados necessários”, afirmou.
Lepore e o co-piloto Jean Paul Palladino passaram 10 horas,
ontem, no Centro de Medicina Aeroespacial (Cemal), na Estrada
do Galeão, na Ilha do Governador, fazendo exames
médicos e psicológicos. Eles saíram
pela porta de trás, escondidos.
A
dupla chegou ao Cemal — centro de excelência
— às 7h, com membro do consulado e advogado.
A avaliação é obrigatória em
caso de acidentes. Segundo militares do Cemal, Joseph e
Jean estão abalados. Eles colheram sangue, tiraram
radiografias e passaram por exames psiquiátricos,
neurológicos, visuais e cardiológicos.
Por
ordem da Justiça de Mato Grosso, a PF do Rio apreendeu
os passaportes dos dois ontem. Eles devem ficar no Brasil
até que seja confirmada a autenticidade das declarações
prestadas à Polícia Civil, domingo.
PERITOS
JÁ TÊM COMO IDENTIFICAR 46
Começaram a chegar, no fim da tarde de ontem, a Brasília,
os corpos dos passageiros do vôo 1907 da Gol. O Instituto
Médico-Legal do Distrito Federal deverá receber
hoje os restos mortais de mais 30 pessoas removidas junto
ao que sobrou da cauda do Boeing. A um quilômetro
dali, foram encontrados os corpos do piloto Decio Chaves,
44 anos, e do co-piloto Thiago Jordão Cruso, 29.
O instituto informou que já reuniu informações
para identificar 46 dos passageiros mortos.
A Gol informou ontem que inicialmente liberará R$
14 mil, do seguro obrigatório, para cada família.
A companhia explicou que outros pagamentos estão
previstos para o fim das investigações e conforme
as ações na Justiça.
As
equipes de busca e resgate conseguiram encontrar até
o momento os restos mortais de 50 pessoas. Inicialmente,
chegou-se a anunciar que seriam 100. Também foram
recolhidos no meio da mata documentos de identidade, celulares
e outros pertences que poderão ajudar na identificação.
Legistas explicam que tais objetos podem ter impressões
digitais e agilizar o processo.
Técnicos
do IML esperam terminar hoje a coleta de sangue e saliva
dos parentes para possível comparação
genética. Fichas montadas com dados fornecidos pelas
famílias, como tatuagens e cicatrizes, vão
ser usados pelos peritos para evitar pedir o reconhecimento
visual dos restos mortais dos passageiros. Mais 27 militares
reforçaram o resgate na selva, que vinha sendo feito
por 85 homens.
G1
03/10/2006 - 16h29m - Atualizado em 04/10/2006 - 00h35m
"PARTE ESSENCIAL" DAS CAIXAS-PRETAS
ESTÁ FALTANDO, DIZ ANAC
A Agência Nacional de Aviação Civil
(Anac) divulgou nota na tarde desta terça-feira (3),
informando que as caixas-pretas encontradas do Boeing 737-800
estão muito danificadas.
Um avião desse modelo tem duas caixas-pretas (que
na verdade são de cor laranja). Uma delas armazena
só dados. Foi encontrada, tem muitos danos, mas pode
ser analisada.
A outra armazena voz e dados de comunicação.
A parte que armazena voz foi achada. A que guarda os dados
de comunicação ainda está em algum
lugar da selva. Segundo a Anac, essa parte que falta "é
essencial para a análise, e continuam as buscas por
ela na Serra do Cachimbo (MT)".
A nota oficializa ainda a formação da Comissão
de Investigação sobre o acidente. O presidente
é o coronel-aviador Rufino Antonio da Silva Ferreira,
da Anac.
A comissão designou seis membros fixos, que investigam
os fatores operacional, material e humano relacionados ao
acidente. Também participam representantes dos fabricantes
das aeronaves e dos motores, especialistas da Anac e do
Comando da Aeronáutica, além de representantes
internacionais. A comissão tem 90 dias para apresentar
relatório sobre a causa do acidente, prazo que pode
ser prorrogado.
