Jornal da Band
Terça-feira, 31 de julho de 2007 - 18h47
Varig deve receber indenização
de R$ 6 bilhões do Governo
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Folha de São Paulo
01/08/2007
A sorte, a Deus
PAULO RABELLO DE CASTRO
Entregar a sorte a Deus é
o estágio
de humildade do líder, que sabe
distinguir entre o que conhece e o
que não domina
O DEBATE econômico da crise ganha, agora, impulso
filosófico. Em duas frases lapidares, o presidente
da República resumiu a questão do risco
e suas seqüelas. A primeira frase: "A gente
faz o que pode. Quando não dá pra fazer,
a gente deixa pra ver como é que fica". A
outra: "Quando entro num avião, entrego a
sorte a Deus". Essa, na posse do seu novo ministro
da Defesa, Nelson Jobim.
As duas frases resumem o que levou séculos de transpiração
a grandes intelectuais, entre filósofos, matemáticos
e economistas, ao tentarem buscar o melhor caminho para
reconciliar o homem com seu futuro, ou seja, gerir o que
ainda não aconteceu, a arte de antecipar e prever,
prevenir as chances do acaso e, às vezes, o infortúnio
e a tragédia.
Dominar o risco sempre foi essencial ao progresso da humanidade.
Quando o presidente afirma ser preferível não
fazer nada a tentar fazer o que não sabe, ele reflete
o papel da repetição e dos hábitos
na construção de "certezas" numa
sociedade tradicional, a qual recorria aos oráculos
e videntes para perscrutar o lado desconhecido da vida.
Aos poucos, a acumulação de conhecimentos,
por meio da educação científica e
do treinamento, foi abrindo novos caminhos para a razão
dominar o medo, o pavor do desconhecido. Daí o
papel dos líderes que, por razão ou intuição,
conduziam seus povos a superar desafios.
Entregar a sorte a Deus, como afirmou o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, sobre o medo de voar, é
o estágio de humildade do líder, que sabe
distinguir entre o que conhece e o que, de fato, não
domina. Peter Bernstein, no livro "Desafio aos Deuses:
A Fascinante História do Risco" (ed. Campus),
lembra-nos de que a explosão do conhecimento, nos
anos recentes, só serviu para tornar nossa vida
mais incerta e difícil de compreender. É
a "lei da ignorância (relativa) crescente",
que pesquisei em Chicago, na década de 1970, e
que vem ganhando novos contornos na situação
brasileira atual.
Tomemos o caso da crise aérea. As causas do último
acidente remontam a muito mais do que apenas a chuva,
ou o pino do reverso, ou uma possível falha humana.
A complexidade do serviço aéreo -a atividade
de voar comercialmente- é de tal monta que exige,
para começar, órgãos reguladores
geridos por profissionais de alto conhecimento técnico
e independência, algo impossível de obter
nas seleções de pessoal absolutamente "politizadas"
de Brasília.
A partir dessa restrição à qualidade
no domínio do conhecimento e da razão, faz
sentido que o grau de incerteza na aviação
civil brasileira tenha aumentado exponencialmente. Como
contribuiu, também, para isso o fato de a administração
federal haver decidido permitir a "exportação"
de centenas dos mais bem treinados pilotos brasileiros,
fruto da crise financeira mal resolvida da Varig, no ano
anterior. Por azar, foi numa rota partindo da capital
gaúcha que se sentiu o peso da tragédia
de se haver administrado tão mal os riscos financeiros
da aviação, no caso da Viação
Aérea Rio-Grandense.
Ao apontar Jobim, um "scholar" gaúcho,
para a pasta da Defesa, o presidente buscou aumentar o
estoque de conhecimentos gerais e específicos e,
sobretudo, de seriedade e coragem para intuir caminhos
e ousar, no largo espaço do desconhecido que se
abre diante do país. Daí o papel das lideranças,
nas grandes sociedades. O resto é com a sorte,
ou Deus.
