Coluna Claudio Humberto
02/08/2007
Convidado, Gaudenzi vai presidir
a Infraero
O engenheiro Sérgio Gaudenzi (foto), atual presidente
da Agência Espacial Brasileira, aceitou convite
do ministro Nelson Jobim (Defesa) para presidir a estatal
Infraero. Baiano, com longo histórico na militância
de esquerda, ele é amigo pessoal do ex-ministro
da Defesa Waldir Pires, com quem trabalhou no Ministério
da Previdência. Foi destacado secretário
do ex-prefeito de Salvador Jorge Hage, atual ministro-chefe
da Controladoria-Geral da União, e colega de Jobim
na Câmara dos Deputados. Gaudenzi tem reputação
de administrador austero, eficiente e honesto, por isso
o ministro fez questão de conversar com ele ao
encontrá-lo nas despedidas de Waldir, mas não
chegou a formular o convite. Somente na noite desta quarta-feira
Gaudenzi foi chamado a conversar com Jobim para ouvir
o convite formal. Às 21h30 deixou o gabinete do
ministro já como futuro presidente da Infraero.
O Estado de São Paulo
02/08/2007
Computador entendeu que avião
arremeteria
Essa foi a razão, segundo
o chefe do Cenipa, pela qual o comandante não conseguiu
parar Airbus: 'Não freie. Não abra os spoilers
porque ele vai voar'
Luciana Nunes Leal
O brigadeiro Jorge Kersul Filho, chefe do Centro de Investigação
e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos
(Cenipa), disse ontem aos deputados, na sessão
secreta da CPI do Apagão, por que o piloto do Airbus
da TAM tentou frear manualmente o avião e não
conseguiu. 'Quando o motor direito estava recebendo a
informação de que a aeronave estava em climb
(procedimento de subida), o que o computador mandou para
todos os sistemas? Não freie porque isso aqui vai
voar. E não abra os spoilers porque ele vai voar.'
Kersul detalhou a operação e avaliou: 'O
piloto deve ter tentado manter o avião na pista,
usando todos os mecanismos que estavam à disposição
dele. Então, quando o motor começou a embalar,
foi ficando mais difícil manter o avião
na pista. O avião começou a se deslocar
para a esquerda porque esse motor direito estava empurrando
o avião.' Ele contou aos deputados que em vários
acidentes com as mesmas características, em que
o avião sai da pista, a investigação
revelou falha humana. Mas voltou a lembrar que há
possibilidade de pane no computador.
Segundo o brigadeiro, o quadrante dos manetes foi recolhido
dos escombros e mostrava um manete na posição
climb e outro na posição idle (ponto morto).
Embora tenha ressalvado que o impacto pode ter alterado
a posição do manete direito, Kersul mostrou
que o quadrante reforça a informação
contida na caixa-preta de dados. 'Está no computador
qual é a posição do manete (...)
Temos uma segunda comprovação. Achamos o
quadrante do manete. O manete está realmente fora
da posição, lembrando que, com o impacto
naquela velocidade, tudo pode acontecer.'
Na sua análise, os pilotos não perceberam
que, inicialmente, havia um comando para frear e outro
para acelerar. Kersul acredita que, se eles tivessem percebido,
as informações técnicas dos últimos
procedimentos mostrariam uma tentativa de reduzir o manete
direito, para o ponto morto, o que não ocorreu.
Não ficou claro, no entanto, por que os pilotos
não perceberam o manete na posição
incorreta.
NOS PADRÕES
Durante a sessão, de cerca de três horas,
Kersul projetou na parede os gráficos da caixa-preta
de dados. Ele disse aos deputados que os problemas começaram
mesmo do pouso em diante e que, na hora em que a aeronave
tocou o solo, estava em velocidade dentro dos padrões
e tocou um ponto da pista 'já próximo do
limite máximo, mas dentro dos limites'. Nesses
aspectos, de posição na pista e velocidade
na hora do pouso, segundo o brigadeiro, 'não houve
problema algum'. A separação na posição
dos manetes é que teria dado origem à tragédia.
No início da sessão, Kersul informou aos
deputados que não é piloto de Airbus e,
portanto, tem conhecimentos restritos. 'Não sou
piloto desse avião, infelizmente. É uma
máquina muito boa. Não sou capaz de entrar
em detalhes, de influir na investigação.
Não tenho vergonha de confessar minha ignorância.'
O Estado de São Paulo
02/08/2007
Da rotina ao horror em só
24 segundos
Transcrição mostra
que tudo ia bem até computador avisar: 'retardar'
João Domingos, , Luciana Nunes Leal
A transcrição da caixa-preta de voz do
Airbus 320 mostrou que do momento em que a aeronave tocou
a pista de Congonhas até o choque com o prédio
da TAM Express passaram-se 24 segundos apenas. Revelou
também o drama dos que estavam na cabine, com tentativas
sem êxito de controle dos instrumentos por parte
dos pilotos, e, sobretudo, deixou chocados os integrantes
da CPI do Apagão Aéreo, que tiveram acesso
à transcrição.