A caixa-preta do Legacy, o jatinho que bateu no Boeing,
também já está sendo avaliada. Mas
seu conteúdo só será revelado depois
de as informações serem cruzadas com as das
caixas-pretas do Boeing, de acordo com a Anac.
G1
03/10/2006 - 20h47m - Atualizado em 03/10/2006 - 21h19m
"FOI UMA BATIDA SECA E BREVE",
DIZ ESPECIALISTA
Alessandro Greco, do G1, em São Paulo
Um dado que pode indicar a causa do acidente com o Boeing
737-800 da Gol na última sexta-feira (29/9) é
o formato da asa do jatinho Legacy -- que bateu no avião
maior, mas conseguiu aterrissar.
Na opinião de Moacir Duarte, especialista em acidentes,
a batida "foi uma batida seca e breve, pois a asa está
intacta. Caso contrário, ela estaria destruída".
Duarte, que é pesquisador da Coppe-UFRJ, a Coordenação
dos Programas de Pós-graduação de Engenharia
da Universidade Federal do Rio de Janeiro, faz sua análise
com base nas fotos do Legacy divulgadas no domingo (2) pela
Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).
Nas fotos, é possível ver um detalhe do "winglet",
o pedaço que fica no final da asa, parafusado a ela
e com o bico virado para cima.
"Se o contato entre ele [o 'winglet'] e o Boeing fosse
prolongado, haveria uma deformação na asa
do Legacy e isso aparentemente não ocorreu",
disse ao G1.
Na opinião de Duarte, o mistério de por que
o Boeing caiu -- e não o Legacy -- começará
a ser desvendado na hora em que for achado também
o pedaço do avião da Gol que foi atingido
pelo "winglet" do pequeno jato. "É
preciso encontrar o destroço com o corte seco. Com
ele, mais as duas caixas-pretas, será possível
reconstituir o que aconteceu."
Outra questão que precisa ser respondida é:
houve uma ou duas colisões? Há duas avarias
no Legacy, uma no "winglet" e outra no estabilizador,
o pedaço que fica sobre a cauda do avião.
O número de batidas pode ser descoberto pelo depoimento
dos pilotos, cujo teor ainda não foi divulgado.
Globo
Online
03/10/2006 às 20h55m
PF vai participar
das investigações sobre a queda de avião
da Gol
Bernardo de La Peña (enviado
especial), Jaílton de Carvalho e Martha Beck - O
GloboTV GloboCBNO Globo Online
Dois membros da Força Aérea
Brasileira carregam a caixa-preta do Boeing 737-800 da Gol,
encontrada entre os destroços do avião - Foto:
Divulgação/Força Aérea Brasileira
BRASÍLIA,
CUIABÁ e PEIXOTO DE AZEVEDO (MT) - A Polícia
Federal vai participar das investigações sobre
a queda do Boeing 737-800 da Gol. Segundo o superintendente
da PF no Mato Grosso, Geraldo Perreira, a pedido do Ministério
Público Federal (MPF), a PF vai instalar, nesta quarta-feira,
um inquérito para apurar se foi cometido o crime
de homicídio culposo pelo piloto americano Joseph
Lepore, que conduzia o Legacy 600 que colidiu com o Boeing
da Gol quando as duas aeronaves sobrevoavam a divisa entre
os estados de Mato Grosso e do Pará. O acidente provocou
a queda do avião da Gol e a morte das 155 pessoas
que estavam na aeronave.
Nesta
terça-feira, foram encontrados os corpos do piloto
e do co-piloto da Gol . A Aeronáutica informou que
já foram localizados cerca de 50 restos mortais,
e não 100 como fora informado segunda-feira. Os dois
primeiros corpos de vítimas do acidente chegaram
no fim da tarde a Brasília. Os corpos serão
levados para exame no Instituto Médico Legal, onde
aguardarão identificação.
Segundo
Geraldo Perreira, a investigação da PF servirá
para apurar se Lepore, como pessoa habilitada, tomou alguma
medida na condução da aeronave que poderia
colocar em risco a vida das pessoas.
