::::: RIO DE JANEIRO - 02 DE SETEMBRO DE 2007 :::::

 

Jornal Zero Hora
02/09/2007
Especial- Aviação
O avião da alegria na ANAC
FÁBIO SCHAFFNER/ Brasília

Todos os dias, em média 10 passagens aéreas são emitidas, de graça, para servidores da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Somente no primeiro semestre deste ano, a Anac requisitou 1.905 bilhetes às companhias aéreas que deveria fiscalizar. Em 10 ocasiões, as viagens tiveram como origem ou destino Miami, nos Estados Unidos. Em outros casos, as passagens eram emitidas às vésperas de feriadões e para pontos turísticos como Fernando de Noronha e Florianópolis.

Zero Hora teve acesso a um relatório de 693 páginas, com os nomes dos 520 funcionários da Anac que solicitaram cortesia às empresas de janeiro a junho de 2007. A agência dispõe de 1.755 cargos efetivos, dos quais 584 ainda não foram preenchidos. Estima-se que quase metade dos servidores voaram sem pagar. Se for considerado ainda o número de militares que viajam em missões de treinamento ou investigando acidentes, a média de bilhetes gratuitos fornecidos aos integrantes do Sistema de Aviação Civil chega a 30 por dia.

Diante de uma crise que se arrasta há 11 meses, tamanho empenho dos servidores em inspecionar as empresas aéreas, muitas vezes em finais de semana, levou a CPI do Apagão Aéreo na Câmara a suspeitar que parte das viagens não tenha sido a trabalho. Os parlamentares estão concentrados em duas linhas de investigação: nas passagens retiradas gratuitamente pelos funcionários e no uso para fins não oficiais da verba própria da agência para custear o deslocamentos dos diretores.

- O passe livre se tornou um trem da alegria na Anac - afirma o deputado Vic Pires (DEM-PA), integrante da CPI.

Gerente-geral de Certificação e Operações, Nélio Augusto de Sá foi quem mais viajou de graça. No primeiro semestre, ele requisitou 28 passagens aéreas. Nélio trabalha em Brasília, mas mantém residência em Campo Grande, em Mato Grosso do Sul. Tanto que até 25 julho, segundo o Sistema Integrado de Administração Financeira do governo federal (Siafi), ele já havia recebido da Anac R$ 11,4 mil em auxílio-moradia.

Não por acaso, das 28 viagens gratuitas que Sá realizou, 22 passaram por Campo Grande. Em pelo menos três missões de inspeção, a cidade aparece três vezes nos trechos percorridos. Em 7 de fevereiro, a passagem requisitada por Sá previa a jornada Campo Grande-Brasília-Campo Grande-São Paulo-Rio de Janeiro-São Paulo-Campo Grande. Cinco dias depois, ele solicitou o mesmo percurso.

O verão foi uma maravilha para os funcionários da Anac. Somente nos três primeiros meses do ano, eles viajaram 992 vezes. No dia 16 de fevereiro, sexta-feira véspera de Carnaval, a jornalista Neli Trindade, lotada na Assessoria de Comunicação da Anac em Brasília, solicitou passagem de Porto Alegre para Florianópolis. O motivo: ficar de plantão no aeroporto da capital catarinense. Também na véspera de Carnaval e com a mesma justificativa, Paulo Jorge Rodrigues de Carvalho pediu bilhete para o Rio de Janeiro.

Pelo menos 13 viagens foram feitas para Exterior

Na Quarta-feira de Cinzas, 21 de fevereiro, Eva Ferreira da Silva viajou do Rio para Fortaleza (CE). Só retornou na segunda-feira seguinte. Na mesma segunda-feira que Eva voltava de Fortaleza, Carlos Alberto Fonteles de Souza requisitava uma viagem para a ilha de Fernando de Noronha. Quem também solicitou passagem para Noronha no mesmo dia foi Marilda Tavares dos Santos. Marilda, no entanto, passou antes em Recife (PE). Vistoria em aeroportos, reuniões e a participação em congressos foram as justificativas que o trio usou para viajar.

As tarefas designadas pela Anac sugerem que praticamente todos os servidores estão aptos a fiscalizar o sistema aéreo brasileiro. Só isso explica como um designer publicitário viajou para inspecionar instalações de aviação civil. Em 15 de janeiro, o designer Alexandre Vidal, do núcleo de publicidade da Anac, percorreu os trechos Rio-Brasília-Rio.