Folha de São Paulo
01/08/2007
Caixa-preta do Airbus indica falha
de piloto
Computador registrou falhas
na operação da alavanca de aceleração
das turbinas; hipótese de erro mecânico não
está descartada
Sem controle, o piloto tentou parar o avião pressionando
os dois pedais à sua frente, freando os pneus do
trem de pouso
FERNANDO RODRIGUES DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A caixa-preta do Airbus-A320 da TAM que caiu em São
Paulo no dia 17 indica que houve erro do piloto na operação
da alavanca de aceleração das turbinas,
além de captar o desespero dos pilotos em tentar
frear o avião no solo. Embora menos provável,
uma pane no computador do avião também não
pode ser descartada, isoladamente ou em conjunto com o
provável erro humano.
A Folha teve acesso aos dados, que chegaram ontem ao Congresso
em um CD-ROM com cerca de 60 arquivos de dados e áudio.
A primeira falha, cuja hipótese havia sido antecipada
pela Folha na semana passada, ocorreu pouco antes do pouso,
quando o manete de controle do motor direito foi mantido
numa posição de aceleração.
Deveria estar em ponto morto, como o outro manete.
Ao pousar, os sistemas eletrônicos interpretaram
esse procedimento como um desejo do piloto de acelerar.
As duas turbinas passaram a acelerar automaticamente.
Os freios aerodinâmicos não foram acionados.
O freio automático dos pneus também não
funcionou.
Pode ter contribuído para a aceleração
anormal um segundo erro: apenas o manete da turbina esquerda
foi colocado na posição de reverso máximo.
Essa turbina estava com o reversor, equipamento que auxilia
a frenagem ao inverter o fluxo de ar na turbina, funcionando
-a outra, não.
Mesmo com o reversor inoperante na turbina direita, o
procedimento correto deveria ter sido colocar ambos os
manetes em reverso. Mas o direito permaneceu acelerando,
segundo o registro.
A Airbus divulgou comunicado na semana passada alertando
operadores de seus aviões justamente sobre a necessidade
de cumprir essas duas operações, baseada
já em dados preliminares da caixa-preta. Houve
outros acidentes semelhantes com o A320 atribuídos
a falha do piloto.
O avião da TAM estava com o reversor direito desativado
havia quatro dias, em razão de um problema hidráulico.
Perdendo o controle, o piloto então tentou parar
o avião pressionando os dois pedais à sua
frente, freando os pneus do trem de pouso. Ao mesmo tempo,
com as mãos, segurou o quanto pôde o mecanismo
interno que controla a direção da bequilha,
a roda da frente do equipamento. Mas as turbinas continuaram
a acelerar.
Na semana passada, o brigadeiro responsável pela
investigação, Jorge Kersul, disse que não
está excluída a hipótese de falha
nos computadores. "O dado do parâmetro pode
indicar que o manete estava em tal posição,
mas quem prova que o problema não foi eletrônico?
O manete pode estar em outra posição e o
problema ser de sinal eletrônico que o computador
está emitindo. A gente pode ouvir algo [no gravador
de voz] que o manete não sai do lugar, está
enroscado", disse à CPI do Apagão Aéreo.
O arquivo de áudio a que a Folha teve acesso revela
que o piloto e o co-piloto emitem frases lacônicas,
mas importantes.
Ao tocar o chão na pista principal de Congonhas,
uma voz na cabine diz: "Reverso um apenas".
Ou seja, o piloto e o co-piloto sabiam que só um
reversor estava operante.
Em seguida, outra frase: "Spoiler nada...".
Ou seja, os spoilers (freios aerodinâmicos na parte
de cima das asas), que abrem automaticamente no pouso,
não funcionaram.
O tom fica dramático: "Desacelera, desacelera,
desacelera!". Aumenta o pânico: "Não
dá, não dá, não dá".
Por fim, a frase já conhecida: "Vira, vira,
vira".
Quem ouviu as gravações completas e repassou
o conteúdo à Folha não quis revelar
as palavras finais captadas dentro da cabine de comando,
segundos antes de o avião explodir, matando 199
pessoas.
Os dados serão analisados hoje pelos deputados
com auxílio de técnicos da FAB.
Além da falha humana e eventualmente de computadores,
há uma terceira hipótese derivada das anteriores.
O piloto teria realmente puxado os dois manetes para a
posição correta na hora do pouso -a posição
conhecida como "idle", ou "ponto morto",
em português. Por algum defeito, o manete direito
não teria se encaixado o suficiente para emitir
o sinal eletrônico para o computador de bordo.