-
Nós apuraríamos homicídio culposo por
parte do piloto (Joseph Lepore). Ele não teve intenção
de matar, mas não teria tomado os cuidados necessários
como pessoa especializada. Vamos investigar o que houve.
Isso é igual a um acidente de trânsito - afirmou
o superintendente da PF.
PF
apreende passaportes de pilotos do Legacy
Perreira
informou que o MPF foi o responsável pela requisição
da instauração do inquérito e que a
apuração do caso pode passar a PF, porque
crimes cometidos em aeronaves são de competência
do órgão. Ele disse ainda que vai requisitar
à Polícia Civil do Mato Grosso, que já
investiga as causas e os eventuais responsáveis pela
queda, cópias dos depoimentos tomados dos passageiros
e da tripulação do Legacy, além dos
laudos das perícias que já foram feitas.
A
Polícia Federal também apreendeu na tarde
desta terça os passaportes do piloto e do co-piloto
do Legacy, Joe Lepore e Jean Paul Paladino. Os documentos
foram retidos logo após os exames médicos
realizados nesta terça-feira no Centro de Medicina
Aerospacial, na Ilha do Governador, Rio de Janeiro. A decisão
de apreender os documentos de viagem dos dois americanos
foi tomada pelo juiz Tiago Souza Nogueira de Abreu, titular
da comarca de Peixoto de Azevedo (MT), município
onde caiu o avião da Gol. Os exames são de
rotina, realizados para testar a capacidade física
e psicológica dos pilotos e devem ser renovados anualmente
ou em caso de acidente.
Novas
informações recolhidas pelos órgãos
do governo encarregados da investigação das
causas da queda do avião revelam fortes indícios
de que o Legacy, pilotado por Lepore, pode ter contrariado
orientação da torre de comando da Aeronáutica,
na decolagem em São José dos Campos (SP),
permanecendo na rota do Boeing. Esse comportamento pode
explicar as causas do acidente que matou 155 pessoas, informa
reportagem publicada pelo jornal "O Globo" nesta terça-feira.
Técnicos
americanos vão acompanhar investigação
O
Comando da Aeronáutica confirmou que um controlador
de vôo que trabalhava numa das torres responsáveis
pelo monitoramento dos aviões que se chocaram foi
afastado para a realização de exames psicológicos
, mas esclareceu que o procedimento é padrão
em casos de desastres aéres e, por isso, não
é correto dizer que o controlador foi afastado do
seu cargo.
A
Agência Nacional de Aviação Civil (Anac)
informou nesta terça-feira que os representantes
do governo americano que vão acompanhar os trabalhos
de investigação do acidente envolvendo o Boeing
737-800 da Gol já chegaram ao país. Eles estão
no Rio de Janeiro desde a tarde desta terça. Entre
os representantes da equipe internaccional estão
um técnico da Federal Aviation Administration (FAA),
a agência de aviação americana, e três
técnicos do Nacional Transportation Safety Board
(NTSB). Também participam do trabalho, como observadores,
representantes da Boeing e da Embraer, fabricante do Legacy
que colidiu com o avião da Gol.
Papa
Bento XVI envia mensagem de solidariedade
Ainda
segundo a Anac, as duas caixas-pretas do Boeing 737-800
da Gol já estão em posse da comissão
de investigação do acidente. No entanto, elas
estão muito danificadas. Foi encontrada apenas uma
parte do registrador de voz. O resto do equipamento, incluindo
a unidade de armazenamento de dados, que é essencial
para concluir a investigação, continua sendo
procurada pelas equipes de resgate que estão na Serra
do Cachimbo (MT), onde o avião caiu após colidir
com um jato executivo Legacy, na última sexta-feira.
A comissão de investigação tem 90 dias
para apresentar um relatório com os resultados sobre
a causa do acidente, mas o período pode ser ampliado,
caso haja necessidade.
Nesta
terça-feira, o Papa Bento XVI divulgou uma mensagem
de solidariedade às vítimas do vôo 1907.