Já para o Exterior, os servidores da Anac viajaram pelo menos 13 vezes no primeiro semestre deste ano. O roteiro predileto foi Miami (EUA), visitada por sete funcionários da Anac em 10 ocasiões. Outras três viagens tiveram como destino Paris, na França, para onde viajaram Haroldo Monteiro Cristovão, Ladislau Albert Junior e Genival Bento dos Santos. De acordo com o relatório, as idas à França tiveram por objetivo a realização de auditorias em empresas aéreas estrangeiras.
( fabio.schaffner@gruporbs.com.br )

- Na véspera do Carnaval, jornalista embarca de Porto Alegre para Florianópolis com a justificativa oficial de fazer plantão no aeroporto da capital catarinense.

- Na semana seguinte à do Carnaval, servidor requisitou passagem para Fernando de Noronha com o objetivo de vistoriar e analisar os perigos da pista da ilha.
- Em meio à crise aérea, funcionário da agência embarcou em vôo da TAM para Paris com a missão de promover auditoria em empresa de aviação internacional.


Basta se identificar para entrar em vôo

Nada melhor para quem gosta de viajar de avião do que ser funcionário da Anac. Basta um carteiraço nos balcões das companhias aéreas para cruzar os céus do país.

Na maior parte das situações, o relatório que está nas mãos da CPI do Apagão Aéreo mostra que as viagens são justificadas como "inspeção de instalações de aviação civil". Nas justificativas, não se detalha que tipo de procedimento seria efetuado. Segundo a portaria da Aeronáutica que regulamenta o passe, para solicitar os bilhetes gratuitos é necessário remeter às empresas um memorando com o número do cartão funcional do servidor, nome, cargo e documento de identidade, além do objetivo da missão, entre outras informações.

Na prática, porém, isso raramente acontece. Na maior parte das vezes o servidor apenas apresenta a carteira funcional no balcão de check-in das empresas. Se houver poltronas disponíveis no vôo desejado, o embarque é imediato. O descumprimento das regras é confirmado em ofício remetido à CPI do Apagão Aéreo pela empresa de aviação Ocean Air. Assinado pelo diretor técnico-operacional da empresa, Flávio Costa, o documento afirma que o embarque de inspetores da Anac é feito "direto no check-in apresentando somente a carteira funcional". Costa diz ainda que "não cabe à empresa aérea perguntar a real intenção" dos servidores da agência.

Na última terça-feira, o relator da comissão, Marco Maia (PT-RS), questionou o ministro da Defesa, Nelson Jobim, a quem a Anac é subordinada, sobre a profusão de bilhetes emitidos sem custos à agência. Jobim admitiu que os passes não resultam em uma maior eficácia do sistema aéreo.

- O índice de fiscalização é muito baixo. O passe é uma forma de benesse que, de uma forma ou outra, será cobrado. Isso pode se dar no esgarçamento da tolerância nas exigências - alertou Jobim.

Contraponto - O que diz a Assessoria de Comunicação Social da Anac

Não existe viagem de graça. A sistemática utilizada é prevista na Portaria nº. 48/GC5, de 23 de janeiro de 2002, do Comando da Aeronáutica, publicada no Diário Oficial de 28 de janeiro de 2002, e a mesma é usada desde 1999, por meio de portarias anteriores, pelos militares e civis que desempenham missões de fiscalização e inspeção na aviação civil. O transporte aéreo não remunerado solicitado às empresas brasileiras de transporte aéreo regular é destinado ao cumprimento de missões de apoio e fiscalização das atividades do Sistema de Aviação Civil. São consideradas missões de apoio e de fiscalização das atividades do Sistema de Aviação Civil, as seguintes: investigação e prevenção de acidentes aeronáuticos relacionados com a Aviação Civil; inspeção e vistoria de aeronaves civis; exame de tripulantes e aeroviários; inspeção de oficinas e instalações da Aviação Civil; inspeção e fiscalização de aeroportos, suas facilidades, instalações e demais serviços de infra-estrutura aeroportuária."

Diretores não estão na lista

O curioso no extenso relatório remetido pela Anac à CPI do Apagão Aéreo da Câmara é a ausência de bilhetes emitidos em nome dos principais diretores da agência.