Em 24 segundos, o avião atravessou a pista principal
do Aeroporto de Congonhas, passou sobre a Avenida Washington
Luís, bateu no prédio da TAM Express e explodiu.
A degravação da caixa-preta que registrou
os últimos 30 minutos do vôo 3054 mostrou
que tudo corria tranqüilamente a bordo do avião,
que saiu de Porto Alegre com destino a São Paulo.
Faltando 30 minutos para o pouso, uma comissária
revelou aos pilotos que nem sabia onde a aeronave desceria.
O comandante respondeu que seria em Congonhas. Ela se
mostrou alegre e disse: 'grande'.
Também pela transcrição da caixa-preta
ficou claro que os pilotos foram avisados pela torre de
controle de que havia chuva e a pista estava molhada e
escorregadia. O comandante Kleyber Lima pareceu fazer
uma reflexão ao ser informado. 'Molhada e escorregadia!',
comentou, em tom de exclamação.
O texto da degravação está em inglês.
Os deputados Rocha Loures (PMDB-PR) e Luciana Genro (PSOL-RS)
fizeram o papel de tradutores. O brigadeiro Jorge Kersul
Filho, do Centro de Investigação e Prevenção
de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), deu as explicações
técnicas. Por exemplo: a voz que pede que o pouso
seja retardado é de um computador de bordo.
Luciana deu tom dramático à sua narração,
a parte que se refere ao acidente, os gritos, o desespero.
Quando terminou, houve silêncio geral. O presidente
em exercício da CPI, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) suspendeu
a sessão por 15 minutos.
Ficou claro também que os pilotos sabiam que o
avião tinha só um reverso. Lima pediu ao
co-piloto, Henrique Stephanini Di Sacco, que não
esquecesse. 'Lembre-se de que temos apenas um reverso',
disse, ao longo do vôo. 'Sim, nós só
temos o esquerdo', respondeu o auxiliar.
Ao se aproximar, já sobre Diadema, o comandante
avisou que estava tudo pronto para a descida. Logo em
seguida, recebeu a autorização para pousar
na pista principal, chamada de 35. Pediu ao co-piloto
para checar seu estado. Este perguntou e a torre respondeu
que estava molhada e escorregadia. A aeronave foi mantida
no curso.
Logo antes de o avião tocar a pista, o computador
de bordo advertiu: 'Retarda. Retarda. Retarda.' Quando
a aeronave já se encontrava na pista, o co-piloto
voltou a lembrar que havia apenas um reverso. E deu o
alarme de que o sistema de freios (spoilers) não
funcionava. A partir daí, houve terror.
Folha de São Paulo
02/08/2007
PILOTOS DA TAM: PROCURADORIA VAI
INVESTIGAR SUPOSTA COAÇÃO
O Ministério Público do Trabalho irá
investigar se pilotos da TAM foram coagidos pela empresa
a pousar em Congonhas mesmo considerando inadequadas as
condições do aeroporto. Segundo a procuradora-geral
do Trabalho, Sandra Lia Simón, o órgão
recebeu denúncia sobre o fato após o acidente
do Airbus. Ela não soube precisar se a suposta
coação foi antes ou após a tragédia.
Caso a denúncia seja confirmada, a TAM poderá
ser multada por assédio moral. A empresa disse
que não se pronunciaria porque ainda não
foi notificada sobre a investigação.
Folha de São Paulo
02/08/2007
Falha ocorreu 2 segundos antes do
pouso
Dados da caixa-preta revelam
que o computador do avião deu alerta aos pilotos
de que algo estava errado no momento da aterrissagem
Transcrição da gravação da
cabine de vôo mostra que a colisão do avião
com o prédio ocorreu 25 segundos depois de a aeronave
tocar a pista
LEILA SUWWAN DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A caixa-preta com dados de voz do Airbus da TAM que explodiu
em Congonhas mostra que a falha central em todo o acidente
ocorreu apenas dois segundos antes de o avião tocar
no solo. Nesse momento, o vôo 3054 acelerou incorretamente
e o computador fez um alerta de que algo estava errado.
A transcrição mostra o desespero dos pilotos,
que não conseguiram controlar a aeronave, resultando
no maior acidente aéreo do país, com 199
mortos.