Estadão
03 de outubro de 2006 - 17:23
PF apreende passaportes de piloto
e co-piloto do Legacy
A ordem para a apreensão
dos passaportes partiu da Justiça do Mato Grosso
Rodrigo Morais
Os pilotos do jatinho, Lepore
(camiseta)
e Palladino (boné)
RIO - A Polícia Federal do Rio de Janeiro apreendeu
na tarde desta terça-feira, 3, os passaportes dos
americanos Joe Lepore e Jan Paladino, respectivamente piloto
e co-piloto do jato Legacy que se chocou com o Boeing da
Gol na sexta-feira, no acidente que causou a morte de 155
pessoas.
A
ordem para a apreensão dos passaportes partiu da
Justiça do Mato Grosso. Lepore e Paladino passaram
por exames clínicos, psicológicos e laboratoriais
no Centro de Medicina Aeroespacial, na Ilha do Governador,
zona norte do Rio, nesta terça. Eles estavam acompanhados
por uma representante do consulado americano e um advogado.
Estadão
03 de outubro de 2006 - 14:00
Corpos de pilotos do Boeing da Gol
são encontrados
Os trabalhos de resgate foram
reiniciados a partir das 9 horas desta terça-feira
Solange Spigliatti
SÃO PAULO - Os corpos do comandante Decio Chaves
Junior e do co-piloto Thiago Jordão Caruso, tripulantes
do vôo 1907 da Gol que caiu na última sexta-feira,
foram encontrados na manhã desta terça-feira,
3, de acordo com o Centro de Comunicação da
Aeronáutica. Os trabalhos de resgate foram reiniciados
a partir das 9 horas desta terça-feira em razão
das condições meteorológicas na região.
Informada
de que os corpos haviam sido encontrados, a Gol manifestou,
em nota, o pesar pela perda. "Verdadeiramente vocacionados
para a aviação, Decio e Thiago eram dois grandes
profissionais, colegas exemplares e modelos para os seus
pares. Por tudo isso, a Gol depositava neles toda a confiança
e tem certeza absoluta de que fizeram tudo que era possível
para salvar a vida de todos os que estavam a bordo do vôo
1907”, diz a nota em nome do comandante David Barioni
Neto, vice-presidente técnico da Gol.
O
presidente da companhia, Constantino de Oliveira Junior,
disse que piloto e co-piloto ficarão na memória
da empresa, que sempre se orgulhará da atuação
de ambos. “Decio e Thiago são nossos heróis,
assim como os comissários que integravam a tripulação.
Merecem nossas homenagens e nosso agradecimento eterno.
Nunca sairão de nossa lembrança”, afirmou.
Nesta
segunda-feira, 2, o comandante da Aeronáutica, brigadeiro
Luiz Carlos da Silva Bueno, em entrevista coletiva junto
com o ministro da Defesa, Waldir Pires, afirmou que cerca
de 100 corpos de vítimas da queda do Boeing 737-800
da Gol na selva amazônica já haviam sido encontrados
pelas equipes de resgate que devem permanecer no local ainda
por uma semana.
O
ministro Waldir Pires, porém, evitou fazer uma previsão
sobre o dia em que o resgate dos 100 corpos será
concluído devido à dificuldade de acesso ao
local. "Queremos trazê-los o mais rápido
possível", disse o ministro.
Segundo
o brigadeiro, os familiares e parentes que estiveram sobrevoando
o local do acidente ficaram "impressionados" com
a dificuldade da operação de resgate.
Os
dois primeiros corpos resgatados no domingo devem chegar
nesta terça a Brasília. Eles não tinham
documentos que os pudessem identificar, mas as roupas e
alguns objetos pessoais que portavam podem ajudar a resolver
o problema.
À
medida que são resgatados, os corpos são identificados
na Base da Serra do Cachimbo, de onde seguem para Brasília,
para a identificação definitiva no IML, e
entrega aos familiares. Dez legistas já trabalham
na identificação. Por suas características
e número de vítimas, o acidente foi o mais
devastador da história da aviação brasileira.