De acordo com a documentação, o presidente da Anac, Milton Zuanazzi, e os ex-diretores Denise Abreu e Jorge Velozo não viajaram de graça no primeiro semestre. Josef Barat solicitou dois bilhetes, e Leur Lomanto, um.

Dados da CPI, no entanto, que não estão no relatório e, portanto, não aparecem na contabilidade sobre a distribuição gratuita de passagens, atestam que, juntos, os cinco integrantes da diretoria colegiada da Anac voaram de graça 288 vezes entre julho do ano passado e fevereiro deste ano.

A Anac também dispõe de uma agência de turismo específica para contratar viagens e um orçamento de R$ 6 milhões para compra de passagens e pagamento de diárias em 2007 - dos quais R$ 2,1 milhões já haviam sido gastos até julho - , a CPI suspeita que a direção tenha interrompido as solicitações de cortesias para se precaver de críticas.

Segundo a Anac, os diretores só usaram o passe funcional em 2006 devido à inexistência de orçamento próprio para deslocamentos. Em 2007, a prática teria sido abortada pela direção. Um requerimento prestes a ser votado pela CPI solicita a lista de todas as passagens efetivamente pagas pela Anac nos últimos 12 meses. Autor do pedido, o deputado Vic Pires (DEM-PA) desconfia de que diretores da agência tenham viajado com passagens pagas pelo governo para a festa de casamento da filha de Leur Lomanto, dia 30 de março, em Salvador (BA). Na ocasião, Denise Abreu foi fotografa fumando charuto, enquanto milhares de passageiros estavam presos nos principais aeroportos do país.

- Os controladores de vôo estavam de greve, o sistema em colapso, e a direção da Anac festejando - diz Vic Pires.

Denise renunciou ao cargo há 10 dias, após ter o sigilo bancário quebrado e passar a responder a um inquérito administrativo no Ministério da Defesa. Único técnico ligado à aviação na chefia da Anac, Jorge Velozo também pediu demissão, porém em um ato combinado com o ministro da Defesa, Nelson Jobim, que tenta forçar a renúncia de toda a direção da agência com o objetivo de reformulá-la. Os pedidos de exoneração de Josef Barat e Leu Lomanto são aguardados para os próximos dias. Já Milton Zuanazzi resiste à pressão, mas deve entregar o cargo até o final do mês.

 

 

O Globo - Niteroi
02/09/2007
Coluna - Gilson Monteiro

 

 

Folha de São Paulo
01/09/2007
Jobim propõe redução de tarifas aeroportuárias
SHEILA D'AMORIM DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Durante reunião ministerial na última quinta-feira, na granja do Torto, em Brasília, o ministro Nelson Jobim (Defesa) propôs uma revisão das tarifas aeroportuárias e do ICMS cobrado sobre combustíveis como "arma" para melhorar a distribuição de vôos pelos aeroportos do país.

Segundo relatou à Folha um dos presentes à reunião, ao fazer uma prestação de contas sobre o gerenciamento da crise aérea e mostrar as sugestões para nova malha aérea, o ministro teria citado o exemplo de Toronto, no Canadá, para defender que a redução das taxas cobradas pelos aeroportos menos movimentados pode estimular os passageiros a utilizar mais esses locais.

São várias as taxas cobradas dos passageiros, das companhias aéreas e das transportadoras de cargas. No final, todas elas influenciam o preço das passagens.

A taxa de embarque, por exemplo, é paga diretamente na hora em que se compra um bilhete aéreo, mas outras tarifas, como a de pouso e a de permanência, que representam custos para as empresas, acabam pesando indiretamente no valor cobrado dos clientes.

Segundo a Infraero, desde 1989, a taxa de embarque -doméstica e internacional- tem um adicional de 50% para financiar melhorias e expansões de aeroportos.

Inicialmente, esse adicional deveria ser provisório, mas é cobrado até hoje, e o dinheiro arrecadado é dividido entre a Infraero, o Programa Federal de Auxílio a Aeroportos (Profaa) e o fundo aeronáutico.

No caso da taxa adicional cobrada nos vôos internacionais, o Tesouro Nacional também entra na divisão. A extinção desse adicional é reivindicação antiga das empresas aéreas.

Atualmente, essas taxas já possuem valores diferenciados de acordo com a classificação dos aeroportos. Nos maiores e mais movimentados, a taxa de embarque doméstico, já incluída a tarifa extra, é de R$ 19,62 e a internacional, US$ 36 (cerca de R$ 72), segundo tabela da Infraero. Aí estão incluídos os aeroportos de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Salvador, Recife, Porto Alegre, Minas Gerais e Curitiba.