Quando um avião como o Airbus-A320 se aproxima
da pista para fazer um pouso, o piloto e o co-piloto devem
introduzir nos comandos da cabine os dados a respeito
da aterrissagem. Nesse momento, os manetes podem ainda
ficar na posição chamada "climb",
que significa "subir". O computador sabe que
o vôo está no final e desacelera as turbinas.
Ao tocar o solo, entretanto, é importante que os
dois manetes estejam então na posição
"idle".
As caixas-pretas indicam que o manete da direita estava
ainda na posição "climb", ou ainda
"near idle" (quase desacelerada) quando o Airbus
tocou a pista. Nessas horas, quando o peso da aeronave
aciona os sistemas hidráulicos do trem de pouso,
o computador está programado para acionar os freios
aerodinâmicos (flaps e spoiler) e o freio dos pneus.
Só que nada disso aconteceu.
Assim que o Airbus tocou o solo, as duas turbinas voltaram
a ser acionadas. Uma delas estava com o reversor acionado
(do lado esquerdo) e o fluxo de ar passou a ser invertido,
ajudando a frear um pouco o equipamento. Do lado direito,
porém, a turbina continuou a aumentar a força,
como se o avião tivesse de fazer nova decolagem.
Pela tentativa do piloto em "segurar" o avião,
é possível que ele tenha adernado à
esquerda já no começo do pouso.
Sobre a pista de Congonhas, as caixas-pretas ainda não
encerram a polêmica. Mas o fato de o piloto ter
conseguido manter o avião na pista indica que a
aderência não poderia estar muito abaixo
do padrão.
Jornal do Brasil
01/08/2007
Boeing arremete três vezes
e atrasa aterrissagem
Ana Paula Verly
Apesar de a Infraero considerar o Aeroporto Internacional
Tom Jobim subaproveitado, ainda são registrados
casos de superposição de vôos no maior
aeroporto do Rio. Na segunda-feira, o vôo 1867 da
Gol, que saiu às 20h de Brasília vindo de
Manaus, precisou ficar 45 minutos em trânsito, até
receber autorização para pousar. O piloto
arremeteu três vezes.
O avião fez três tentativas de pouso. Na
primeira, depois de arremeter, o piloto anunciou que precisaria
sobrevoar Barra do Piraí por alguns minutos por
causa do "intenso tráfego aéreo".
Meia hora depois, novamente as luzes se apagaram, a aeronave
reduziu a velocidade e a cidade iluminada ficou mais próxima.
Em vão. O comandante disse que sobrevoaria Duque
de Caxias por mais duas horas. Os passageiros, que, a
essa altura, não escondiam mais o nervosismo, tentavam
se convencer de que o aviso estava errado. Cinco minutos
depois, o piloto corrigiu a informação.
Disse que não seriam duas horas, mas duas "órbitas",
o que daria em torno de sete minutos.
Foram mais 10. Durante o intervalo, passageiros contavam
suas histórias.
- Precisei ficar uma hora em trânsito, na volta
do Ceará. Só Deus nessa hora... - contou
um deles.
Outro passageiro comentou que o tempo de vôo de
algumas rotas já foi ampliado.
- Pego muito o vôo de Belo Horizonte para Brasília.
Agora está 20 minutos mais demorado - disse.
Apesar da revolta e do medo, ninguém ousou reclamar.
- O piloto já deve estar tenso o bastante. Imagina
como isso tudo deve mexer com os nervos dele. É
um absurdo. Voar, agora, só em casos de de extrema
urgência - lamentou uma mulher, acompanhada da filha.
Na hora do pouso, quem estava próximo às
asas não relaxou, reflexo do trauma com a tragédia
do Airbus da TAM.
- O reverso está funcionando - confirmou uma jovem.
Enquanto o avião não parou totalmente,
os olhos se mantiveram arregalados.
- Perguntaram no aeroporto se eu queria antecipar meu
vôo. Disse que não. Cada um na sua hora -
comentou uma senhora precavida, que passou o tempo todo
rezando.