Folha
Online
03/10/2006 - 13h50
FAB localiza corpos de piloto e co-piloto
de Boeing que caiu em MT
Os
corpos do comandante Decio Chaves Junior e o do co-piloto
Thiago Jordão Cruso, profissionais responsáveis
pela condução do vôo 1907, que caiu
em uma região de mata fechada em Mato Grosso na última
sexta-feira (29), foram encontrados nesta terça-feira,
conforme nota divulgada pela própria companhia aérea.
Na
nota, o vice-presidente técnico da empresa, comandante
David Barioni Neto, disse ter "certeza absoluta de
que fizeram tudo que era possível para salvar a vida
de todos os que estavam a bordo do vôo 1907".
De acordo com a Anac (Agência Nacional de Aviação
Civil), os corpos dos dois profissionais foram achados dentro
da cabine do avião.
Na
segunda-feira (2), a FAB (Força Aérea Brasileira),
que comanda as operações de busca e resgate
dos corpos dos 155 ocupantes do Boeing 737-800, disse ter
encontrado cerca de 100 deles na cauda do avião.
Grande parte deles foi mutilada. Para chegar ao local, que
é de difícil acesso, as equipes tiveram que
abrir uma clareira e descer em pára-quedas.
Militares
que estiveram no local do acidente são unânimes
em dizer que a destruição foi enorme. No domingo
(1º), a área em que as buscas serão realizadas
foi aumentada de 10 quilômetros quadrados para 20.
O resgate dos corpos deverá durar ao menos uma semana.
Somente
dois corpos --mutilados-- haviam sido comprovadamente resgatados
e armazenados, até esta terça-feira. catalogados,
ensacados e enviados de helicóptero para base da
FAB montada na fazenda Jarinã, a cerca de 40 km do
local da queda do Boeing. Os corpos são mantidos
em caminhões frigoríficos e seguirão
de helicóptero para Brasília (DF).
Para
o diretor do IML de Brasília, José Flávio
de Souza Bezerra, que ficará responsável por
identificar as vítimas do acidente aéreo,
os trabalhos poderão durar até dois anos.
Nesta terça, o pai de uma moça morta no desastre,
João Mendes Rezende, emocionou-se ao falar sobre
o resgate e lamentou a provável demora. "Esperamos
que o governo seja o mais ágil possível para
aliviar o sofrimento de todos os familiares."
Investigação
O
Boeing, que havia saído de Manaus com destino ao
Rio, deveria fazer uma escala em Brasília. Ele perdeu
contato por volta das 17h de sexta, depois de bater em um
jato executivo Legacy fabricado pela Embraer. Os destroços
do avião foram encontrados por volta das 9h de sábado,
em uma área de mata, a 200 km do município
de Peixoto de Azevedo (MT).
Divulgação/Anac
Imagem (acima) mostra Legacy avariado após choque
com Boeing; abaixo, aeronave normal
O choque provocou danos na asa do jato Legacy, que conseguiu
pousar na base aérea de Cachimbo. A aeronave seguia
para os Estados Unidos com sete pessoas --piloto, co-piloto,
dois funcionários da Embraer, um jornalista do "The
New York Times" e dois funcionários da Excel
Aire, empresa que comprou o jato. Todos passam bem.
Em
depoimento prestado domingo, os pilotos --que são
americanos-- disseram que não viram o Boeing, embora
tivessem sentido um pequeno impacto e ouvido um "barulho".
Afirmaram, ainda, que os equipamentos da aeronave funcionavam
normalmente antes e depois do acidente.
De
acordo com o presidente da Anac, o equipamento que sinaliza
a presença de outra aeronave em rota de colisão,
o chamado TCAS, funcionava normalmente no Legacy.
Para
a Polícia Civil de Mato Grosso, a versão dos
dois profissionais "soou inverossímil"
e há hipótese de homicídio culposo.
Neste caso, o piloto e o co-piloto do Legacy e os controladores
de tráfego aéreo poderiam ser responsabilizados.