A diferença da taxa cobrada nos aeroportos menores, como São José do Rio Preto, São José dos Campos, Uberaba, Campinas, Goiânia e Ilhéus, é pequena: R$ 15,42 nos vôos domésticos e R$ 60 (US$ 30) nos internacionais.

ICMS

Jobim destacou também que a questão da unificação da alíquota do ICMS sobre combustíveis, além de ajudar a melhorar a distribuição de vôos, é uma medida de segurança.
Ele teria citado especificamente o caso do acidente com o vôo 3054 da TAM, em Congonhas, lembrando que o fato de o avião estar com muito combustível aumentou a tragédia.

De acordo com o ministro, como o ICMS no Rio Grande do Sul, origem do vôo, é mais baixo do que em São Paulo, destino final, o avião carregava uma quantidade de combustível maior do que a necessária para o trecho.

 

 

O ESTADO DE SÃO PAULO
02/09/2007
Juiz manda Gol indenizar família em US$ 1 milhão
É a primeira sentença favorável às famílias de vítimas da tragédia; companhia havia oferecido 350 mínimos
Nicola Pamplona

A Justiça do Rio condenou a Gol a pagar valor equivalente a US$ 1 milhão à família de Quézia Gonçalves Moreira, vítima do acidente com o vôo 1907, que caiu após se chocar com um jato executivo em setembro do ano passado. Trata-se da primeira sentença favorável às famílias de vítimas da tragédia, que matou 154 pessoas.

Segundo a sentença proferida pelo juiz Mauro Nicolau Júnior, da 48ª Vara Cível do Rio, os pais e o irmão de Quézia têm direito a R$ 380 mil cada um a título de indenização. Além disso, a companhia deverá pagar pensão de R$ 999.426,22 aos três como compensação pela perda da contribuição da vítima nas despesas domésticas. No total, portanto, a Gol foi condenada a pagar R$ 2.139.426,42, ou cerca US$ 1.091.544, pela cotação de ontem.

O advogado da família, João Tancredo, afirmou que a decisão é histórica e pode servir de parâmetro para outros casos envolvendo vítimas de acidentes aéreos no Brasil. “A sentença mostra que a Justiça brasileira não é Justiça de segunda classe, já que o processo foi rápido e concede indenização em valores equivalentes aos concedidos no exterior”, destacou o defensor, lembrando que o processo foi iniciado há apenas seis meses. No acidente do Fokker 100 da TAM, ocorrido em 1996, famílias que recorreram no Brasil ganharam um quinto do valor obtido pelas que foram à Justiça americana.

Ontem, a Gol propôs indenização de 350 salários mínimos, alegando que são compatíveis com outros casos já julgados no País. A família já vinha recebendo uma pensão de cerca de R$ 500 por mês a título de tutela antecipada, uma espécie de pensão provisória paga até que os valores finais sejam depositados. Quézia atuava como especialista em medição no Inmetro, com salário de R$ 900. Estava no vôo 1907 voltando de uma viagem de trabalho a Manaus.

O novo valor definido ontem pelo juiz considerou, entre outras coisas, os rendimentos que a vítima, que tinha 21 anos, teria com o novo emprego de operadora de dutos de petróleo e gás na Transpetro, subsidiária da Petrobrás, para o qual havia sido convocada dias antes do acidente.

“O que se vê dos depoimentos pessoais e testemunhais hoje colhidos é a manifestação de dor extrema de pais que perderam uma filha em plena juventude com o futuro aberto e escancarado”, escreveu o magistrado, em sua sentença.

CHORO

Durante a audiência, foram ouvidos o pai de Quézia, João Batista Moreira, um funcionário da Transpetro e uma amiga da família. A mãe da vítima, Martha, estava bastante abalada e não conteve o choro ao falar das lembranças de como foram os primeiros dias após a tragédia.

Os familiares só puderam reconhecer e enterrar a filha mais de 15 dias após o acidente, devido às dificuldades no resgate das vítimas em meio à Floresta Amazônica. Ontem, a família não quis dar entrevistas.

A Gol não quis comentar a decisão da Justiça. Mas, por meio de sua Assessoria de Imprensa, informou que vai recorrer.