A transcrição da gravação
da cabine do vôo, divulgada ontem pela CPI do Apagão
Aéreo, mostra que os pilotos acionaram os manetes
(alavancas de controle de potência das turbinas)
no momento certo. O correto é desacelerar ambos
motores e deixar em ponto morto. Mas algo deu errado:
o avião reagiu com aumento do nível de ruído
das turbinas.
Um segundo depois, o GPWS (Ground Positioning Warning
System) emitiu o sinal sonoro "retard" (retardar),
reiterando o aviso normal de desaceleração
que havia sido dado pelo computador de bordo.
Conforme a Folha antecipou ontem, esse fato foi determinante
para a seqüência de eventos que levou o avião
a não conseguir parar no pouso. O manete da turbina
direita estava, segundo o registro da caixa-preta, em
posição errada, levando à falência
do sistema de frenagem e à aceleração
na pista. O que não se sabe é se isso foi
erro do piloto, como o dado registrado indica, ou se houve
alguma falha no equipamento.
A transcrição também mostra que a
colisão no prédio aconteceu 25 segundos
depois de o avião tocar a pista, tempo no qual
os pilotos percebem que algo muito errado aconteceu e
se desesperam.
Tentam frear e controlar o avião, mas não
conseguem. A última coisa registrada na gravação
é um grito de mulher, provavelmente uma comissária
que estaria na cabine.
O diálogo entre os pilotos é curto e dramático.
Eles são identificados na caixa-preta pela posição
que ocupam nos assentos, esquerdo para piloto e direito
para o co-piloto, mas não se sabe quem ocupava
qual deles na hora do acidente.
Ao tocar no solo, às 18h48m26s, o co-piloto confirma
o funcionamento de apenas um reverso. Três segundos
depois, no lugar de confirmar o funcionamento dos spoilers
(freios aerodinâmicos na asa), ele diz: "Spoilers
nada". Isto é, os freios não funcionaram.
Esse freio teria de ser acionado automaticamente no pouso.
O piloto procura alguma explicação. Quatro
segundos depois, às 18h48m30s, se desespera: "Aiii.
Olha isso!". O co-piloto pede: "desacelera,
desacelera". "Não consigo, não
consigo", responde o piloto, que tentou parar o avião
com os freios hidráulicos das rodas.
Ele tenta manter o rumo da aeronave e exclama "Ai
meu Deus" pouco antes da bater na mureta do final
da pista, cruzar a avenida e explodir no prédio.
Falha
Uma hipótese central na investigação
das causas do acidente é a de que o computador
de bordo do Airbus pode ter interpretado que não
era a intenção dos pilotos pousar, já
que houve um comando de aceleração em um
dos manetes, ainda que por erro. Por isso teria acelerado
em pista.
Quando estava a 20 pés (6 metros) de altura, o
computador de bordo dá duas vezes o alerta "retard"
(retardar). Este é o momento no qual o piloto deve
desacelerar os manetes até o ponto morto, para
que toque na pista sem aceleração.
Em seguida fica registrado na gravação o
som de manuseio dos manetes -mas não se sabe se
o procedimento foi executado corretamente. Quase simultaneamente,
o som de aceleração foi captado pelo microfone
geral na cabine, conforme transcrito pelo NTSB (National
Transportation Safety Board).
Com isso, um segundo antes de tocar o solo, outro computador,
o GPWS, emite sinal pedindo a mesma desaceleração:
"Retard". Esse sistema monitora a proximidade
do solo para alertar de perigo e pode servir como sistema
anti-colisão.
A partir do toque no solo, há a confusão
que os dados apontavam: as turbinas passam a acelerar
e os freios não funcionam automaticamente, indicando
que o Airbus "entendeu" que o piloto queria
acelerar.
Apesar da indicação de erro do piloto no
uso do manete, as autoridades que investigam o acidente
pedem cautela, devido à possibilidade de falha
mecânica no acionamento das alavancas ou até
falha eletrônica do computador de bordo.
A transcrição mostra uma aproximação
para aterrissagem em Congonhas aparentemente normal. Os
pilotos sabiam do problema no reversor do motor esquerdo:
"Lembre-se, temos apenas um reverso", diz a
pessoa no assento do comandante. "Sim, somente o
esquerdo", responde o co-piloto.
O piloto estava preocupado com a pista escorregadia. Ele
orienta o co-piloto a pedir informações
da torre do aeroporto sobre a pista. O controlador responsável
informa duas vezes que está "molhada e escorregadia".
O comandante chega a comentar com o co-piloto: "molhada
e escorregadia!".
Segundo outro dado da caixa-preta revelado pela Folha
ontem, só o reverso esquerdo teria sido colocado
em máximo, quando o manual da Airbus afirma que
ambos manetes devem ser acionados dessa forma.
Com uma turbina em aceleração e outra em
reverso para auxiliar a frenagem, o avião não
conseguiu parar na pista.