Tanto
as caixas-pretas do Legacy quanto do Boeing foram localizadas
e estão sendo submetidas a análises. Espera-se
que os registros revelem quais problemas provocaram o choque
entre as duas aeronaves e a queda.
O
Globo Online
03/10/2006 às 12h59m
Legacy pode ter desobedecido a ordem
de torre
CBN - Jaílton de Carvalho, Martha
Beck, Bernardo de la Peña e Regina Alvarez - O Globo
PEIXOTO DE AZEVEDO (MT), CUIABÁ e BRASÍLIA
- Novas informações recolhidas pelos órgãos
do governo encarregados da investigação das
causas da queda do Boeing 737-800 da Gol revelam fortes
indícios de que o jato Legacy, pilotado pelo americano
Joe Lepore, pode ter contrariado orientação
da torre de comando da Aeronáutica, na decolagem
em São José dos Campos (SP), permanecendo
na rota do Boeing. Esse comportamento pode explicar as causas
do acidente que matou 155 pessoas na última sexta-feira.
Nesta terça-feira, foi retomado o trabalho de resgate
dos corpos .
Ainda
nesta terça-feira, o piloto e o co-piloto do Legacy
realizam exames no Centro de Medicina Aeroespacial na Ilha
do Governador, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Joe Lepore
e Jean Paul Paladino chegaram ao local no início
desta manhã, acompanhados de um advogado e de um
representante da Embaixada americana no Brasil. Os exames
de rotina são realizados para testar a capacidade
física e psicológica dos pilotos e devem ser
renovados anualmente ou em caso de acidente. Segundo a assessoria
de comunicação do centro, a previsão
é de que os resultados fiquem prontos ainda nesta
terça.
Na
segunda-feira, Justiça do Mato Grosso determinou
a apreensão dos passaportes de Lepore e Paladino,
para evitar que eles deixem o país antes da conclusão
das investigações.
Segundo
informações apuradas pelos investigadores,
o piloto do Legacy pediu autorização para
voar a uma altura de 37 mil pés, a mesma que o Boeing
vinha usando desde Manaus, informa reportagem publicada
pelo jornal "O Globo" nesta terça-feira.
( clique e leia a íntegra da reportagem no Globo
Digital)
No
dia do acidente, a Agência Nacional de Aviação
Civil (Anac) informou que o Boeing da Gol estava a 36 mil
pés - o que contraria a regra do controle de vôo
no país. As aeronaves que partem do Norte em direção
ao Sul sempre usam rotas ímpares em níveis
de vôo, como 35 ou 37 mil pés. Já os
aviões que partem do Sul em direção
ao Norte utilizam os níveis são pares. Por
isso, o Legacy tinha que estar a 36 ou 38 mil pés.
Uma
fonte da Infraero esclareceu que uma aeronave pode voar
"na contramão" em situações
especiais, quando não há tráfego aéreo.
Foi o que teria acontecido com o Legacy na primeira etapa
de sua viagem em direção a Manaus.
O
comandante da Aeronáutica, brigadeiro Luiz Carlos
Bueno, confirmou ontem que o plano de vôo do Boeing
estabelecia uma altitude de 37 mil pés e o do Legacy,
36 mil pés. Ele também disse que os dois se
chocaram a 37 mil pés.
—
O Boeing estava a 37 mil pés e eles e bateram porque
o Legacy também estava a 37 mil pés —
afirmou o brigadeiro
Na
segunda-feira, o Comando da Aeronáutica divulgou
nota informando que foram encontradas as duas caixas-pretas
do Boeing. Agora, os equipamentos de gravação
de voz (voice recorder) e de dados (digital flight data
recorder) serão encaminhados à comissão
de investigação do acidente para serem analisados.
Elas também serão encaminhadas para a sede
do fabricante do avião nos Estados Unidos para perícia.
O piloto Joe Lapore disse em depoimento à polícia
de Mato Grosso que uma falha no equipamento anticolisão
pode ter sido a causa do acidente. Segundo ele, se o equipamento
anticolisão estivesse funcionado, "talvez essa
tragédia não tivesse ocorrido".