O Estado de São Paulo
01/08/2007
Anac vetou pouso sem reverso em
dia de chuva
Piloto da TAM desconhecia regra
de 2006 e diz que o que vale é o manual
Luciana Nunes Leal e João Domingos,
BRASÍLIA
Deputados da CPI do Apagão Aéreo na Câmara
exibiram ontem uma recomendação da Agência
Nacional de Aviação Civil (Anac) que mostrava,
em abril de 2006, a preocupação com a pista
principal do Aeroporto de Congonhas nos dias de chuva.
A orientação, de 5 de abril de 2006, indicava
as medidas a serem tomadas pelos pilotos no caso de pista
molhada. Entre elas, estava a necessidade de manter os
dois reversos (equipamento acoplado à turbina do
avião, que ajuda a reduzir a velocidade na hora
do pouso) operantes. O Airbus A320 da TAM que bateu contra
o prédio da TAM Express, matando 199 pessoas, tinha
falha em um dos reversos, que estava travado. A TAM já
havia afirmado que, com relação ao sistema
do reverso, segue regras do fabricante do avião,
a Airbus.
A recomendação da Anac dizia que o piloto
deveria “ter anti-skid, auto-brake (se instalado),
todos os reversores de empuxo”. A mesma recomendação
dizia que, no caso de “empoçamento”
ou “pista alagada”, seria necessária
a suspensão das operações. Anti-skid
e auto-brake são dois sistemas hidráulicos
de freio das aeronaves. O primeiro evita que o avião
derrape e o segundo faz o avião parar de forma
paulatina e automática.
“Não temos nenhuma informação
de que essas recomendações foram revogadas.
No dia do acidente, a pista estava molhada. Portanto,
não poderia haver pouso de aeronaves com reverso
travado”, disse o relator da CPI, Marco Maia (PT-RS),
que leu a orientação durante o depoimento
do piloto da TAM José Eduardo Batalha Brosco. No
dia 16 de julho, Brosco pilotou o vôo Belo Horizonte-Congonhas,
com o mesmo Airbus A320 que se acidentou no dia seguinte.
Brosco relatou ter passado “um susto” ao pousar
na pista principal de Congonhas, por causa da dificuldade
para frear. O comandante disse à CPI que não
tinha conhecimento da recomendação da Anac.
E, em defesa da TAM, disse que a agência reguladora
não poderia fazer recomendações que
contrariassem as normas da fabricante do avião.
“A Anac não pode exigir o que o fabricante
atesta como operação normal”, disse
o piloto. A Airbus diz que o avião pode funcionar
normalmente sem um dos reversos.
Brosco disse aos deputados que, no dia 16 de julho, a
pista principal de Congonhas “parecia um vidro”
de tão “escorregadia”. Afirmou também
que a pista ficou mais escorregadia depois de reaberta,
em junho deste ano, ao final de uma obra que durou dois
meses. O piloto disse que ficou “abalado”
com a dificuldade de pousar na véspera do acidente
e até enviou por e-mail um informe sobre o problema
com a pista ao setor de segurança da TAM, no fim
da tarde do dia 16.
Os deputados da CPI identificaram, na lista de checagens
mecânicas feitas no Airbus A320 no dia do acidente,
dois boletins em que os mecânicos recomendam observação
em equipamentos do avião. Os deputados pedirão
mais informações à TAM para saber
que tipo de falha foi detectada e a gravidade dos problemas.
CAIXA-PRETA
A CPI do Apagão Aéreo decidiu ouvir na
manhã de hoje, em sessão secreta, o áudio
da caixa-preta de voz que registrou os últimos
diálogos dos pilotos do Airbus A320 da TAM. Os
deputados prometeram divulgar o conteúdo das gravações,
mas muitos pediram que fossem mantidos sob sigilo os registros
de desespero e pavor, em respeito às famílias
dos 199 mortos. Às 14 horas de ontem, o assessor
parlamentar da Aeronáutica, brigadeiro Átila
Maia, entregou o conteúdo das caixas-pretas do
Airbus, sem esconder a contrariedade por repassar informações
confidenciais aos deputados. “Vocês vão
receber um filme de terror. O que vão fazer com
isso?”, indagou.
Ele ressalvou que não ouvira os diálogos
dos pilotos e se referia à maioria das gravações
em casos de acidentes trágicos. Disse que muitas
vezes os passageiros percebem a gravidade do problema
e as caixas-pretas registram gritos de pavor.