Fontes
citadas em reportagem do "Globo" publicada na
segunda-feira levantaram a hipótese de ter havido
uma falha do controle de tráfego aéreo.
Segundo
diretora da Agência Nacional de Aviação
Civil (Anac), Denise Abreu, uma comissão do órgão
regulador do mercado de aviação dos Estados
Unidos (National Transportation Safety Board, ou NTSB),
chegará ao Brasil nesta terça-feira para acompanhar
as investigações da causa do acidente.
Além
dos pilotos, estavam no Legacy dois executivos da empresa
que comprou o avião, um jornalista americano que
estava fazendo uma reportagem sobre a Embraer e dois funcionários
da fabricante brasileira.
Folha
Online
03/10/2006 - 03h00
Repórter do "NY Times"
relata como foi a colisão com Boeing da Gol
O
jornalista Joe Sharkey, repórter do "The New
York Times", relata na edição desta terça
do diário americano a experiência que ele descreve
como uma "colisão com a morte". No relato,
em primeira pessoa, o jornalista afirma que o mais surpreendente
de tudo é ter sobrevivido ao acidente. Joe Sharkey
estava no jato Legacy que teria se chocado com o Boeing
737 da Gol na última sexta-feira.
"Com
a janela abaixada, eu estava relaxando numa cadeira de couro
a bordo de um jato executivo de US$ 25 milhões, voando
acima de imensa floresta amazônica. Sem aviso, senti
uma impressionante sacudida e ouvi um estrondo ensurdecedor,
seguido por um silêncio assustador. E então
ouvi três palavras que jamais esquecerei. 'Nós
fomos atingidos', disse Henry Yandle, outro passageiro.",
descreve Sharkey.
Depois,
Sharkey narra o que chamou de os "30 minutos mais assustadores"
de sua vida. "Eu tenho sorte de estar vivo --apenas
mais tarde eu soube que as 155 pessoas a bordo do Boeing
737, que provavelmente bateu no nosso, não tiveram
a mesma sorte", conta o jornalista.
Sharkey
explicou que as autoridades brasileiras continuam tentando
entender o que de fato aconteceu e como. "Nosso pequeno
jato conseguiu permanecer inteiro enquanto um 737 que é
maior e cerca de três vezes mais pesado desabou com
o nariz apontado para o chão", escreveu.
"Às
15h59 da última sexta, tudo o que pude ver e tudo
o que eu sabia era que parte da asa não existia mais.
Surpreendentemente, ninguém entrou em pânico.
Os pilotos começaram calmamente a procurar o aeroporto
mais próximo em seus mapas e controles".
O
jornalista afirma que poucos minutos depois, o jato começou
a perder velocidade e os passageiros começavam a
imaginar como seria o pouso de emergência. "Pensei
em minha família. Não havia sinal para tentar
uma ligação pelo celular. E como as esperanças
afundavam junto com o sol, começamos a escrever bilhetes
para nossas esposas e pessoas queridas, com a esperança
de que as notas poderiam ser mais tarde encontradas",
conta Sharkey.
"Mais
tarde naquela noite, recebemos cerveja gelada e comida em
uma base militar. Nós especulávamos interminavelmente
sobre o que tinha causado a colisão. Um balão
meteorológico? Alguma parte de um avião que
explodiu em algum lugar nos arredores? Qualquer que fosse
a causa, estava agora claro que nós nos envolvemos
em uma batida nos ares em que nenhum de nós deveria
ter sobrevivido", escreve Sharkey.
O
jornalista afirma que, apenas por volta das 19h30 do mesmo
dia, é que ficaram sabendo que um Boeing 737 com
155 pessoas havia desaparecido "exatamente no local"
em que eles acreditam que foram atingidos. No dia seguinte,
a base militar onde estavam ficou repleta de autoridades
brasileiras que investigavam o acidente. Os passageiros
e tripulantes do Legacy foram então levados para
Cuiabá, onde foram interrogados.
|